A torcida mista, instituída pela dupla Gre-Nal, é algo que merece análise e reflexão. O sucesso da iniciativa, enfrentando de forma inédita a violência por meio de um ato de paz, vai além dos limites do mundo esportivo, permitindo algumas lições que não podem ser desconsideradas.
O Brasil, país rico pela própria natureza, vive um inesgotável quadro de miséria material, política e moral. Várias são as causas e muitas são as explicações. Prefiro uma: somos todos vítimas de segmentos organizados que cada vez mais dominam o cenário nacional. Na política, a corrupção é regra, organizada em partidos sem ideologia alguma que não a do proveito próprio. A violência, que só aprisiona os de bem, decorre da absoluta falência do Estado frente ao crime organizado.
No futebol, algo semelhante acontece. O lado positivo da nossa eterna e singular rivalidade futebolística nos levou a títulos e a façanhas inimagináveis. Somos campeões do mundo e donos de estádios que não devem nada para os grandes da rica Europa. Contudo, uma minoria organizada, valendo-se da cegueira da paixão e até por interesses econômicos, vitaminados pelas redes ditas sociais, subjugam a grande maioria da duas torcidas, formadas por pessoas de paz .
Alguém tem dúvida de que a maioria de nós, gremistas e colorados, é representada por aqueles que foram juntos aos últimos dois Gre-Nais, pessoas que defendem com paixão sua cor, mas que querem viver o futebol só para aquilo que ele existe - diversão, jamais guerra?
As diretorias do Inter e do Grêmio merecem todos os elogios pela ousada inovação, que está servindo de exemplo para o mundo todo. Contudo, as direções dos clubes e as forças de segurança não podem desconsiderar que esse é apenas o primeiro passo. Os poucos marginais que se travestem de torcedores e integram organizadas farão de tudo para impedir a consolidação do clima de paz, pois isso é uma ameaça às suas pretensões de poder e até mesmo de lucro.
Simplesmente eliminar as organizadas é algo que tem se mostrado ineficaz, até porque a maioria de seus integrantes são jovens que querem apenas cantar e incentivar. O show que elas produzem é bonito e faz parte da festa do futebol. O desafio, agora, é identificar, constranger e banir os poucos que só vão sobreviver se a animosidade e a violência prevalecerem. É hora da maioria se organizar e se impor, lição que o futebol está dando, mas que pode servir de exemplo à construção de uma nação melhor.