
“Essa Elza tem que ser tombada patrimônio da humanidade.” “Estou absolutamente arrepiada. Que rainha que a gente tem.” “Isso não é disco. É uma tatuagem feita na base do grito! Obrigado, Elza, por marcar nossas almas para sempre.”
Os comentários dos fãs de Elza Soares em sua página no YouTube dão ideia da força que a artista carrega consigo, o que fica ainda mais evidente quando a cantora está no palco, com sua voz rouca e potente entoando versos como “A carne mais barata do mercado / É a carne negra”.
O show em Porto Alegre que será realizado neste sábado (25), no Opinião, promete ser ainda mais emocionante. A apresentação na Capital da turnê do seu mais recente trabalho de estúdio, o disco Deus É Mulher, lançado em maio do ano passado, ocorrerá um dia antes de a cantora receber o título de doutora honoris causa pela UFRGS.
Elza não esconde a felicidade com a distinção:
— É emocionante. É uma coisa tão séria, tão linda, que eu começo a me ver lá atrás, (no começo) da minha luta, das minhas buscas. Estou embriagada até agora com esse título.
A honraria, a primeira de tal grau concedida pela UFRGS a um músico, veio a partir de uma proposição feita pelo Departamento de Difusão Cultural da universidade em conjunto com o Instituto de Artes, sendo aprovada por unanimidade em sessão, no último dia 17, do Conselho Universitário, que reúne reitoria, professores, estudantes e servidores.
“Tal gesto tem grande significado simbólico e confirma publicamente a vocação plural da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e seu compromisso com a sociedade como um todo, levando em consideração sobretudo as premências de uma época na qual necessitamos reafirmar a valorização das artes. Em geral, as ações antirracistas e de valorização da cultura afro-brasileira são fundamentais no combate a esse grande mal que ainda nos assola chamado racismo”, diz o parecer acolhido.
Segundo informa a UFRGS, trata-se da primeira vez que uma artista mulher e negra ligada à música popular recebe a homenagem no Brasil – no rol de cantoras, somente Maria Bethânia alcançou tal feito, pela Universidade Federal da Bahia, em 2016.
É mais um dos tantos presentes que Elza vem ganhando nos últimos anos, especialmente a partir do lançamento de A Mulher do Fim do Mundo, de 2015, seu primeiro trabalho composto apenas de canções inéditas após 55 anos de carreira. O disco levou o Grammy Latino na categoria de Melhor Álbum de MPB e o prêmio de Melhor Álbum pela Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA).
Em biografia e no palco, um retorno ao passado traumático
O reconhecimento veio também por meio do lançamento de sua biografia, Elza, no final de 2018, e ainda um musical apresentado em Porto Alegre neste mês. Os dois trabalhos obrigaram a cantora a relembrar momentos duros de sua vida. Entre eles, um casamento forçado quando tinha por volta de 13 anos e a perda do ex-marido e grande amor de sua vida, o jogador de futebol Garrincha, que morreu, sem dinheiro, em 1983, vítima de uma cirrose hepática.

— Eu me emocionei com a minha história. Não acredito que passei por tudo isso e estou, aqui e agora, vendo esse musical — recorda a artista, do alto dos seus mais de 80 anos (como não foi devidamente registrada quando nasceu, Elza Gomes da Conceição até hoje não sabe direito a idade que tem).
É em momentos como esse, ao se reconhecer em atrizes no palco de um teatro, que Elza toma consciência de sua trajetória de superação, algo de que confessa não gostar muito:
— Já passei, estou na frente. Mas volto e penso: meu Deus do céu, quem diria que conseguiria essa vitória. Não é brincadeira, eu tinha tudo para não dar certo: mulher, pobre, negra. Tudo isso é uma história muito séria — declara a cantora, que, mesmo vendo sua trajetória passar por cenários de fome e miséria, diz não sofrer.
— Muito pelo contrário. Só não dou pulos de alegria por causa da minha coluna — diverte-se Elza.
Com problemas para se locomover por conta de uma queda do palco e uma cirurgia em 2014, a carioca nascida na favela de Moça Bonita se apresenta sempre sentada.
Nada que diminua a intensidade do show deste sábado (25), no Opinião, um dos eventos de um fim de semana com uma agenda lotada para os fãs de Elza. No domingo, além de receber o título de doutora honoris causa, às 20h, no Salão de Atos da UFRGS, a cantora participa, no mesmo local, de uma conversa sobre arte com o músico e escritor José Miguel Wisnik. A sessão já está com os ingressos esgotados. Na sequência, Elza autografa sua biografia, de autoria do jornalista Zeca Camargo.
ELZA SOARES – DEUS É MULHER
Sábado (25), às 20h (abertura da casa às 18h30min).
Opinião (Rua José do Patrocínio, 834), fone (51) 3211-2838.
Ingressos: de R$ 85 a R$ 200.
Pontos de venda: Multisom Iguatemi (sem taxa, somente em dinheiro); Multisom Andradas, 1.001, Multisom Praia de Belas e Multisom BarraShoppingSul, lojas Verse Andradas, 1.444, e shopping Lindoia (com taxa, somente em dinheiro).
Online: sympla.com.br/opiniao.