O príncipe Harry, 38 anos, se tornou, nesta terça-feira (6), o primeiro membro da realeza britânica a testemunhar em um tribunal desde o século 19. O duque de Sussex iniciou seu depoimento ante a Alta Corte de Londres, relatando o sofrimento causado por centenas de conteúdos publicados pelo Mirror Group Newspapers (MGN), o qual acusa de ter coletado informações sobre ele de forma ilegal.
O filho caçula do rei Charles III, dois atores de televisão e a ex-esposa de um comediante acusam este grupo, editor do jornal Mirror e da revista Sunday People, entre inúmeras publicações, de obter detalhes a respeito de suas vidas entre 1996 e 2011 por meio de métodos como invasão de celulares.
— Mais de milhares, talvez milhões, de artigos foram escritos sobre mim desde que eu tinha 11 anos — lembrou, apesar de, neste caso, o juiz analisar apenas 33 deles.
O príncipe também denunciou "a invasão da imprensa durante a maior parte da vida até o dia de hoje".
— Cada um desses artigos me causou sofrimento. Quando criança, cada um desses artigos era uma distração enquanto crescia — declarou, citando informações que, às vezes, remontam a mais de 20 anos e que ele admitiu não recordar com precisão.
E relembrou que informações sobre questões delicadas estavam em todos os palácios, como sua reação ao divórcio de seus pais, o então príncipe Charles e a princesa Diana, que morreu em acidente de carro em 1997.
— Outras pessoas, amigos, colegas de escola liam as matérias e seu comportamento mudava — disse ele com voz tímida e hesitante.
Harry também contou que isso deixou-o paranoico em suas relações, desconfiando de qualquer pessoa que pudesse fornecer informações sobre ele, e levou-o a reduzir seu círculo de amizades. Embora achasse "difícil acreditar como (o jornal) teria conseguido (algumas informações) de outra forma", para além de "hackear" suas mensagens telefônicas, ele não conseguiu fornecer provas sobre essas acusações.
Para o príncipe, a reputação do Reino Unido foi prejudicada pelos laços entre a mídia e o governo:
— Nosso país é julgado globalmente pelo estado da nossa imprensa e do nosso governo, e acho que ambos estão no nível mais baixo (...) A democracia fracassa quando a imprensa não escrutina nem exige responsabilidades do governo e, em vez disso, escolhe ir para a cama com eles para garantir o status quo.
Relações tensas
O duque de Sussex não voltava ao país desde a cerimônia de coroação do pai, em 6 de maio, à qual compareceu sem a esposa, a atriz americana Meghan Markle. Ele partiu logo após o evento, retornando para os Estados Unidos, onde o casal mora desde 2020.
Sua declaração nesta terça-feira é a primeira de um membro da realeza britânica desde Edward VII, que testemunhou em um julgamento por difamação em 1891, antes de assumir o trono. No início do processo, em maio, o MGN reconheceu indícios da coleta ilegal de informações sobre Harry em uma única ocasião, pediu desculpas e garantiu, à época, que essa conduta não se repetirá.
Seu advogado, Andrew Green, negou, no entanto, que as mensagens de correio de voz tenham sido interceptadas e argumentou que algumas ações foram movidas tarde demais, décadas depois dos supostos eventos.
Histórico
O príncipe e sua esposa mantêm relações tensas com a imprensa. Há algumas semanas, ambos relataram ter sofrido uma perseguição de carro quase catastrófica por parte de paparazzi nas ruas de Nova York.
As autoridades locais minimizaram o episódio, que lembrou o acidente de trânsito de 1997, em Paris, que matou a princesa Diana, enquanto era perseguida por fotógrafos.
O príncipe acusou recentemente outros membros da monarquia britânica de conluio com a imprensa. Em documentos apresentados aos tribunais em abril, afirmou que a família real havia chegado a um "acordo secreto" com um editor para evitar que qualquer um de seus membros tivesse que depor. Harry alegou que isso o impediu de entrar com uma ação enquanto fazia parte da realeza.