Entre as peculiaridades do técnico do Flamengo, Jorge Jesus, chama atenção o tamanho da sua comissão técnica. Ao aceitar o convite do clube carioca em junho, o treinador português exigiu a contratação de sete profissionais, algo bastante incomum no futebol brasileiro. Fazem parte da sua equipe dois auxiliares, dois preparadores físicos, dois analistas de desempenho e até um motivador. Ajudar nos treinos, analisar os adversários, pilotar drones e até orientar o conteúdo das suas entrevistas são algumas das funções dos apóstolos do comandante rubro-negro.
— O Jorge Jesus tem de estar sempre rodeado de pessoas de extrema confiança e que o conheçam, pois ele tem uma personalidade forte. Gosta de se concentrar em fases específicas do jogo e do treino. Por isso, precisa que toda a sua equipe esteja atenta às outras situações — explica o jornalista português João Fonseca, da Rádio Renascença, que acompanhou a maioria dos trabalhos de Jesus em Portugal.
No Brasil, o mais comum é que o treinador indique para o clube apenas um assistente da sua confiança. O técnico do Grêmio, Renato Portaluppi, por exemplo, levou ao Grêmio só o auxiliar Alexandre Mendes, que o acompanha desde o início da carreira. Com Jorge Jesus, no entanto, é diferente. Na sua equipe, existe inclusive a figura do "mental coach", nomenclatura oficial do cargo do motivador Evandro Motta, o único brasileiro da comissão técnica nomeada pelo comandante luso.
O profissional possui diversos títulos importantes no currículo. Trabalhou na Seleção Brasileira na conquista da Copa do Mundo de 1994, sob o comando de Carlos Alberto Parreira, e também no Inter, em 2006, nos títulos da Libertadores e do Mundial, sob a liderança de Abel Braga. Com Jesus, Motta atuou por cinco temporadas, no Benfica e no Sporting. Ele costuma dizer que a sua função é impor aos atletas "uma mentalidade campeã". Além disso, orienta o treinador a manter a calma e a evitar atritos nas entrevistas.
— O Jorge Jesus é esquentado. Quando treinou o Sporting, trocava muitas farpas publicamente com o técnico do Benfica, Rui Vitória. Acompanhei aqui de Portugal o confronto de palavras que existiu entre Jesus e Renato antes do primeiro jogo da semifinal. A calma que o Jesus teve nesse duelo se deve muito à influência do Evandro Motta, que o orientou a não entrar em discussões verbais. Ele atua como um psicólogo motivacional e é um personagem importante na comissão técnica — revela o repórter Duarte Tornesi, do jornal português O Jogo.
O profissional mais importante da equipe de Jesus, no entanto, é o preparador físico Mário Monteiro, que está com ele há 14 anos, desde os tempos de União de Leiria. Os dois trabalharam juntos também no Belenenses, no Braga, no Benfica, no Sporting e no Al-Hilal. Além de orientar os trabalhos físicos, o preparador participa ativamente das atividades técnicas e táticas.
— O Mário Monteiro é o braço direito de Jorge Jesus, o acompanha em todos os desafios —sintetiza a jornalista Irene Palma, do jornal A Bola.
Os demais integrantes da comissão técnica estão com o treinador há menos tempo. O auxiliar-técnico João de Deus comandava o time B do Sporting quando Jesus assumiu a equipe principal, em 2015. O trabalho agradou e o profissional foi "promovido" a auxiliar, acompanhando o comandante em todos seus projetos. Estudioso, é conhecido por viver o futebol 24 horas por dia.
Como Jorge Jesus tem o hábito de utilizar os titulares em todos jogos, mesmo com a rotina brasileira de partidas nas quartas e nos domingos, prevenir lesões é uma das prioridades da sua comissão técnica. Esta é a função do preparador físico Márcio Sampaio, auxiliar de Monteiro. Além de fazer atividades para aliviar o desgaste físico dos atletas, o profissional costuma comandar os treinos dos jogadores que estão voltando de lesão, priorizando uma rápida recuperação.
— O Márcio Sampaio é mais do que um preparador físico. Ele faz trabalhos específicos para a recuperação física após os jogos. É uma pessoa muito importante no trabalho — explica o jornalista Bruno Fernandes, do jornal Record.
A comissão técnica de Jorge Jesus tem ainda o auxiliar Tiago Oliveira, responsável por orientar o posicionamento defensivo dos atletas, e dois analistas de desempenho, Rodrigo Araújo e Gil Henriques. Enquanto o primeiro pilota um drone durante os treinamentos, para que as imagens da atividade possam ser analistas depois, Henriques observa os jogos das equipes adversárias, para que Jesus possa preparar a estratégia mais adequada.
Após cerca de três meses de trabalho, a metodologia de Jesus e de seus auxiliares é ainda pouco conhecida da imprensa carioca. Afinal, desde que o treinador português assumiu, todos os treinos do Flamengo passaram a ser fechados.
Porém, uma das características marcantes contadas por quem conhece mais de perto o trabalho de Jorge Jesus é que o treinador é muito perfeccionista e exigente. O técnico costuma inclusive telefonar para os seus auxiliares nos horários mais diversos, inclusive na madrugada, para discutir alguma questão relativa ao trabalho.
— Ele é viciado em futebol, vive isso quase 24 horas por dia. Busca a perfeição e é muito detalhista. Nós vamos para o jogo sabendo tudo o que precisamos fazer. Mas é lógico que o trabalho tem de ser concretizado com títulos, e é isso que a gente está buscando — declarou o goleiro Diego Alves.
E, para atingir esse objetivo, Jesus confia bastante na ajuda dos seus apóstolos.
Conheça os sete auxiliares de Jorge Jesus:
João de Deus, o estudioso (auxiliar-técnico)
Lê bastante literatura do esporte e assiste a muitas partidas. É o chamado estudioso do futebol. Como jogador, foi zagueiro de Jorge Jesus no Vitória de Setúbal, entre 2000 e 2002. Porém, não teve uma carreira de destaque. Como treinador, trabalhou na Índia, no Chipre, em Angola e em Cabo Verde. Trabalha com Jesus desde 2015, quando era técnico do time B do Sporting. Costuma ser muito ativo no banco de reservas durante os jogos.
Tiago Oliveira, o defensivo (auxiliar-técnico)
Possui a licença PRO da Uefa, certificado mais alto da entidade europeia para treinadores. Porém, nunca foi o chefe de uma comissão técnica. Trabalhou no futebol polonês e conheceu Jesus em 2018, quando trabalharam juntos no Al-Hilal, da Arábia Saudita. Nos treinos, costuma orientar o posicionamento defensivo dos atletas.
Mário Monteiro, o braço direito (preparador físico)
É o profissional que está há mais tempo com Jesus, o seu fiel escudeiro. Além de programar os trabalhos físicos, participa também das atividades táticas e técnicas. Estão juntos desde 2005, quando o treinador comandava o União de Leiria.
— Mário Monteiro é um companheiro de uma vida inteira de Jesus. Tem acompanhado o técnico em toda a sua carreira e é um fiel amigo — conta João Fonseca, da Rádio Renascença.
Marcio Sampaio, o recuperador (preparador físico)
Possui um trabalho focado em prevenir lesões e acelerar a recuperação dos atletas. Está com Jesus desde 2008, quando trabalharam no Braga. Atua como auxiliar de Mário Monteiro. Tem experiência no mundo arábe.
Rodrigo Araújo, o piloto (analista de desempenho)
Durante os treinamentos, o analista pilota um drone, que filma as atividades. Depois, as imagens são colocadas à disposição de Jorge Jesus e dos demais auxiliares para análise da movimentação dos atletas. O profissional é conhecido por ser especialista em novas tecnologias e está com o treinador desde os tempos de Benfica, em 2009.
Gil Henriques, o espião (analista de desempenho)
A sua função é analisar os jogos das equipes adversárias e ajudar a montar a melhor estratégia para neutralizar os pontos fortes do time rival. Monitora também o desempenho dos jogadores do Flamengo nos treinos.
Evandro Mota, o motivador (mental coach)
Especialista em motivação e coaching, está no futebol deste os anos 1980. Participou do tetracampeonato mundial da Seleção Brasileira, na Copa do Mundo de 1994, e dos títulos do Inter em 2006, da Copa Libertadores e do Mundial. Trabalhou por cinco anos com Jorge Jesus no futebol português, no Benfica e no Sporting. Costuma dizer que seu objetivo é "implementar nos atletas uma mentalidade campeã". Além de motivar o grupo, orienta o treinador a não entrar em polêmicas com adversários nas entrevistas, algo que era comum em Portugal com os rivais Rui Vitória, ex-Benfica, e Julen Lopetegui, ex-Porto. Não trabalhou com Jesus no Al-Hilal, na Arábia Saudita, mas aceitou o convite para compor a equipe de trabalho no Flamengo. É o único brasileiro da comissão indicada pelo comandante.