O jovem trombonista José Milton Vieira, conhecido como Miltinho, 25 anos, compara a arte da música à culinária. Para ele, tocar é como convidar o público a experimentar um prato - é preciso, nos dois casos, surpreender os convivas. Foi com essa convicção que o músico da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) venceu, no dia 11, o concurso Pré-Estreia, da TV Cultura, em São Paulo, na categoria solista, tendo disputado com candidatos de diversos Estados.
Apesar da idade, ele prefere não ser chamado de jovem músico. Como muitos, começou ainda criança. Tocou trombone pela primeira vez aos 12 anos, depois de ter passado pela flauta transversa e pelo eufônio (instrumento do naipe de metais também conhecido como bombardino). Sua ascensão foi vertiginosa. Em 2006, aos 19 anos, decidiu se colocar à prova pela primeira vez. Passou em primeiro lugar entre todos os músicos que prestaram o concurso da Ospa, onde atualmente é primeiro trombonista. Foi o instrumentista mais jovem a obter nota máxima de todo o júri e também o mais jovem a ocupar a função.
Tempo nunca foi exatamente um problema para Vieira. Inscreveu-se no concurso Pré-Estreia poucos dias antes do encerramento do prazo e passou raspando pela idade limite para participar da competição (24 anos): completou 25 exatamente uma semana depois da final. Como não tinha tempo para fazer uma gravação para participar da seleção, pediu para a sogra, em Brasília, enviar um DVD de um recital que havia feito recentemente.
Foi o suficiente. No concurso, desbancou músicos de diferentes instrumentos. Disputou a final com o violonista mineiro Aulus Rodrigues e se sagrou vencedor com uma interpretação impecável do segundo e do terceiro movimentos do Concertino para Trombone do compositor alemão Ferdinand David (1810 - 1873), estreado originalmente em 1837.
Ele conta que o século 19 foi quando o repertório para trombone se consolidou, mas gosta mesmo é dos séculos 20 e 21. De preferência, os compositores brasileiros.
- O repertório para nosso instrumento vem crescendo bastante nos últimos anos. Veja o caso de solistas internacionais como Christian Lindberg, Joseph Alessi (de quem foi aluno) e Michel Becquet. No Brasil, pelo menos no Rio Grande do Sul, os compositores estão cada vez mais interessados no trombone, e eu quero conhecer novas peças - diz Vieira por telefone, de Brasília, onde passa as férias.
Nascido em Imperatriz, no Maranhão, mudou-se com um ano de idade para a capital federal, onde teve boa parte de sua formação musical. Os vizinhos sentiam-se incomodados com o som alto do trombone. Da rua vinham xingamentos e, certa vez, uma pedra, que atingiu em cheio o telhado da casa, episódio que fez o então garoto chorar. Mas a decisão já estava tomada.
- Devia ter 12 ou 13 anos e nunca havia estado tão empolgado com algo na vida. Foi uma virada: decidi que eu queria ser músico mesmo.
Como prêmios do concurso Pré-Estreia, Vieira ganhou R$ 35 mil e a oportunidade de estudar, no ano que vem, na Juilliard School, em Nova York, uma das mais prestigiadas escolas de artes do mundo. Ao final, fará um recital no qual pretende apresentar aos norte-americanos a música brasileira atual. Entre as peças que estarão no programa, duas já estão definidas: Introdução e/ao Desafio, do mineiro Villani-Côrtes, e Sonatina, do paulista Rodrigo Lima, ambas para trombone e piano.
- Você não vai convidar um chef para comer em seu restaurante a comida que ele faz. Você vai mostrar a sua comida - justifica.
Vieira pretende se dedicar cada vez mais à carreira de solista. Não descarta morar no Exterior e sonha em tocar em uma orquestra internacional, mas a única certeza é o retorno.
- Quero fazer diferença no Brasil. Grandes músicos estão voltando, trazendo muita informação para nós.
E quando o público gaúcho poderá assistir novamente a uma de suas performances?
- No primeiro concerto da Ospa da temporada 2012 - responde, com os pés no chão e a cabeça no futuro.
O sopro do talento
Trombonista da Ospa vence prêmio nacional de instrumentistas
Músico José Milton Vieira, 25 anos, foi o primeiro colocado na categoria solo e disputou o troféu com 24 candidatos de outros Estados
Fábio Prikladnicki
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