Foi à meia-noite de 31 de março de 1978 que a Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz estreou em teatro na Rua Ramiro Barcelos, em Porto Alegre. A data escolhida — o mesmo dia do golpe militar de 1964 — refletia uma subversão do grupo teatral, em meio à ditadura. Um jeito de ressignificar aquele momento. Após a leitura de um manifesto contra o regime vigente, a primeira encenação compunha-se por duas montagens curtas: A Divina Proporção e A Felicidade Não Esperneia Patati, Patatá. Ambas com críticas à sociedade capitalista.
São 45 anos promovendo um teatro a serviço da arte e política, mas também procurando chegar a lugares mais amplos, ocupando espaços públicos. Para celebrar todas essas décadas atravessadas, o Ói Nóis Aqui Traveiz prepara uma série de ações, que abrange mostra de espetáculos, oficinas, lançamento de livro e inauguração de um museu de artes cênicas.
As próximas atividades serão realizadas de 24 a 26 de fevereiro, na Comunidade Indígena Teko Jeapo (Maquiné) e de 1º a 3 de março, no Tablado Andaluz, em Porto Alegre. Já a partir do dia 6 de maço, tem início a Mostra de Repertório, que trará montagens produzidas pelo grupo nos últimos anos.
Os espetáculos da mostra serão os seguintes: M.E.D.E.I.A, na Terreira da Tribo; Quase Corpos: Episódio 1 – A Última Gravação, na Sala Álvaro Moreyra; Desmontagem Evocando os mortos – Poéticas da Experiência, no Teatro de Arena; Manifesto de Uma Mulher de Teatro, na Sala Carlos Carvalho na Casa de Cultura Mario Quintana; filme Ubu Tropical, na Terreira da Tribo; Violeta Parra – Uma Atuadora!, na Terreira da Tribo; e, por fim, O Amargo Santo da Purificação, no Parque da Redenção (veja datas e horários ao final do texto). Toda a programação terá entrada franca, algo enfatizado por Paulo Flores, um dos fundadores do grupo:
— Queremos que mais pessoas assistam ao teatro. É a proposta do grupo: que assistam ao teatro crítico, refletindo a nossa realidade.
Além da mostra, o ano 45 do Ói Nóis Aqui Traveiz promete ser farto até o fim: em dezembro, está previsto o lançamento do livro Memória do Teatro de Grupo Brasileiro, do qual o grupo faz parte ao lado de outros oito coletivos longevos do centro do país – como Teatro Oficina, Grupo Galpão e Tá na Rua. A obra é de autoria do professor e pesquisador Clóvis Massa.
No segundo semestre, Flores adianta, será aberto ao público um museu com parte do acervo da Tribo – máscaras, figurinos, elementos cenográficos, fotos etc. O espaço será instalado no Centro Cultural Zona Sul, no bairro Tristeza. Nos planos do grupo também estão a organização de um seminário virtual, previsto para abril, e ainda a participação como convidado do festival Tanto Mar, em Portugal, em maio – onde a tribo encenará M.E.D.E.I.A.
Flores lembra que, em dezembro, foi obtido com a prefeitura um novo espaço para sediar a Tribo, no bairro Floresta (a atual sede do grupo, na Rua Santos Dumont, no bairro São Geraldo, é alugada). Porém, ele frisa que o local ainda se encontra em condições precárias.
— Começaremos a reforma da Travessa Carmem (endereço da futura sede) ainda neste semestre. Os arquitetos do Mãos (coletivo de arquitetura e urbanismo) estão trabalhando no projeto. Esperamos que no ano que vem a Terreira esteja neste novo endereço. Acreditamos que ali sediará a Terreira da Tribo de uma forma permanente — afirma.
Além disso, o grupo seguirá realizando oficinas de teatro e residências artísticas nos territórios culturais parceiros. Ou seja, trabalhando com o conceito de arte pública.
Arte pública
Segundo Flores, o Ói Nóis Aqui Traveiz surgiu como uma forma de combate ao sistema vivido no final dos anos 1970, em um momento que ele descreve como "ebulição de luta pela liberdade democrática e pela anistia", com a ideia de um teatro político para todos. Logo, isso se refletiu também no projeto Arte Pública, lançado no ano passado, que visa a apresentar atividades gratuitas. Nesse contexto, o teatro de rua foi importantíssimo para a tribo ao longo dos anos.
— Há muito tempo o grupo tem procurado pensar em como o teatro pode chegar a mais pessoas, que não seja a um público restrito e elitizado. Por isso usamos hoje o termo arte pública — explica Flores. — Desde o surgimento, a gente traz uma outra noção de teatro. Uma nova maneira de conceber o espaço cênico. Já não é mais aquele teatro dividido entre palco e plateia: o espectador já está dentro da cena, ele convive e interage com os atores, que a gente começa a chamar de atuadores.
Mostra de Repertório do Ói Nóis Aqui Traveiz
Todas as atrações ocorrem em Porto Alegre, com entrada gratuita
Espetáculos
- M.E.D.E.I.A, nos dias 6, 13 e 20 de março, às 20h, na Terreira da Tribo (Rua Santos Dumont, 1.186)
- Quase Corpos: Episódio 1 – A Última Gravação, de 10 a 12 de março, às 20h, na Sala Álvaro Moreyra do Centro Municipal de Cultura (Rua Erico Verissimo, 307)
- Desmontagem Evocando os Mortos – Poéticas da Experiência, nos dias 15 e 22 de março, às 20h, no Teatro de Arena (Rua Borges de Medeiros, 835)
- Manifesto de uma Mulher de Teatro, de 24 a 26 de março, às 20h, no Teatro Carlos Carvalho da Casa de Cultura Mario Quintana (Rua dos Andradas, 736)
- Violeta Parra – Uma Atuadora!, no dia 31 de março, às 20h, na Terreira da Tribo (Rua Santos Dumont, 1.186)
- O Amargo Santo da Purificação, em 2 de abril, às 17h, no Parque Farroupilha (Redenção)
Filme
- Ubu Tropical, em 27 de março, às 20h, na Terreira da Tribo (Rua Santos Dumont, 1.186)