Gestor do esporte de alto rendimento brasileiro por 18 anos, Marcus Vinicius Freire, medalhista de prata com a seleção de vôlei em 1984, acredita que a queda de investimentos não fará o Brasil afundar a ponto de retornar ao patamar que tinha antes de iniciar a preparação para os Jogos em casa. Critica, porém, a falta de profissionalização de algumas confederações que não aproveitaram os polpudos recursos do período para modernizar suas estruturas.
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Como o senhor vê as reduções nos apoios e patrocínios aos atletas brasileiros após a Olimpíada do Rio?
Não me surpreende. Eu estudei o que aconteceu nas outras Olimpíadas e nos países que foram sede e tiveram redução de investimentos. O bom é que nunca mais a gente vai voltar para o patamar de lá atrás, no Sul-Americano de 2002, ou no Pan-Americano de 2007, ou mesmo em 2009, quando ganhamos o direito de sediar os Jogos. Vamos ficar acima desse nível, em tudo.
No que a situação do Brasil difere da de outros países-sede?
Acho que a diferença, ou o problema, é que temos uma crise política e financeira, e muitas estatais apoiam o esporte. Isso foi um agravante na nossa redução. E aí uma crítica minha é de que as confederações não aproveitaram esse momento. Seria a hora correta de profissionalizar, mas não tinham projeto para atrair a iniciativa privada. Com o dinheiro fácil, as entidades relaxaram. Quem tem projeto, acho que ainda vai ter recurso. Essa visibilidade que vocês, da imprensa, e nós, do COB, demos ao esporte, trouxe interesse. Só que um possível parceiro não vai querer um plano escrito em papel de pão.
O senhor sempre foi um defensor das equipes multidisciplinares e o COB chegou a bancar os profissionais para alguns atletas. Como vê a interrupção do programa do Ministério que bancava essas equipes?
No meu entender, era a parte principal. É o que dá a base. O atleta, com 20 anos, não vai pegar o dinheiro e contratar nutricionista ou comprar um aparelho de musculação, por exemplo. O plano foi uma cópia do Time Rio, que nós criamos lá atrás, quando cheguei ao COB. A base era essa. Tinha dinheiro para atleta, mas, também, no entorno dele, os serviços e profissionais. Foi replicado isso quando sentamos com o Ministério para discutir o Bolsa Pódio. Não ter isso já é uma perda grande.
O Brasil tem um sistema definido para fomento do esporte?
Até tem, mas é instável. O melhor de todos seria o que fazem Estados Unidos e Canadá, especialmente os EUA. Já fui a audiências públicas em Brasília para falar sobre isso, e me diziam que tínhamos de fazer igual. Eu respondia: "Beleza, se a nossa educação for parecida com a deles". Primeiro melhora a qualidade da nossa educação, para depois inserir o esporte. Nosso desenho ficou com uma lei federal (Lei Agnelo/Piva) que distribui o dinheiro para COB e Comitê Paraolímpico Brasileiro dividirem para suas confederações. Está centralizado na mão de duas instituições. Está baseado, também, em estatais, que são os principais patrocinadores. Dependendo de como está o governo, não funciona. Esse sistema não tem estabilidade de longo prazo e nós não nos profissionalizamos para um plano a longo prazo.