Que série ver? São tantas as produções de tantos canais, tantas resenhas em sites especializados, conselhos de amigos, láureas divididas entre o Emmy, o Globo de Ouro e as diversas associações de críticos ao redor do mundo.
Um dos melhores seriados já feitos eu fui encontrar por acaso, encantado pelo cartaz que, a despeito do título (The Americans), referenciava as linhas retas e as formas geométricas características do construtivismo russo:
Produzida pela FX, The Americans começou discreta em 2013, como mais uma série de época que tinha na reconstituição da vida durante as décadas passadas um de seus trunfos. Foi graças ao investimento pesado, tanto em estrutura de produção quanto nos profissionais envolvidos, que as emissoras alcançaram o nível de Mad Men e Masters of Sex, para ficar em dois exemplos desse nicho ao qual The Americans foi inicialmente inserida. Mais barata e com menos apelo do que ambas, a criação do até então desconhecido Joseph Weisberg só se sobressaiu aos poucos – e entre a crítica, já que a audiência permaneceu estável ao longo dos anos.
O diferencial de The Americans, que ainda está por ser descoberto pelo grande público, está na forma como as questões políticas se enredam na conformação da personalidade dos persnagens. E, consequência direta disso, o suspense criado nesse contexto.
As quatro primeiras temporadas se concentraram entre 1981 e 1983, momento em que a Guerra Fria travada entre as duas superpotências começava a se encaminhar para o fim. Durante o dia, seus dois protagonistas (Keri Russell e Matthew Rhys) vestem-se e vivem como norte-americanos comuns, donos de uma agência de viagens em Washington. Depois de pôr os filhos para dormir, à noite – e muita coisa se passa à noite, o que ajuda o fotógrafo Richard Rutkowski a construir um visual discretamente soturno –, eles revelam a verdadeira missão que têm a cumprir nos EUA.
São dois espiões soviéticos às voltas com escutas, jogos de sedução e amizades interesseiras que os levem a coletar informações secretas, por exemplo, sobre o desenvolvimento de armamento químico por parte do inimigo. Invariavelmente disfarçados, eles chegam a atitudes extremas – para evitar spoilers mesmo das primeiras temporadas, afinal, The Americans foi muito menos visto do que merece, vou apenas citar a relação do homem com uma pacata e carente secretária do FBI, cuja composição, por parte da atriz Alison Wright (foto abaixo), é nada menos do que extraordinária.
Exibida em 2015, a terceira e melhor temporada até aqui foi definitiva na inserção dos dois filhos dos protagonistas, especialmente a mais velha (Holly Taylor), na rotina obscura dos pais. A garota cresceu, e o Comando da KGB tem planos para ela – revelo isso porque já dá para perceber, desde muito cedo, que, num contexto de guerra como aquele, os russos não deixariam escapar a oportunidade de cooptar uma cidadã americana de fato, nascida e criada nos EUA (seus pais são apenas donos de passaportes falsos do país).
O suspense que ficou entre o fim da quarta temporada e o início da quinta, que terá o primeiro capítulo exibido à meia-noite desta terça para quarta-feira, no canal Fox Action, gira em torno das reações da jovem. E da sua relação com o pastor, vivido por Kelly AuCoin, que se tornou seu conselheiro nesse momento de descobertas assustadoras.
Há inúmeras nuances em torno desses e dos demais personagens da série. O roteiro capitaneado pelo próprio Joseph Weisberg as entrega bem aos poucos, assim como o faz com detalhes sobre o contexto dos acontecimentos. Essa discrição, típica dos melhores suspenses já produzidos, exige alguma paciência do espectador, o que pode ser um problema para os mais apressados. Mas vale a pena: com o tempo e o acúmulo de informações apresentadas, o cenário que se desenha é de uma riqueza rara mesmo nesta chamada era de ouro da televisão.
A época escolhida não é ocasional: foi em 1981 que o conservador Ronald Reagan se elegeu presidente, e foi em 8 de março de 1983 que ele proferiu o célebre discurso no qual chamou a União Soviética de "Império do Mal", reforçando sua política anticomunista e aquecendo a Guerra Fria.
The Americans terminará no ano que vem, após os 13 episódios desta quinta temporada e outros 13 da sexta e última. Pelo ritmo que se verificou até aqui, é de se esperar que o tempo não avance demais – e a trama talvez nem aborde o fim do conflito, na virada dos anos 1990. O certo é que, quando já se sabe com bastante antecedência quantos episódios uma série terá, é mais provável que sua curva dramática se feche de maneira apropriada, sem atropelos e, sobretudo, sem se aproveitar da boa repercussão para esticar demasiadamente a história.
Ao que tudo indica, será o caso de The Americans.
THE AMERICANS
Estreia da quinta temporada à 1h desta terça (7/3) para quarta-feira, com reprises quarta, às 22h, quinta, às 23h, sábado, às 23h15min, e domingo, às 20h30min. No Fox Action.
As três primeiras temporadas podem ser vistas na Netflix.
A quarta está sendo exibida na programação do Fox Action.