Depois de seis anos no Rio de Janeiro — a vida passa rápido — e quatro endereços diferentes, hoje moro em uma rua calma no meio de Copacabana. Parece impossível, ainda mais sendo na altura do posto 5, tradicional ponto de muvuca, mas é verdade. É uma rua que, embora com trânsito e servindo de caminho para outros caminhos, tem uma rotina de bairro, pessoas sem pressa e um passarinho desgarrado que canta todas as manhãs. É um só, já o vi batendo na nossa janela, sempre o mesmo e na mesma hora. Compramos um bebedouro de passarinho para ele, daqueles enfeitados com uma flor de plástico feia, mas ele ignorou. Aparece só para bicar o vidro e vai embora.
Copacabana é um bairro de pessoas de mais idade, muitas, e bebês, incontáveis. Não se pode caminhar rápido nas calçadas, é preciso respeitar a velocidade das velhinhas e dos velhinhos com seus passos curtos, quase sempre de bengala ou andador. Engraçado quando elas e eles cruzam com os bebezinhos que mal arriscam as primeiras passadas, as fraldas servindo de amortecedor para os tombos de bunda que levam a todo instante. É inevitável que se olhem. E como são parecidos os olhares, mistura de curiosidade com reconhecimento. Pelo lado de dentro, são praticamente iguais.
Nunca pensei tanto em um bicho para chamar de meu quanto nesses meses aqui no bairro.
Outro capítulo importante: a cachorrada. Difícil o apartamento que não tenha mais de um. Amor, companhia, proteção, diversão, exercício. Nunca pensei tanto em um bicho para chamar de meu quanto nesses meses aqui no bairro. Mas nem só de animaizinhos adoráveis se faz essa minicidade. Não se pode falar de Copacabana sem lembrar delas, as baratas.
Tenho escapado com competência das baratas de Copacabana. Muito mais que vista, espaço ou região, procurei meu apartamento atual pelo critério: baratas. Ele precisava ser claro e imaculado e sem mocós de onde elas pudessem brotar, porque as baratas estão em todos os lugares de Copacabana. Até no Carnaval. Milhares de pessoas nos bloquinhos e uma delas subiu pela perna do meu filho. Se fosse comigo, enfartava. De noite, na rua, chinelão no pé, é bom cuidar para não pisar em uma. Até agora, tudo bem. Não recebi nenhuma visita indesejada no meu bunker.
Talvez o que mais tire a paciência de uma egressa dos pampas em Copacabana seja o momento de ir ao supermercado. Com a contaminação da água oferecida à população, resultado do descaso e da corrupção de várias administrações cariocas, ir ao supermercado tornou-se uma tarefa diária. Agora está melhorando, mas até bem pouco era preciso buscar galões para tudo, de escovar os dentes até cozinhar. Sim, daria para pedir entrega, o problema é nunca estar em casa para receber a encomenda.
Pelos corredores de um supermercado do Rio não passam um senhor de ancas largas e uma senhora com um cestinho, e vice-versa. Mal cabe uma pessoa média. Prateleiras atoladas, mas com pouca variedade. Tudo pela hora da morte. E, para pagar, filas que lembram as dos supermercados de praia, dezenas de pessoas e poucos caixas — até nos horários de mais movimento. Coitados dos funcionários. Na minha próxima ida ao Sul não vou à Orla, ao saudoso Theatro São Pedro nem à casa dos meus parentes. Vou me espraiar em um hipermercado.
Tudo isso junto e misturado, morar em Copacabana tem sido, talvez, minha melhor experiência. Esqueci de dizer que o metrô fica ao lado de casa, popular mão na roda — ou nos trilhos? — para uma vida sem carro. Pena que Porto Alegre esteja tão longe de um. A praia, ainda que com os alertas de poluição, e sempre lotada, é um respiro para os olhos e a alma. Ajuda muito o fato de o meu filho agora morar no Rio. Incrível como a nossa cidade é onde estão nossos maiores afetos. Pela primeira vez nesses seis anos, sinto que tenho alguma raiz aqui. Falando nisso: e tu, maridão, vens quando?