
Iberê Camargo desenvolveu uma obra de forte carga pessoal, percorrendo um caminho solitário na arte brasileira. Até que vieram os anos 1980, e o chamado retorno da pintura fez dele uma figura central, uma referência aos jovens artistas.
Esse período é o foco da exposição As Horas [o tempo como motivo], que a Fundação Iberê Camargo (FIC) inaugura neste sábado, às 11h. No final dos anos 1970, a figura humana começou a aparecer nas telas de Iberê, muitas vezes como autorretrato. Até então, ele havia se notabilizado por paisagens, naturezas-mortas e pelos carretéis resgatados das memórias de infância. Na maior parte do tempo foi figurativo, em outros momentos flertou com o gestual abstracionista.
A mudança de orientação na sua pintura coincide também com o retorno a Porto Alegre no começo dos anos 1980. Artista já consagrado, Iberê era um moderno tardio, que parecia habitar um presente nostálgico. "Não há mais passado, presente e futuro. Só o tempo, único", escreveu. Após duas décadas de desmaterialização do objeto artístico com a arte conceitual, as performances e as instalações, houve, nos anos 1980, uma retomada com o surgimento de uma pintura jovem e contemporânea de forte apelo subjetivo. Foi aí que Iberê se tornou referencial para nomes como Jorge Guinle, Nuno Ramos, Paulo Pasta, Karin Lambrecht e Daniel Senise.
- Iberê é redescoberto pela nova geração, ainda que já fosse um artista importante. Ele sempre foi um "inatual", fora das correntes de seu tempo. Por seu interesse voltado ao passado, Iberê se punha como seguidor de uma tradição da pintura. E, de repente, é visto como orquestrador de uma tendência de pintura atual feita pelos jovens. É justamente dessa passagem que eu trato na exposição - comenta o curador, o filósofo e crítico ítalo-brasileiro Lorenzo Mammì.
Foram reunidos mais de 40 trabalhos, entre pinturas e desenhos produzidos do fim dos anos 1970 até o final da década seguinte. No primeiro andar da FIC, os visitantes ainda poderão ver o filme Iberê Camargo: Pintura Pintura, que Mario Carneiro realizou nos anos 1980, e um painel com o conto O Relógio, escrito por Iberê em 1959 e apresentado no livro No Andar do Tempo, de 1988.
As Horas é a primeira exposição voltada a Iberê no ano em que se celebra seu centenário. A programação especial da FIC seguirá em maio, com a abertura de uma mostra do artista no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de São Paulo. No mesmo mês, começará em Bagé a itinerância de uma exposição coordenada por Eduardo Haesbaert que passará por outras cidades gaúchas. Também está sendo preparado um livro biográfico pelo crítico Luiz Camillo Osorio, além de um documentário da diretora Marta Biavaschi.
Depois de exposições de outros artistas que a FIC apresentará ao longo do ano, em novembro haverá o ponto alto das celebrações. Será inaugurada uma ampla mostra de Iberê nos três andares do prédio, organizada pelo Comitê Curatorial, formado por Icleia Cattani, Jacques Lenhardt e Agnaldo Farias. Em lugar de um recorte cronológico e retrospectivo, o grupo optou por apresentar obras de Iberê em diálogo com as de artistas brasileiros contemporâneos.
As Horas [o tempo como motivo]
> Abertura sábado, às 11h. Visitação de terça a domingo, das 12h às 19h, exceto às quintas-feiras, quando o museu fica aberto das 12h às 21h. Até 9 de novembro. Entrada franca.
> Fundação Iberê Camargo (Av. Padre Cacique, 2.000), fone (51) 3247-8000.
> Onde estacionar: pago, no subsolo, com entrada pela Av. Padre Cacique, no sentido Zona Sul.
> A exposição: destaca a produção de Iberê Camargo nos anos 1980, apresentando mais de 40 obras, entre pinturas e desenhos.