Responsável por humanizar Nova York ao priorizar pedestre, ciclista e transporte público em detrimento de carros, a ex-secretária de Transporte da cidade americana Janette Sadik-Khan falou sobre o polêmico Uber em conferência do Fronteiras do Pensamento, em Porto Alegre, na segunda-feira.
- Não há dúvidas de que o futuro do transporte público incluirá o Uber - respondeu, ao ser questionada sobre sua opinião a respeito do aplicativo de "caronas" pagas.
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Em operação na Capital desde quinta-feira passada, o Uber tem sofrido resistência por parte da prefeitura (que o trata como transporte clandestino e promete apertar a fiscalização), mas agradou usuários (que o consideram uma alternativa ao serviço de táxis). O aplicativo chegou a Nova York em 2011 e teve de superar os mesmos entraves. Janette avalia ser importante estipular que o serviço atenda a todas as regiões da cidade e tenha veículos acessíveis a deficientes físicos.
- Tornou-se muito fácil conseguir um Uber em Nova York - disse, em referência à dificuldade em arranjar um táxi. - Acho uma mudança muito positiva.
Da plateia, o vice-prefeito da Capital, Sebastião Melo, assistia a palestra.
- Tão logo o Uber nos procure, está aberto o processo para uma regulamentação. Os taxistas pagam taxas para operar em Porto Alegre. Entendo que o Uber também precisa ter taxas estabelecidas, porque não é justo que o taxista tenha de pagar e que o Uber, não - afirmou Melo, ao final do evento.
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Janette encerrou o ciclo de palestras deste ano do Fronteiras do Pensamento, em evento no Salão de Atos da UFRGS, ao compartilhar as experiências que liderou em Nova York. À frente da secretaria de Transportes da cidade entre 2007 e 2013, restringiu o espaço para veículos na Times Square e criou mais de 40 novas ciclovias e vias compartilhadas. No currículo, ainda carrega a instalação de sistema de aluguel de bicicletas e de linhas rápidas de ônibus e a ampliação de áreas para pedestres em espécies de praças erguidas em meio a avenidas - 60 foram feitas em seis anos.
- É incrível ver a mudança cultural. Seis anos antes, as pessoas diziam que éramos loucas (ao limitar o trânsito na Times Square). Seis anos depois, as pessoas diziam que seríamos loucas se colocássemos os carros de volta - conta.
Mas a urbanista argumenta que não basta dar mais espaço para que as pessoas circulem na cidade: é preciso incentivá-las a fazê-lo. No dia em que o trânsito foi desviado da Times Square, a prefeitura providenciou, às pressas, cadeiras de praia para que as pessoas ocupassem o local. Funcionou.
A experiência resume a solução para cidades pensada por Janette, ao adotar alternativas provisórias e de baixo custo para sugerir mudanças. Se forem aprovadas pela população, o projeto se concretiza - caso contrário, volta-se atrás. Trocar ideias com moradores e ouvir as suas demandas também são, para a urbanista, premissas fundamentais.
- Sem carros, as ruas ficam mais seguras, as lojas lucram mais, os ônibus andam mais rápido. É uma estratégia de desenvolvimento, não só de sustentabilidade. Carros não fazem compras, as pessoas fazem - disse.
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Para o mediador da palestra, o presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) em São Paulo, José Armênio de Brito Cruz, o Brasil ainda engatinha no que diz respeito à cultura urbana:
- Foi uma gestão (de Janette) que focou no pedestre enquanto qualidade de trânsito e de vida, e os indexadores mostram que não só melhorou a qualidade de vida dos nova-iorquinos, mas também melhorou economicamente e desenvolveu a cidade. É uma contribuição para o Brasil, que enfrenta, muitas vezes, obstáculos que parecem intransponíveis para mudar a realidade.
A ex-secretária de Nova York destacou o potencial urbanístico de Porto Alegre ao mostrar imagens de ciclovias (a cidade tem construídos 6% do total previsto no Plano Diretor Cicloviário Integrado) e do sistema de ônibus BRT (que tem corredores ainda em execução e nem sequer entrou em operação). Mas, em meio à palestra, fez um alerta ao mostrar um mapa da ciclovia da Avenida Ipiranga. E arrancou risos da plateia:
- Acho que vocês teriam mais benefícios se essa ciclovia fosse em linha reta - concluiu, ao mostrar o ziguezague da via exclusiva para bicicletas.
O Fronteiras do Pensamento é apresentado por Braskem e tem patrocínio Unimed Porto Alegre e Hospital Mãe de Deus, com parceria acadêmica da UFRGS. As empresas parceiras são Liberty Seguros, BNDES e CMPC. Parceria institucional PUCRS e Fecomércio-RS e parceria cultural UFCSPA. Patrocínio módulo educacional Petrobras. Promoção Grupo RBS.
* Zero Hora
Fronteiras do Pensamento
"Não há dúvidas de que o futuro incluirá o Uber", diz ex-secretária de Transportes de Nova York
Janette Sadik-Khan encerrou o ciclo de palestras de 2015 em evento no Salão de Atos da UFRGS, em Porto Alegre
Débora Ely
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