Entre quedas de receita violentas e despesas extras para se adaptar à realidade da pandemia, os empresários se equilibram para sobreviver a uma crise sem precedentes. Carlos Henrique Schmidt, presidente do Sindicato de Hotéis de Porto Alegre (SHPOA), avalia que a medida provisória que permitiu a redução de jornada de trabalho e a suspensão de contratos foi o que evitou que o setor quebrasse. Mas o futuro é incerto.
— Para pagar os custos, um hotel precisa ter ocupação de 35% a 40%, isso em tempos normais. Para reabrir e obedecer os protocolos de segurança e higiene mais rigorosos, os custos aumentam — explica.
No comércio, são as vendas online que garantem o pagamento dos funcionários de muitas empresas, conforme Paulo Roberto Kruse, presidente do Sindilojas POA. Até quem antes não trabalhava com e-commerce aderiu à prática, seja por meio de redes sociais, seja por plataformas de vendas — em especial as recentes soluções lançadas por startups.
A inserção acelerada das lojas no meio digital foi uma das poucas coisas boas que aconteceram, avalia Kruse, que considera ainda a concessão de crédito pelo Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) fundamental para dar gás ao comércio na reabertura.
Iniciativa do governo federal, o programa oferece condições especiais em linhas de crédito para estas empresas. Diversos bancos credenciados já atingiram o limite de contratações e alguns passaram a oferecer outras alternativas. Há expectativa de que novas instituições se cadastrem no Pronampe na próxima semana.
Olho no futuro

No ramo da gastronomia, a oferta de delivery e pague e leve (take away) de refeições triplicou nos últimos meses na Capital, com a entrada de empresas que antes atendiam apenas em seus salões. Foi o caso do restaurante da família de Raqueli Baumbach, que, em 52 anos de existência, nunca havia produzido para entrega. Vice-presidente do Sindicato de Hospedagem e Alimentação de Porto Alegre e Região (Sindha), ela conta que essa virada exigiu investimento financeiro e, mesmo assim, o resultado é 20% do faturamento anterior.
— Temos sede própria, tínhamos caixa e sabemos que não vamos recuperar o investimento ainda este ano. Mas e os pequenos? E quem paga aluguel? A maioria teve que ir aos bancos tomar crédito — diz Raqueli, que, apesar das incertezas, mantém o otimismo cultivado pelo pai, fundador do restaurante.
Mesmo o segmento que mais rápido passou para o meio virtual, a educação, pisa em terreno escorregadio. Bruno Eizerik, presidente do Sindicato do Ensino Privado (Sinepe/RS), teme que várias escolas infantis não suportem as perdas por cancelamento de matrículas e encerrem as operações.
As instituições de ensino superior investiram para mudar todo o processo pedagógico para a educação a distância em pouquíssimo tempo e, na maioria dos casos, alunos e professores se adaptaram bem às mudanças, informa Antônio Ternes, diretor da Fundação Educacional Machado de Assis (FEMA) e membro da diretoria do Sinepe/RS. Porém, houve muito cancelamento de matrículas e a inadimplência é o dobro do mesmo período de 2019, sobretudo porque alunos perderam o emprego.
Quando as instituições reabrirem, os custos com escalonamento de alunos e os protocolos de higiene e segurança serão superiores ao que se economizou com água e luz, avaliam os dirigentes. A tecnologia, decisiva para as adaptações de muitos setores, viu mudança nas demandas com o distanciamento social. Por um lado, a procura por produtos para home office cresceu e, por outro, a busca por equipamentos de automação comercial e data center caiu, relata Rogério Fluzer, diretor da Mazer Distribuidora. Para ele, o alto investimento nas condições do trabalho remoto pode indicar uma tendência permanente no futuro dos negócios.
Grandes têm mais fôlego, mas não imunidade
Empresas com poder de negociação na compra de insumos e acesso facilitado ao crédito têm mais fôlego nos momentos difíceis. Qualidades essas típicas das grandes empresas, explica Antônio André Neto, coordenador de MBA e professor da Decision/FGV (Fundação Getúlio Vargas). Marisa Rhoden, professora de Administração da UFRGS, concorda que organizações com melhores reservas financeiras, recursos de gestão, marketing e comunicação têm mais capacidade de se recuperar de adversidades, mas lembra que porte não garante imunidade à crise.
— Setores essenciais, como farmácias, supermercados, telecomunicação e serviços como saneamento e fornecimento de energia são mais resilientes. Os mais afetados pelo isolamento social são transporte, distribuição de combustível, turismo, eventos, restaurantes, bares, shoppings e vestuário — afirma Marisa.
O fato é que a maioria dos consumidores teve redução de renda, está insegura quanto aos empregos, tornou-se mais cautelosa para gastar e resiste em assumir dívidas de longo prazo, acrescenta. A mudança no padrão de consumo da quarentena vai influenciar também o período pós-pandemia e isso afeta diferentes setores da economia de formas e intensidades distintas, avalia Marisa.
Sobreviver a períodos difíceis requer um grande esforço, com um controle muito mais atento às contas a receber e contas a pagar e sobretudo na retenção de clientes, afirma Neto. Manter os clientes é o primeiro grande desafio e conquistar novos é um sonho a ser buscado, conclui.
A pandemia fez uma rede mundial de hotéis transformar quartos em escritórios para teletrabalho. Também fez um shopping de Porto Alegre divulgar o WhatsApp dos seus lojistas para que continuassem vendendo de casa enquanto não podiam abrir no empreendimento. Demitido de um hotel, um leitor conseguiu emprego em uma farmácia. Uma comerciante de Canoas comprou malas, encheu de roupas e passou a bater de porta em porta. Acabou vendendo até as malas, mais perfumes de uma cliente e doces da outra.
Ter tecnologia e grandes aportes financeiros para inovar é incrível. Mas não é essencial. Mexer no processo, adaptar o produto ou fazer parcerias estão ao alcance mesmo dos pequenos. Talvez seja até uma boa hora, já que muita gente está disposta a pegar junto.
O raciocínio básico é simples e lógico. A economia não parou. Então, o que ela precisa hoje? Você, como profissional ou empresa, tem como oferecer isso? O desafio é fazer isso rápido e com o menor custo possível. Convide sua equipe ou sua família para pensar e tomar decisões junto. Você pode se surpreender com o apoio que tem.