Encontrar qualquer brecha na agenda de uma apresentadora mãe de três filhos não é tarefa fácil. Mas, ao conversar pelo telefone com Fernanda Lima, impressiona a serenidade para relembrar os acontecimentos de um ano tão intenso. Em abril de 2020, quando ainda estávamos nos ambientando com as orientações sanitárias para usar álcool gel e manter o distanciamento, Fernanda viu seu pai ser internado com covid-19. Em casa, precisou lidar com a angústia da espera por uma boa notícia enquanto amamentava a filha, Maria Manoela, com seis meses à época. Após mais de 120 dias internado, Cleomar Lima faleceu.
A dor da perda e a saudade seguem, mas, assim como tantas famílias enlutadas, Fernanda encontrou as forças de que necessitava em seu lar. O confinamento ao lado do marido, o também apresentador Rodrigo Hilbert, e dos primogênitos do casal, os gêmeos João e Francisco, foi um período de união – e, aos poucos, virou oportunidade para colecionar boas memórias. Como o momento em que a sogra, Suzete, ensinou a gaúcha de 43 anos a preparar um pão de milho. Ou quando Rodrigo resolveu fazer uma casinha de madeira com a ajuda dos guris, de 12 anos, para a caçula.
Na temporada isolados no sítio da família, no Rio de Janeiro, surgiu a ideia: e se esse clima caseiro, repleto de trocas afetivas, pudesse ser compartilhado? Foi assim que nasceu o programa Bem Juntinhos, que estreia na próxima quinta-feira (15), às 21h30min, no GNT. É a primeira vez que Fernanda e Rodrigo apresentam juntos uma atração. No papo a seguir, conversamos sobre a expectativa com a estreia, a vida em família e a importância dos momentos a dois.
Como surgiu a ideia do programa?
Passamos cinco meses no nosso sítio, e lá temos o hábito de ficar na cozinha, fazer pão, canjica, arroz doce. Tivemos a oportunidade de nos reunir em família como se fazia antigamente. Mais tempo para se olhar, conversar, e para sofrer a perda do meu pai, tudo com muita intensidade. No meio daquela vivência, pensamos sobre a vontade de conversar, falar de perspectivas, de coisas triviais como comer, a educação dos filhos, a idade, a passagem do tempo. Aos poucos, vimos que isso havia se tornado um programa. Os dois já tinham uma carreira sólida o bastante para agora se juntar, sem ficar aquela situação de um puxar o outro. É um programa simples, de um casal na cozinha de casa, recebendo amigos para trocar ideias.
Como está sendo trabalhar ao lado do Rodrigo pela primeira vez?
Foi mais fácil do que imaginava! Não achei que a gente fosse ter atrito, mas poderia ser intenso demais. Poderíamos encher o saco de trabalhar juntos, mas não aconteceu. E quando acabávamos a gravação, o assunto era encerrado (risos).
O programa mostra a importância da vida simples, do bem-estar. Reflete um pouco o seu momento depois do turbilhão envolvendo o Amor & Sexo, a pandemia, a chegada da Maria Manoela?
Ia fazer outra temporada do Amor e Sexo, mas a pandemia chegou. É discrepante pensar em fazer um programa de auditório, parece outro mundo. Lamento muito, porque foi parte da minha história e eu teria dado continuidade. Mas o fato de termos sido impedidos nos proporcionou outro tipo de criação, de algo mais simples e com diálogos tão pertinentes quanto. Não tem a energia e o brilho do palco, mas tem um clima interessante entre pessoas que estão dispostas a acrescentar algo ao mundo. Recém fui mãe, estou vivendo um período de bastante cansaço. Só a gente sabe o quanto é complexo, ficamos sem dormir, e ainda estou amamentando. Estou exausta, então só poderia fazer um projeto desse tamanho nesse momento.
Com uma bebê, além dos meninos, como foi equilibrar a rotina?
Tem sido cansativo por conta da neném e da intensidade do trabalho, junto com o acompanhamento da escola das crianças e de tudo o que envolve um lar. Vendo a dificuldade das pessoas ao meu redor, não me sinto no direito de dizer que está difícil. Apesar de uma rotina mais complexa, é prazeroso acompanhar o dia a dia dos meus filhos como nunca acompanhei antes, apesar de ser uma mãe presente. Importante acompanhar a entrada na adolescência. Apesar de toda a dor e da tragédia humanitária que vivemos, vamos lembrar como um momento de união. Conheço bem os meus filhos, a gente se respeita muito. E temos regras desde sempre aqui em casa. Eles respeitam, então têm os direitos deles, de jogar videogame, falar com os amigos. Felizmente, estamos nos entendendo.
Como é a Fernanda mãe?
Muito presente, atenta, parceira. Bastante exigente no que considero valores essenciais. Gosto muito de ser mãe. Vou repetir a maneira como eduquei o João e o Chico com a Maria, com algumas exceções, que aprendemos ao longo do tempo. Como os meninos foram dois ao mesmo tempo, era mais pragmática à noite. A amamentação foi mais breve também, e com a Maria está sendo bem diferente. Estou perdendo noites de sono, a cada chamado estou do lado, se ela quer mamar, amamento. Neste sentido, estou sendo mais frouxa com a Maria, mas me permito ser assim porque entendo que é um tempo que passa rápido e que, apesar do cansaço, daqui a seis meses tudo muda e isso não volta mais.
Na pandemia, você conviveu muito com a mãe do Rodrigo.
Minha sogra é uma “fazedora de coisas” de casa (risos). Ela me ensinou a fazer tricô, teve toda a paciência do mundo. Aprendo bastante com ela na cozinha, e o que mais curti aprender foi a fazer um pão de milho que eu amava. Fizemos vários juntas e depois ela ficou vendo se aprendi direitinho (risos). A gente se dá muito bem, gosto muito da minha sogra. E o legal é que ela e a minha mãe se dão muito bem. Apesar do sofrimento com a perda do meu pai, foi um tempo de muita harmonia, de carinho e união entre as nossas famílias.
Você e Rodrigo já estão juntos há mais de 15 anos. Clichê do qual é impossível fugir: o que torna a relação especial depois desse tempo?
É o sentimento de admiração que temos um pelo outro. Estamos sempre dispostos a amadurecer. Fazemos muitas reflexões sobre nossa relação porque, apesar do amor e da admiração, há questões de uma vida em comum que precisam ser resolvidas. Esse tipo de coisa mina a relação e pode atrapalhar, a falta de tempo para o casal. É importante que o diálogo esteja sempre vivo. Temos uma relação de muito carinho. Estamos sempre tentando manter pontos de conexão que são só nossos para não perder nossa intimidade. Tem algo de companheirismo, de querer ter a opinião do outro, de estar junto. E, claro, aquilo que todos os casais falam, que é a possibilidade de sonhar junto, fazer planos, olhar para o futuro e imaginar como se quer que seja. Isso fortalece muito a relação.
Você é adepta da ioga há anos. Como a prática tem ajudado?
Na ioga consegui juntar coisas importantes, que é entrar em contato com a minha espiritualidade, além de movimentar o corpo. Estou sempre em busca de crescimento pessoal. Com a ioga, consigo, diariamente, ir atrás dessa evolução pessoal. Na pandemia, tem sido fundamental. É como se o dia só fosse completo se tivesse minha prática. Tem ajudado a me manter sã e forte e a olhar para a frente, com esperança.
Em entrevistas, você já afirmou “que a moda não gostava muito de ti”. Que memórias e aprendizados você guarda da época de modelo?
Não era magra ou alta o suficiente para fazer passarela nos anos 1990, que tinha um padrão bem específico. Não é uma vida exatamente fácil, porque temos que lidar com bastante rejeição, viver longe da família. Muitas vezes, se decepcionar com pessoas em quem você aprendeu a confiar e que, de repente, te dão uma passada de perna. Deparar com situações extremamente constrangedoras com as quais você não sabe exatamente como lidar. Trabalhar como modelo tão cedo é um desafio maior, a toda hora você é colocada à prova e precisa saber se colocar, senão é engolida. Se acontecer isso, passarei pelo mesmo que os meus pais passaram. Não é o que eu gostaria, mas se for um desejo da Maria, não posso impedir.
Você pediu ao seu pai que gravasse fitas contando momentos da história dele. Como tem sido reviver essas lembranças tão carinhosas?
Vez que outra eu entro em contato as lembranças e a dor da perda. Sofro, choro. Outras vezes, prefiro não. Tínhamos uma relação absurdamente amorosa, carinhosa, de admiração. Aos poucos, vamos dando uma cicatrizada na dor, mas ainda está recente. Mesmo com todos esses anos morando longe, fizemos questão de nos encontrar muito. Óbvio que teria feito mais se soubesse que iria acabar agora. Quisera eu ter mais dessas fitas. Ele não conseguiu gravar todas, ficou faltando coisa que gostaria de ter sabido. Recomendo a quem estiver lendo que conheça o máximo possível da história de seus pais, de seus avós, de seus antepassados, porque depois pode ser tarde demais. Estou tentando puxar da minha mãe, dei um livro para que me conte coisas da vida dela. Sinto por estarmos distantes agora, mas passamos muito da pandemia juntas. Quando a gente perde alguém, se dá conta de que a gente precisava aproveitar o máximo possível.
Como é a sua relação com o Sul?
Vou menos do que gostaria. Costumamos trazer nossa família. Mas adoro os hábitos, as comidas, o frio, o sol. Adoro a casa da minha mãe, abrir os armários, ver as roupas antigas, as fotos, as cartas. O Sul tem esse gostinho de lembrança. Tenho amigas aí, mas ficamos mais distantes. Tenho amor pela minha história e pelo que vivemos.