As visitas nas fazendas eram raras, porém requintadas. A estância Chimarrita enfeitou-se de galas para receber o Dr. Arturo Benives e Dona Aidinha Alcântara e Quevedo. Ela, mulher de finos tratos, e ele, para lustrar o nome, fora candidato a suplente de Senador da República.
Montados nos melhores cavalos, ganharam campos, o anfitrião Dr. Lauro e seu visitante. As mulheres, anfitriã e hóspede, quedaram envolvidas em oferendas de biscoitos, licores e compotas. Quando o sol já se enredava nas cercas pela banda das divisas, as damas entregaram-se à graciosa faina de jogar milho para as galinhas no quintal da residência.
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À noite, o jantar à luz de velas com tudo a que tem direito, tão prendados os visitantes. À la bruta, Dona Aidinha põe a mão sobre os lábios e contém um grito de espanto. Cadê o brilhante solitário que brilhava em seus dedos qual uma estrela-boieira? Quatro pequenas garras vazias apontavam a ausência da pedra preciosa em seu dedo anular.
Dos serviçais da casa não haveria razão de suspeita. Restava a hipótese de o raro brilhante ter tombado ao chão junto aos humildes grãos de milho durante o passeio vesperal. Nem bem o dia acordara o passaredo, já os piás da fazenda rastilhavam o terreiro. E nada de catibiribas. A última alternativa seria estar a valiosa pedra alojada na recôndita redoma do papo das galinhas. Facas afiadas foi aquela operação Herodes. Pena para tudo que é lado.
Infrutífera a mortandade de aves. O constrangimento era geral e avassalador. Foi quando o Dr. Lauro, olhando para um galho da figueira, deparou-se com seu papagaio Lorito, que brejeiramente acompanhava os movimentos da casa. Num gesto abrupto e repentino, o Dr. Lauro tira do cinturão a sua faca solingen e ruma resoluto em direção ao Lorito. Era um momento da mais alta tensão. Entre estima e dever cívico, preponderava o segundo.
Ao terceiro passo armado do anfitrião, o papagaio deu seu recado suplicante do mais alto poder de convencimento:
- Para aí, Dr. Lauro, afinal de contas, pra que existe raio X, se não para uma hora dessas!
Pampianas
Luiz Coronel: o brilhante solitário
O colunista escreve mensalmente no 2º Caderno
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