Myst foi um jogo que marcou profundamente a minha adolescência. Não tanto pelos gráficos, avançadíssimos para a época (circa segunda metade dos 1990), mas mais pela atmosfera. Em Myst, você é um sujeito qualquer tentando desvendar os segredos de uma ilha. Conforme o jogo avança, percebe que esse pedaço de terra flutuante guarda muito mais do que aparenta - especialmente pela sua tridimensionalidade: os problemas não estão apenas na linha do horizonte, eles descem. E quanto mais você "cava", mais descobre. E quanto mais descobre, mais acredita ser melhor não ter descoberto nada.
Chegamos então a Ether One, jogo da White Paper lançado para PC no ano passado e agora de pouco disponibilizado de graça para usuários Plus da PlayStation Network. O convite é o mesmo de Myst: explorar mistérios de uma paisagem com visão em primeira pessoa. Só que ao invés de uma ilha, é a mente alquebrada de uma mulher que sofre de demência.
Um grande plot, não?
No jogo, você é um funcionário de um instituto de pesquisas que está desenvolvendo esse método de cura de doenças relacionadas ao cérebro - mais precisamente, doenças que afetam a memória, como o Mal de Alzheimer. Utilizando um equipamento experimental, você é transportado para dentro da mente de Jean Thompson, uma paciente/cobaia de 69 anos que sofre de demência crônica. Seu objetivo é, dentro de uma projeção em 3D das lembranças de Jean, reconstruir acontecimentos cruciais de sua vida.
No caminho, uma série de puzzles precisam ser resolvidos para liberar áreas e avançar com a investigação. Aos poucos, não apenas a memória de Jean vai sendo restaurada, mas também a história das pessoas que a circundavam e da tragédia que se abateu sobre sua cidade natal, uma pequena vila de pescadores britânica.
É um paralelo interessante esse que Ether One estabelece. O quanto da vida pessoal de alguém está intrinsecamente ligada ao seu redor. O conjunto de memórias de Jean não pode ser separado da história de tudo o que a cerca, porque ela é feita não apenas de seus pensamento íntimos, mas da interação com o mundo. A vida de Jean é parte da vida de sua cidade e seus cidadãos e vice-versa.
Myst procurava mostrar que, mesmo numa ilha, nenhum homem está totalmente isolado. Ether One vai mais fundo: não somos nada além do conjunto das nossas memórias que, por sua vez, faz parte de um todo maior. Mesmo numa ilha ou na mais íntima das memórias, ninguém está sozinho. Pode ser confortante. Mas também assustador. Como mergulhar fundo nas memórias de alguém.
Jogatina Tech
Gustavo Brigatti: "Ether One" é viagem aos confins da memória
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Gustavo Brigatti
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