Tinga atende o telefone no final da tarde de uma quarta-feira de dezembro. Faz calor em Porto Alegre e, pelos ruídos proporcionados pela presença de crianças ao fundo, as férias estão a todo vapor. Solícito, informa que está disponível para falar.
- Posso falar, sim, cara. Comigo a coisa é direta. Se eu posso, posso. Se não, eu digo que não e pronto - avisa.
O volante, símbolo de algumas das maiores conquistas do Inter como as duas Libertadores da América de 2006 e 2010, disse que aos 33 anos sofreu com a reserva em 2011. Mas admite que aprendeu como nunca. A chegada do técnico Dorival Júnior colocou em xeque a sua capacidade de marcar, passar, jogar. Tanto que logo nos primeiros dias de trabalho do novo treinador, Tinga foi excluído do time. O aprendizado, no entanto, começou antes. Ao ser relembrado sobre a fatídica derrota para o Mazembe no Mundial de Clubes, em dezembro de 2010, interrompe:
- Ah, isso aí já passou. Já faz um ano e já tivemos outras conquistas. O torcedor colorado tem muito mais coisas boas do que ruins para falar. Para nós, aquilo acabou com o fim daquele ano. No futebol, as coisas são assim. Tanto as derrotas quanto as vitórias passam muito rapidamente - sintetiza.
Ciente de que ainda poderia render em 2011, Tinga conta que baixou a cabeça e trabalhou. E encontrou pessoas dentro do Inter que o ajudaram a se reerguer para conquistar novamente um lugar no time e finalizar a temporada como titular. Cita o exemplo europeu e comenta que na Alemanha - onde jogou por quase quatro anos - um time não é formado por apenas 11 jogadores, e sim por todos que compõem o grupo. Um conceito que ele indica ter encontrado, de certa forma até inesperadamente, no próprio Inter.
- No Borussia, o capitão estava no banco e continuava tendo a mesma importância. Talvez o Brasil ainda leve um tempo para se adaptar a isso. Aqui, valorizamos mais os que jogam. O Inter mostrou o contrário. Isso me motivou a buscar meu espaço. Não fiz nada de diferente. Continuei trabalhando igual aos outros e consegui crescer. Foi um fator muito mais psicológico do que propriamente técnico ou físico - diz.
Abatimento e crescimento
Após a derrota para o Fluminense, Tinga conta que encontrou um grupo um tanto quanto desacreditado. As chances para chegar à Libertadores haviam diminuído consideravelmente e só uma sequência de vitórias levaria o Inter à competição. Experiente, ele foi um dos que "carregou" o peso que havia sobre o time.
- É preciso buscar um fator para acrescentar. Falamos em experiência e conquista quase como sinônimos, mas não é bem assim. A conquista encobre muitas coisas. Este ano, por exemplo, aprendi ficando de fora. Aprendi a importância de ter pessoas que acreditam no meu futebol. Isso te motiva. Mesmo em jogos em que entrei durante cinco ou dez minutos, dei o meu melhor e consegui colaborar. Uma coisa é você estar no banco e as pessoas virarem as costas. Outra, é não estar jogando e sentir a mesma importância dos demais - ressalta.
Além disso, as dificuldades de Tinga se multiplicaram devido a um fato conhecido dos gaúchos: o jogador é, desde pequeno, torcedor do Inter.
- Estar ali e não poder jogar machuca mais do que se eu estivesse no banco de um time com o qual não tivesse ligação alguma. O fato de haver identificação faz com que sempre vamos querer jogar. Tudo isso contribuiu. A ligação com o clube fez com que a reserva fosse mais difícil. Aprendi muito - conta.
Tática
Tinga se destacou nas últimas rodadas do Brasileirão de 2011 como segundo volante. Mais solto, ia ao ataque, voltava, ajudava na marcação e dava qualidade à saída de bola. Mas na sua concepção isso é, em parte, um equívoco. Como o Inter estava postado com um losango no meio, Tinga era o primeiro volante, na ponta defensiva. À frente, D'Alessandro era o meia-articulador. E, nos lados, Guiñazu aparecia pela esquerda, e Oscar pela direita, ambos cobrindo seus avanços.
- Não tenho problemas em jogar pela esquerda ou pela direita ou mais recuado, o importante é jogar. Em quatro temporadas na Alemanha, joguei três de volante e uma de meia. No Gre-Nal (da última rodada do Brasileirão), eu comecei como primeiro volante e quem terminou foi o Guiñazu, mais próximo ao Douglas. Jogar de primeiro ou segundo é muito parecido. Sempre preferi ir mais para frente, mas tive pessoas por perto que conhecem a posição e sempre me falaram: 'em qualquer time, tu vai jogar, e vai jogar muito tempo'. O Falcão é um. Para mim, ele é o maior conhecedor da posição. O Tite é outro que conhece bastante. Ambos sempre me incentivaram - salienta Tinga.
Motivado e pronto para mais uma temporada, finaliza com pensamento de jogador-torcedor consciente de que encontrará dificuldades, mas não se abaterá tão facilmente. O alvo é um só: o tricampeonato da Libertadores.
- Vamos lá que ano que vem (2012) tem mais. Estou querendo muito essa para chegar ao recorde - conclui, referindo-se ao número de conquistas dos times gaúchos e brasileiros.
Volante e torcedor
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Motivado, jogador afirma que objetivo número um é a Libertadores da América de 2012
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