Não, não acho que se começa a viver aos 50 anos. Também não gosto de eufemismos como melhor idade. Completei meio século de existência em dezembro passado, e desde então tenho plena convicção de que já passei da metade da minha vida. Isso é bom? Não, eu preferia ter 20, 30. Queria estar começando tudo de novo e ter a expectativa de uma vida muito longa e cheia de aventuras pela frente.
Mas ser uma envelhecente tem lá suas vantagens também. Hoje descobri mais uma delas.
Estava numa loja no shopping e, como sempre, não achava roupas que me servissem. É um deboche chamarem de "tamanho G" uns pedacinhos de pano que mal servem para cobrir os manequins da vitrina. Se "G" quer dizer "grande", obviamente roupas G deveriam ser maiores. A palavra "grande" - é só abrir o dicionário e ler - quer dizer: "que possui dimensões corpulentas". Quem decide o tamanho das peças de roupa nunca leu essa definição.
Eu já estou acostumada com isso - está aí uma vantagem da idade, a gente para de dar importância às coisas que não são assim tão sérias - mas perto de mim, na loja do shopping, duas jovens tentavam comprar jeans. Uma delas era bem gordinha, e a coitada parecia sofrer muito por não encontrar roupas do seu tamanho. Eu fiquei só observando a cena.
- Moça, aquela calça ali tem maior?
- Que número você usa?
- Acho que 44. Não, 46, eu engordei um pouquinho.
A vendedora trouxe a 46 e ela foi experimentar. Pouco depois chamou a balconista de novo e pediu uma maior. Levou a 48. Não serviu também. Voltou indignada. A moça da loja ainda tentou oferecer blusas, casacos, mantas, tudo o que havia nas prateleiras e que poderia servir. Mas a jovem estava muito decepcionada.
- Eu não vou à festa hoje. Te falei que não tenho nada pra usar. Vou ficar em casa vendo novela - disse a moça à amiga, com os olhos marejados.
A outra tentou argumentar, mas ela parecia irredutível. Agradeceram a ajuda da vendedora e saíram da loja, sem levar nada.
De longe acompanhei a cena, fazendo de conta que olhava as roupas penduradas nas araras, e pensei que ser jovem não é assim tão bom. A gente sofre muito, porque se acha muito gorda, muito magra, muito feia, muito tímida, muito burra, muito nerd, muito isso, muito aquilo. E tem muito medo do julgamento alheio. Precisamos tanto da aprovação dos outros!
Essa é uma grande vantagem de amadurecer - uma conquista do envelhecimento, eu diria. As pessoas podem até chegar e te dizer: acho que você deveria parar de comer chocolate e fazer uma dieta, ou então perguntar o porquê de você não fazer uma cirurgia plástica para retirar a papada ou levantar as pálpebras - ou ambas. Ou tudo isso e muito mais, já que hoje os tratamentos estéticos estão aí, à disposição e em suaves prestações. Mas você, do alto dos 50 anos, e já bem dona de seu nariz (e de todo o resto também) pode simplesmente olhar bem dentro dos olhos destas pessoas e dizer, com a maior calma do mundo:
- Eu gosto de mim do jeito que eu sou. Passei muito tempo da minha vida procurando agradar a todos. Hoje agrado a mim mesma. Faço aquilo que me dá prazer. A calça jeans da loja do shopping não me serve? Às favas com ela. Coloco um vestido bem fresquinho (sim, porque tem a tal da menopausa chegando), uma sandália rasteirinha, e vou passear bem bela e faceira, com minha mala de rodinhas, pelas ruas charmosas do mundo... É a minha terapia, o que me faz rejuvenescer. E que venha os 60, os 70...
Passei muito tempo da minha vida procurando agradar a todos, hoje agrado a mim mesma
Viviane Bevilacqua
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