Ana Clara tem três anos e adora ir pescar na prainha que fica a uma quadra de distância de casa. Geralmente é o tio Guilherme quem a leva. Saem carregando vara, anzóis, iscas artificiais e uma caixa de isopor (que eu não sei pra que serve, já quem eles nunca trazem nada, pois devolvem os poucos peixinhos pescados ao mar). A pequena usa um chapéu de palha para proteger a pele branquinha como neve.
- Onde você vai tão linda? - pergunto.
- Pescar peixes. Muitos peixes cor de rosa.
Ela adora essa cor, e Guilherme tem algumas iscas artificiais - peixes e camarões - cor de rosa. Levam tudo para a beira do mar. Ana cada vez mais ansiosa:
- Cadê os peixes, tio?
- Calma... Daqui a pouco ele vem... Espera um pouquinho.
Ela brinca por ali, faz montinhos de areia, rabisca o chão com uma varinha, mas não consegue conter a ansiedade. Dá gosto de ver quando o primeiro peixinho é içado. A guria berra, grita e festeja, mas tem medo de chegar perto. Aproxima-se aos poucos e fica decepcionada quando vê que o bichinho não é cor de rosa.
- Esse não quero. Pesca um cor de rosa.
O peixinho prateado volta para o mar. Não agradou a pequena pescadora. Vem o segundo peixinho, e Ana mais uma vez festeja.
- Agora só pode ser o meu, tio!
Mas a tarefa de pescar um peixe rosa não é fácil. Mais um que volta para a água. O sol começa a esquentar demais e é hora de voltar para casa. Difícil missão do tio a de explicar para a afilhada pequena que ali não tem peixe rosa, e que aqueles peixinhos e camarões de silicone que são usados como iscas têm essa cor porque são artificiais, ou seja, não são peixes de verdade.
Ana se irrita com tanta explicação e diz que quer ir para casa. Juntam tudo e deixam a prainha. Em casa, ela se distrai com outros brinquedos e o assunto do peixe rosa é esquecido.
Na hora do almoço, a coincidência: o prato é salmão. Explico para ela que vamos comer um peixe delicioso. Quando ela vê seu prato, dá um grito:
- Tá aqui o peixe rosa do mar! A Dinda foi lá antes de nós e pescou ele!
Ela se negou a comer o peixe rosa, brigou comigo e saiu da mesa furiosa. E a pequena tinha toda a razão: como é que pode, os adultos da casa comerem justamente o peixe rosa que ela tanto queria como bichinho de estimação? Vou ter que sair atrás de um peixinho de aquário para dar a ela no Natal. Quem sabe assim ficamos amigas novamente...
Ela brinca por ali, faz montinhos de areia, mas não consegue conter a ansiedade
Viviane Bevilacqua
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