Tarde de sexta- feira no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre. Enquanto esperava minha carona, comecei a folhear um jornal que alguém deixou sobre um banco, no saguão, em frente ao setor de desembarque. O barulho era tanto que não consegui manter a concentração no que estava lendo. Algo estranho acontecia. Ouvi gritos. Seria arrastão? Nunca ouvi falar de arrastão dentro de aeroporto, mas com essa violência que anda por aí, sabe- se lá.
Decidi largar o jornal e ver o que era aquele burburinho todo. O movimento estava bem superior ao normal, mas o que me chamou mesmo a atenção foi a idade da turma que se aglomerava perto das portas de saída do desembarque. Deviam ser umas 50, 60 meninas, todas com idades entre 11, 12 até uns 16 anos, no máximo. E pareciam surtadas.
Com celulares numa das mãos, bloco e caneta na outra, pulavam e gritavam coisas desconexas, pelo menos pra mim. Outras empunhavam cartazes, escritos a lápis e caneta, quase impossíveis de serem lidos. Elas esperavam alguém, isso foi fácil deduzir. Eu só não sabia quem era a celebridade que iria chegar a Porto Alegre de avião e que, em um determinado momento, sairia e daria de cara com aquelas fãs enlouquecidas, dispostas a tudo para "tirar uma casquinha" do ídolo.
As outras pessoas também estavam curiosas para saber quem era a celebridade visitante. Eu não iria embora dali sem essa informação. Mesmo receosa, cheguei mais perto da multidão, cuidando para não levar um pisão no pé, uma cotovelada, um empurrão. Sabe como é, fã afoito demais chega a ser perigoso. Reparei numa loirinha, que segurava um cartaz que dizia "Te amo para sempre" e decidi perguntar a ela:
- Quem é que está chegando?
Ela me encarou com os olhos esbugalhados, quase chorando de emoção e disse, no meio daquela gritaria:
- Eles estão chegando! Essa senhora disse que eles estão chegando! Aiiiiiii! Ohhhhhhhh! Lindoooooo! Te amoooo!
Eu disse? Eu não disse nada. Só estava perguntando. Resolvi cair fora dali. Notei, então, uma mulher um pouco mais velha, afastada da turba de adolescentes. Decidi tentar de novo:
- Oi! Você pode me dizer quem é que elas estão esperando?
- Ah, é a banda Polo.
- Quem? - eu não fazia a mínima ideia.
- Aquela da música do vagalume.
Agradeci, mas continuei sem fazer a menor ideia de quem se tratava.
Pouco depois os gritos chegaram à altura máxima - um pouco mais ameaçaria quebrar os vidros do aeroporto. A banda Polo, enfim, deu o ar da graça.
Demoro a enxergar os integrantes, atordoados no meio das fãs. São quatro ou cinco meninos, também adolescentes, usando bonés, piercings, cabelos oxigenados ( um deles, que deve ser o vocalista, era o que mais arrancava suspiros e levava apertões). Todas queriam abraçá- los, beijá- los, tirar fotos, pegar autógrafos e entregar presentes.
Eles, cheios de marra, estavam se achando o máximo.
- Calma, garotas. Tem pra todas.
Uma chorava, todas choravam. Uma gritava, todas gritavam. A mulher para quem eu fui pedir informações era mãe de uma das meninas. Estavam no aeroporto desde as 10h. Já era mais de 16h quando a banda chegou. Enquanto a filha beijava, abraçava e chorava de emoção na frente dos meninos, ela esperava, resignada, encostada num pilar do saguão.
- Você não se aborrece de ter de esperar tanto tempo?
Ela me olhou, com cara de cansada, deu um sorriso e disse:
- Eu sei bem o que ela está sentindo. Também já tive 14 anos, e minha mãe nunca me levou para conhecer um ídolo meu, por mais que eu pedisse. Por isso, hoje largo tudo pra ver minha filha feliz. Olha lá a carinha dela.
Eu olhei e vi a felicidade escancarada do rosto da menina de bochechas rosadas e rabinho de cavalo, segurando uma camiseta cheia de autógrafos.
Realmente, para ver um filho feliz, vale qualquer sacrifício.
Viviane Bevilacqua: Paixão adolescente
Viviane Bevilacqua
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