
Poucos jogadores são tão simbólicos para um estádio como Luan é para a Arena. Até um ano atrás, era o goleador isolado da nova casa gremista, inaugurada no final de 2012. Foi o camisa 7 sucessor de Tarciso, Renato Portaluppi e Paulo Nunes. Mas neste sábado (14), quando sair do vestiário, as camisas tricolores estarão na porta da frente. Pela primeira vez, o Rei da América de 2017 enfrentará o Grêmio.
Esse encontro só não será mais impactante porque, em razão da pandemia de covid-19, a partida será de portões fechados. O que não deixa de despertar uma curiosidade em saber como teria sido o comportamento dos torcedores com o jogador que amaram (e odiaram) tanto nos últimos cinco anos.
Porque se é verdade que Luan foi o Rei da América, o segundo goleador da Arena (foi ultrapassado por Everton), protagonista do tri da Libertadores e do penta da Copa do Brasil, também estão na retina as tantas rusgas que ele e torcida tiveram nesse tempo. Ele teve pipoca arremessada em seu carro, recados ofensivos e vaias. Luan e gremistas nunca foram bossa nova e vinhozinho na lareira. Entre eles, sempre foi rock & roll e gritaria.
Mas passada a venda e caminhado o tempo, o sinal que vem da torcida é de que só ficaram as boas lembranças. Se algum dia houve rusgas, ninguém mais lembra. Representante gremista em programas do Grupo RBS, o comunicador Rodrigo Adams é claro:
—Se na Arena estivesse, aplaudiria e gritaria o nome do Luan. E assim pretendo fazer enquanto tiver energia. Ele é símbolo de um renascimento do Grêmio vitorioso. Oriundo da base, ganhou clássicos, venceu títulos coletivos e individuais. Luan, o eterno Rei da América, sempre viverá intocável em nossos corações. Mas isso tudo por dois minutos. Depois disso é Grêmio de um lado, Luan de outro. Sem pena pelo momento dele. Marcação firme e sem deixar espaços para que ele possa flutuar. Depois dos 90 minutos, aí voltaremos a aplaudir e gritar o nome de Luan.
Vendido ao Corinthians no final do ano passado por 5 milhões de euros (cotação da época apontou para R$ 22,5 milhões), ele chegou a um clube que sempre foi identificado, especialmente como torcedor. Em São José do Rio Preto, onde cresceu, era visto nas ruas desfilando com a camisa do Timão.
Descoberto no interior paulista no início da última década, Luan chegou ao Grêmio praticamente sem ter feito categoria de base. Sua relação mais séria com o futebol começou quando já tinha 18 anos, jogando no Tanabi, no América, de São José do Rio Preto, e depois na Catanduvense. Até por isso, era de se esperar que mantivesse o comportamento de torcedor por mais tempo do que um menino que inicia mais cedo a vida "profissional".
Apesar disso, depois que chegou em Porto Alegre, nunca se manifestou sobre o tema. Adotou a faceta Luan Futebol Clube e assim ficou. A seu favor, contou o fato de nunca ter enfrentado o Grêmio, segundo o executivo Júnior Chávare, hoje no Atlético-MG, responsável por trazer o atacante ao Rio Grande do Sul, ainda em 2013.
— Encontrei na quarta-feira aqui em Minas (Atlético e Corinthians se enfrentaram no Mineirão), conversamos rapidamente. Ele segue o mesmo menino tímido de sempre, é um cara agradável, carinhoso — contou Chávare.
Essa opinião é partilhada por Rui Costa, diretor do Grêmio na época em que Luan subiu para o time profissional. O executivo, inclusive, contou uma história curiosa:
— Sabia que o Luan precisava de uma motivação, de uma agitada. Então chamei na minha sala e disse: "A partir de agora, tu vais usar a camisa 7. Tens noção do que significa usar a camisa 7 do Grêmio?". Ele sorriu, disse uma ou outra palavra, sempre daquele jeito meio calado, envergonhado, e saiu. Depois, escreveu o nome dele na história. E em todos esses anos, nunca fez uma menção sequer ao Corinthians, ou a algum clube. Foi profissional.
Luan no Corinthians
O Luan que chegou ao Corinthians está mais para o Luan que saiu do Grêmio do que para o Luan que encantou a América do Sul em 2017. Esses "Luans" todos fazem parte de um jogador indiscutível tecnicamente, mas que há pelo menos dois anos sofre com problemas físicos que atrapalham seu rendimento em campo.
Contratado pelo Timão para fazer de 2020 o ano da virada, não conseguiu ajudar o time suficientemente para avançar na Libertadores. Curiosamente, na partida que vários analistas apontam como sua melhor pela equipe de Tiago Nunes, a equipe foi eliminada ainda na fase preliminar da competição continental, para o Guaraní-PAR.
Apesar dos problemas, Luan jogou em 20 das 21 partidas do Corinthians na temporada. Foi titular em 19 deles (e na que não saiu jogando, contra a Inter de Limeira, todo o grupo estava preservado para o jogo da Libertadores). Só não entrou em campo na quarta-feira passada, contra o Atlético-MG no Mineirão. Segundo o jornalista Rodrigo Vessoni, setorista no site especializado em Corinthians, Meu Timão, a decisão de Tiago Nunes de não colocá-lo foi justamente para prepará-lo para o jogo de sábado.
— Luan está tendo problemas de adaptação por causa de seu estilo. No Corinthians, a torcida gosta de jogadores como Romero, que era muito mais transpiração do que inspiração. Não é o jeito dele. Comparo com a situação do Danilo, que chegou em 2010. Era vaiado, tinha faixas contra, mas aos poucos os torcedores entenderam que eram eles que precisavam se adaptar, e não o contrário — analisa.
O atual camisa 7 também já foi alvo de críticas. Após a perda do título paulista para o Palmeiras nos pênaltis, Luan foi chamado de pipoqueiro por não ter participado das cobranças. Ainda assim, segundo Vessoni, o episódio ganhou muito mais força por ser no Corinthians, um clube de massa e ampla cobertura.
— Foram dois torcedores que estenderam o cartaz e atiraram rojão. Não foi movimento de alguma organizada ou algo assim. É que o Corinthians dá muita vitrine. Luan não consegue jogar bem, é verdade, mas saem dele as jogadas mais perigosas. É uma questão de adaptação, tempo e sequência — finaliza.