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Resultado de um flerte que remonta ao ano de 2006 entre o Grupo Galpão e o diretor russo Jurij Alschitz, a peça Eclipse foi criada com a proposta de expor a filosofia presente na obra de Tchékhov (1860 - 1904) a partir de trechos de contos e peças do autor.
O espetáculo da prestigiada companhia mineira, criada há 30 anos, tem sessões desta quinta-feira (20/9) a sábado (22/9), às 21h, no Theatro São Pedro, em Porto Alegre. Até a manhã desta quarta (19/9), ainda havia ingressos para as três datas.
Estreado em 2011, Eclipse integra o projeto Viagem a Tchékhov, que teve como primeiro trabalho a peça Tio Vânia (Aos que Vierem depois de Nós), com direção de Yara de Novaes, apresentada no ano passado em Porto Alegre e em Caxias. Os atores do Galpão foram divididos em dois elencos, um para cada produção. Eclipse vai na direção oposta à da peça anterior. No primeiro dia de ensaio, Alschitz solicitou que a sala de ensaio escura fosse pintada de branco. A ideia era mostrar um Tchékhov "solar", diferentemente das ambientações à meia-luz que caracterizam a maioria das encenações de suas peças mundo afora - e do próprio Tio Vânia criado pelo grupo. O ator Chico Pelúcio explica, por telefone:
- O tempo todo, Jurij tentou nos mostrar que a concepção de mundo ocidental, por assim dizer, traz um Tchékhov sombrio, de vidas estagnadas, sem muita pulsação. Ele quer provar o contrário: que Tchékhov tem uma energia, que há conflitos nos textos, que o nonsense é muito forte. E as encenações deveriam traduzir esse lado solar.
Com dramaturgia assinada pelo diretor, a peça mostra cinco pessoas discutindo sobre felicidade, talento, fé, caos e vida - temas recorrentes na obra do autor. Na demorada espera pelo fim de um eclipse solar, os personagens confrontam suas posições em debates que desafiam a fronteira do absurdo. Com trechos de peças de Tchékhov, como A Gaivota e As Três Irmãs, o espetáculo é fundamentado na igualmente célebre produção em prosa do autor. Há citações de alguns dos 150 contos pesquisados durante o processo de criação.
A encenação - cenografia, figurino, luz - é executada com referência do suprematismo, movimento russo pioneiro no abstracionismo geométrico, liderado pelo pintor Kazimir Malevitch (1878 - 1935). Curiosidade: o manifesto suprematista data de 1915; depois, portanto, da morte de Tchékhov.
Mas será que o Galpão chegou a seu destino nessa viagem à obra do autor?
- Se você chega ao destino, é como se sua viagem tivesse parado - responde Pelúcio. - Continuamos navegando nesse universo. Em cada apresentação, em cada leitura, descobrimos novas facetas de Tchékhov. A ideia de Jurij é que um espetáculo cristalizado, solidificado, corre grande risco de morrer.