Você que já jogou um torneio colegial vai lembrar do nervosismo. Oitava série, clássico contra a 104 B, o fixo deles batia até na mãe. A quadra era de cimento. Não reclamávamos do piso, como as seleções andam fazendo aqui em Doha. Muito jogo, pouco campo – são oito no Catar inteiro – e gramados desgastados. Mas na peleia contra a 104 B não tinha desculpas.
A noite anterior à decisão pesa. Não se relaxa, se vira para lá e para cá, vai na geladeira pegar uma água na madrugada. Meu irmão, mais jovem, nas suas competições colegiais, dormia de caneleira com meia alta. Era só acordar, jogar uma água na cara e ir à quadra. Meu irmão, eu e você lembramos do medo, da tensão. Não se pode perder para a 104 B. Os recreios serão horrorosos, a escola toda vai debochar de ti, vai dizer que tu não "joga nada". Os professores saberão da sua partida patética, talvez o de Educação Física lhe dê nota baixa pelo péssimo desempenho.
Lionel, o Scaloni, treinador da Argentina, poderia ter sido nosso técnico naquela época. Vou deixar em espanhol para pegarmos o ritmo e a potência das frases:
— Pero es difícil hacerle entender a la gente que es un partido de fútbol y que mañana sale el sol, gane o pierda, y que lo importante es cómo se hicieron las cosas, o si las intentás hacer lo mejor posible. Y nosotros lo hicimos.
Mundo nas costas
Messi joga com o mundo nas costas. Precisa fazer algo além de futebol. Os companheiros sentem junto o peso, fracassam, ficam nervosos. A torcida argentina e do mundo todo quer espetáculo, e não tem como realizar sempre. E mais: futebol se joga com amigos, é um sistema complexo. Eu ajudo o Nêgo Mauro no gol, ele ajuda o Gabriel, que volta para marcar pelo Cassio que precisa dar assistência para eu marcar um gol. Todos por todos.
Mas Messi não. Porque os argentinos são os primeiros que transformam o jogo de sua seleção numa batalha épica e não se dão conta que é somente "uma partida de futebol e que amanhã vai sair o sol, ganhando ou perdendo". Scaloni está certo. Nos ajudaria muito naquela final de torneio que perdemos para a 104 B por 2 a 1 com o fixo deles batendo até no juiz. E foi de virada. Jogamos nada, entramos nervosos, nosso futebol não apareceu.
Messi: é só um joguinho contra a 104 B.