Não é uma viagem de turismo. Pelo contrário. Fugir dos roteiros óbvios e das atrações apinhadas de turistas sedentos por um clique é quase uma regra para Jonathan B. Roy. Há três anos, o advogado canadense abandonou a carreira no seu país para percorrer o mundo em cima da sua bicicleta, colecionando amizades e histórias. Em Porto Alegre, iniciou sua jornada pelo Brasil, que ainda não tem data para terminar.
A ideia de desbravar o mundo surgiu depois que sua mãe morreu, vítima de câncer. Ela sonhava em conhecer a Itália, mas isso nunca se concretizou. Então Jonathan decidiu precisava realizar, e logo, o seu desejo pessoal de fazer uma grande viagem. Aos 29 anos, iniciou a preparação financeira para a turnê. Vendeu o carro e "parou de comprar roupas", conta, rindo. Examinou roteiros e contatou pessoas que já haviam embarcado em viagens sobre duas rodas e testemunhado que era possível. Preparou a bicicleta — a mesma que tem até hoje, com exceção do banco, que já é o 31º — e adaptou para poder carregar água, comida, fogareiro, gás, roupas, barraca, colchão e equipamento fotográfico.
Deu a largada no projeto em março de 2016, pela Inglaterra. O ponto de partida foi escolhido a dedo: sem nenhum preparo específico, optou por um país onde tivesse conhecidos e facilidade de se comunicar. De lá, o plano era partir para algum ponto da Ásia. No fim das contas, parou na Malásia, onde trabalhou como advogado por um ano e se dedicou a escrever um livro, Histoires à dormir dehors (algo como Histórias de Viagens, em tradução livre), disponível somente em francês, que já é best-seller no Canadá.
Passou por China, Japão e um incontável número de países cujos nomes terminam em "istão", como Quirguistão — onde, aliás, conta que precisou fugir de um homem que o ameaçou com tiros em uma montanha "no meio do nada". No Japão, relata, pedestres esperam até que o sinal verde deles esteja aceso para cruzar uma via. Mesmo que seja madrugada e não tenha nenhum carro na rua.
Com um vasto repertório de experiências, o cara de estatura média e barba impecável sorri na maior parte do tempo, inclusive daquilo que poderia ser sua própria desgraça. Sentado em um banco na Redenção, na Capital, sorvendo um chimarrão, relembrou com naturalidade outro episódio, vivido recentemente nas montanhas do Chile.
— Tinha um puma a uns cinco metros da minha barraca. Eu sabia que era esse animal porque ouvi ele gritando — conta, imitando um grunhido. — Peguei minha lanterna e vi aquele "gato enorme". Bati palmas, como quem diz: "vá embora!". Talvez eu seja estúpido. Talvez fosse perigoso e eu devesse ter medo, ou talvez não. Tem uma frase que eu gosto: não é porque temos medo que é perigoso — divaga.
De Porto Alegre, parte para temporada no Canadá
Além do episódio incomum com o puma, Jonathan também já enfrentou perrengues com cachorros, comidas e pessoas, claro, no decorrer dos últimos três anos. No entanto, nenhuma adversidade o fez parar ou desistir. Ele costuma a dizer que, às vezes, as piores histórias se tornam as melhores.
E são essas pequenas histórias do dia a dia que ele compartilha com seus seguidores em um blog e no Instagram. Além disso, viaja duas vezes por ano ao Canadá, onde dá palestras sobre sua trajetória. O que era sonho virou ganha-pão. Com as histórias contadas em diversas plataformas, ele se mantém. Além disso, conta com a hospitalidade dos moradores dos locais por onde passa — já zanzou por 36 países, percorrendo mais de 30 mil quilômetros. Não raro dorme na casa de um, come na residência do outro, e por aí vai. Segundo ele, na ponta do lápis, a viagem custa, em média, US$ 25 por dia.
De Porto Alegre, ele parte para a temporada no seu país, onde ficará por um tempo e fará conferências, e depois retorna à Capital, de onde pretende seguir para Rio de Janeiro, Foz do Iguaçu, Paraguai, Peru e Colômbia. Sem data para terminar a jornada, Jonathan afirma que não pretende fazer isso a vida toda, pois a rotina nômade não ajuda na hora de ter um relacionamento. Além disso, cada dia é uma incerteza:
— Nunca sei onde vou dormir, estou sempre em países que não falam a minha língua. É muito bom receber convites, mas, às vezes, prefiro dormir na minha barraca, que soa como "meu espaço". Por outro lado, não me vejo voltando ao Canadá, trabalhando oito horas por dia em um escritório, vivendo em um apartamento.
Como bom colecionador e contador de histórias, não descarta a possibilidade de se tornar jornalista:
— É isso o que eu faço, todos os dias. Meu livro e meu blog fazem isso. Não é sobre andar de bicicleta, eu falo da cultura, do país, da história e das pessoas. E eu aprendo toda hora.