
A relação da diretoria do Grêmio com o empresário Pablo Bueno já não era das melhores. Depois do desacerto na renovação com o atacante Ferreira, culminando com uma liminar na Justiça que exige a rescisão de contrato, as partes entraram de vez em rota de colisão. Alvo de críticas de dirigentes e torcedores, o agente resolveu contar a GaúchaZH sua versão sobre os fatos.
Direto da Ucrânia, onde acompanha Tetê (seu outro atleta, que teve saída polêmica ao ser vendido ao Shakhtar Donetsk em 2019), Bueno explica o imbróglio com o Tricolor, ao mesmo tempo em que declara amor ao clube:
— Duvido alguém ser mais gremista do que eu.
Por que você e o Grêmio não chegaram a um acordo para a renovação de contrato do Ferreira?
Eu fui chamado para renovar com o Ferreira, mas estava esperando uma coisa e o Grêmio veio com outra. O que eles estão oferecendo agora deveriam ter oferecido no ano passado. Eles quiseram renovar sem aumento de salário, sem ajuda de custo de aluguel, e aceitamos numa boa, acreditando na ideia deles de que, se o guri aprovasse no profissional, iria ser valorizado. Mas, quando chegou no profissional, disseram que ele não havia confirmado. Eles usaram o comparativo com o Everton, nos jogando contra a torcida. Pelas propostas que recebeu, o Ferreira esperava ser valorizado. Eu cobro que meus atletas tenham foco, treinem em dois turnos, que tenham coragem. Quando chegou a minha vez, tive de fazer a mesma coisa e defender ele.
Se vocês renovaram o contrato do Ferreira no fim do ano passado, por que foram renovar de novo agora? Estava previsto isso?
Claro que não estava previsto. Fizeram isso para pagar mais barato. Isso o torcedor não enxerga. Ele havia sido mandado embora, ninguém acreditava nele, estava emprestado ao Aimoré. Pagamos um tratamento com células-tronco para recuperar ele (sofria de fascite plantar). Já não é um menino, tem 22 anos. Confiou em mim, não posso me omitir. Dizem que a torcida não gostou, mas ele está feliz comigo. Tanto que muitos empresários procuraram ele depois disso e ele cortou todos. Os jogadores querem alguém que defenda eles. Muitos atletas me procuraram, do Grêmio inclusive, elogiando minha postura. Todo mundo abaixa a cabeça para o Grêmio, eu botei minha cara para bater. O Grêmio disse que ele não é um jogador afirmado, mas eu acho ele um craque.
Como foi a proposta que ele recebeu do Athletico-PR?
Primeiro, o Athletico procurou o Grêmio. Queriam trocar pelo Matheus Rossetto. O presidente Petraglia (Mario Celso, dirigente do Athletico-PR) falou com o Romildo, que respondeu que, se o Everton saísse, não iria negociar o Ferreira. Eles queriam comprar 50% dele. Convicto do acerto, o Athletico me procurou, viajei para lá, fiquei um dia no CT deles, acertamos salários. O Everton não saiu e nós pensamos que o negócio iria acontecer. Mas, quando chegou na hora, o Grêmio não aceitou. Queriam a renovação do contrato, mas o guri não quis, o pai não gostou da proposta e eu fui defender ele. Buscamos um meio-termo e nem assim conseguimos.
Você investiu dinheiro no Ferreira, na recuperação física e clínica dele. Você quer um retorno financeiro?
A parte financeira não me interessa. Tanto que a minha comissão, como agente, eu daria para ele. Eu já dei carro para ele, agora dei um terreno para os pais deles construírem uma casa no bairro mais nobre da cidade deles. Estou só defendendo o lado do jogador.
Vocês entraram na Justiça tentando rescindir o contrato com o Grêmio e não conseguiram. Acha que ainda existe clima para ele no clube?
O juiz julgou só a liminar, não deu ganho de causa ainda. A primeira instância não é voltada para o esporte. É trabalhista. Mas não tem mais clima, não. O Grêmio que criou esse clima. A gente iria resolver entre nós. O Grêmio não precisava ter ido para a mídia.
Você tem outros atletas na base do Grêmio? Não teme que isso te inviabilize?
Tenho outros guris no time sub-20, sub-13 e sub-12 . Gosto de pegar desde pequeninho para ensinar a mentalidade vencedora para eles. Mas prefiro não citar os nomes para que eles não sofram perseguições. Na verdade, eu nunca tive relação com a direção do Grêmio. Fui conhecer o presidente quando começamos a negociar o Tetê. Não tinha por que eu falar com os outros dirigentes. No futebol, se fala com quem manda.

Como foi a venda do Tetê?
O Sporting Lisboa contatou o presidente, oferecendo R$ 17 milhões pelo Tetê. Fiquei sabendo por um amigo e fui falar com o Romildo, dizendo que ele valia muito mais. Eu disse que traria uma proposta maior e, 10 dias depois, fui a Osório levar uma oferta de 10 milhões de euros. Depois do Campeonato Sul-Americano (Tetê disputou o torneio com a seleção sub-20 no Chile), pedi para que subissem ele para o profissional. Não pedi para ele jogar como titular, mas que tivesse uma chance de ao menos treinar entre os profissionais. Mas aí o Romildo me ligou e disse: "Entre nós e Shakhtar está tudo acertado. Se tiver acerto entre vocês, a gente vende ele". Não entendi, porque ele havia me dito que não queria vender. Depois me disseram que ele foi vendido para pagar o Diego Tardelli, que ganhava um milhão e meio por mês. Mas isso ninguém fala.
Me disseram que ele (Tetê) foi vendido para pagar o Diego Tardelli, que ganhava um milhão e meio por mês. Mas isso ninguém fala.
PABLO BUENO
Empresário de Ferreira e Tetê
Alguns torcedores do Grêmio passaram a xingar você e o Ferreira nas redes sociais. Isso te incomoda?
Estão nos xingando muito, mas não tenho medo. Hoje temos condição de pagar segurança. Mas duvido que algum destes torcedores seja mais gremista do que eu. Lembro do primeiro jogo que fui ao estádio. Foi contra o Operário, o time estava na Série B (em 1993). Eu era pobre, morava em Alvorada, era muito difícil ir ao Olímpico. Por isso, eu digo: duvido alguém ser mais gremista do que eu.
Você não tem jogadores no Inter?
Não, porque eu trabalho com os guris do Grêmio. Como vou falar que estou torcendo por eles se do outro lado também tenho atletas? Não tem como. Seria mentira. Muitos jogadores do Inter me chamaram, mas não tem como. É muita rivalidade na base. E também por eu ser gremista. Quando tentei ser jogador, só tentei no Grêmio.
Você tentou ser jogador profissional?
Eu tentei jogar bola, mas era vagabundo. Não tinha força de vontade, disciplina, achava que me daria bem só por jogar bem. Quando o professor estava olhando, eu corria. Quando ele virava de costas, parava. Até que um dia ele me disse: "Tu acha que me engana, mas está te enganando. Quem quer ser jogador é tu!". Aquilo foi um tapa na minha cara. Sou uma pessoa normal. Vim de uma infância pobre. Quando eu era pequeno, ajudava meu pai, que trabalhava vendendo joias na Praça da Redenção. Se chovesse no domingo, a gente não tinha comida em casa durante a semana. Era um inferno minha vida. Fui criado em Alvorada, no meio da dificuldade, tive amigos que se envolveram com tráfico e morreram. A criança que suportou essas coisas, não tem como ter medo do desafio. Por isso, ensino os guris a não cometerem os erros que eu cometi. Dizem que somos mercenários, mas ninguém nos vê na balada, na bagunça. Sou um cara tri família.
E como você virou empresário de atletas?
O pai do Tetê se criou com o meu pai. São amigos de infância. Vi ele jogar com oito anos de idade e vi que tinha o gesto natural de pegar a bola de lado. Parecia um adulto. Levei ele para a escolinha do Grêmio e apostei nele. Cresci assim. Sou amante do futebol. Sempre tive talento para ver um jogador e saber se ele é bom. Não entrei no futebol por causa do meu pai ou porque trabalhei para alguém mais famoso. O Tetê foi morar comigo quando tinha 13 anos. Teve uma chacina na rua dele, em Alvorada. Na época, eu estava morando na zona sul (de Porto Alegre) e levei ele para morar comigo. Como não vou lutar por eles? Por isso, quando eu vou defender um jogador, esqueço que sou gremista.
Você está na Ucrânia agora. Como estão as coisas por aí depois da pandemia do coronavírus?
Agora está tudo fechado. Pararam os jogos, os treinos, fecharam as academias. Estou só esperando o aeroporto abrir para voltar para o Brasil.