Entre em qualquer site ou converse com qualquer turista que já tenha estado no Chile, e o discurso será parecido: é um país que oferece deserto, geleiras, montanhas, grandes cidades e praias na mesma viagem. Apesar de ter rodado muitos quilômetros, não visitei todos esses cenários nos cinco dias em que passei por lá, em dezembro. Mas posso afirmar que pude conhecer os sabores de muitos cantos chilenos. Tudo por meio dos vinhos.
Foram nove vinícolas em dois vales – são mais de 17 regiões produtoras de uva em todo o Chile, cada uma com suas particularidades e especialidades. Entretenimento, gastronomia e cultura para experts, para quem quer aguçar o paladar e até para os que entendem pouco ou nada sobre a bebida.
Além das sete sobre as quais relato mais detalhes nesta reportagem, visitei duas que não recebem turistas, mas produzem vinhos de alta qualidade que podem ser encontrados no Brasil: Luis Felipe Edwards e Siegel.
Aliás: sendo o brasileiro um dos principais mercados importadores dos vinhos chilenos, dá para continuar saboreando os seus favoritos mesmo depois de voltar para casa.
Santa Carolina
Meu primeiro dia de viagem começou pela Santa Carolina, que fica na zona urbana de Santiago, a menos de meia hora de carro do bairro Las Condes, um dos queridinhos dos turistas e onde fiquei hospedada. A vinícola é uma das mais antigas do Chile, com 140 anos de história.
Apesar de estar muito perto da cidade, uma das atrações da propriedade é um parque totalmente reformulado após ser atingido em cheio pelo terremoto de 8,8 graus na escala Richter, de março de 2010. A casa histórica, onde vivia a família fundadora, a cava subterrânea e o salão usado para engarrafar os vinhos também foram afetados, mas em menor extensão. O salão, aliás, foi reformado de forma a preservar ao máximo as características da construção original.
Se você passar pela Santa Carolina às sextas-feiras ou aos sábados, é possível que veja um casamento: o local é um dos mais requisitados de Santiago para cerimônias.
Visite
- -A Santa Carolina recebe visitantes de segunda a sexta-feira e em alguns domingos. É preciso reservar.
- -A visita standard inclui passeio e degustação de três rótulos (reserva, gran reserva e reserva de família) e custa 12 mil pesos chilenos (R$ 66) por pessoa. A premium inclui passeio, dois rótulos premium e dois ícones, além de uma tábua de queijos e frutas frescas. A 35 mil pesos (cerca de R$ 190) por pessoa.
- -Informações: santacarolina.cl
Concha Y Toro
A segunda parada da viagem foi na Concha Y Toro, a maior do Chile e uma das mais visitadas do país – são cerca de 180 mil pessoas por ano, incluindo muitos brasileiros.
Há quem fuja da muvuca e há quem diga que ir ao Chile e não visitar a Concha Y Toro é como ir a Paris e não ver a Torre Eiffel. O assunto é controverso, mas não dá para negar que a vinícola é especialista em encher os olhos dos turistas. Além da maturação e do envase dos vinhos (parte comum a quase todas as vinícolas), a visitação inclui uma parada por um jardim que tem amostras das 26 variedades de uvas (13 tintas e 13 brancas) usadas na produção dos rótulos. Ótimo para entender as diferenças, que se refletem na hora da degustação.
Outra atração é a visita à cave onde matura o Casillero del Diablo, rótulo mais conhecido da Concha Y Toro. Com animações projetadas nas paredes, o visitante se sente no tempo de Don Melchor Concha Y Toro, fundador da vinícola, que, reza a lenda, mantinha suas melhores garrafas em um local especial, guardadas pelo próprio diabo – daí o nome.
As visitas terminam no wine bar, que oferece vinhos em taças, o que facilita para quem quer experimentar mais rótulos ou para escolher o seu favorito antes de passar na loja, logo ao lado. Vale conhecer, além dos vinhos mais populares, as linhas premium da Concha Y Toro, como a Marqués de Casa Concha e a Don Melchor, esta última considerada quase uma outra vinícola, pois conta com uma equipe de enólogos dedicados exclusivamente à sua produção.
Visite
- -O centro turístico da Concha Y Toro fica no Valle del Maipo, a cerca de uma hora e meia de carro de Santiago. Abre de segunda-feira a domingo e oferece mais de 30 tours por dia. O ideal é fazer reserva com, no mínimo, 24 horas de antecedência.
- -O Tour Tradicional oferece passeio guiado, degustação de três vinhos premium e uma taça da vinícola, ao custo de 16 mil pesos chilenos (cerca de R$ 90) por pessoa.
- -O Tour Marqués de Casa Concha inclui passeio, degustação de quatro rótulos da linha Marqués de Casa Concha guiada por um sommelier, tábua de queijos e taça de brinde. A 25 mil pesos (cerca de R$ 140) chilenos.
- -Informações: conchaytoro.com
Santa Rita
A Santa Rita oferece uma experiência completa. Localizada no Valle del Maipo, a menos de uma hora de Santiago, o complexo da vinícola conta com 3 mil hectares, entre campos cultivados, um parque de 40 hectares cujo projeto data de 1880, capela, prédios onde são produzidos e engarrafados os vinhos, além de uma antiga residência hoje transformada em hotel. Sem falar no restaurante, no café e no Museu Andino.
O tour mais completo começa pelos vinhedos, passa pela fabricação e inclui um pouco de história: um de seus rótulos, o 120, homenageia o grupo militar conhecido como “120 patriotas”: soldados que lutaram pela independência do Chile e, após uma derrota, precisaram fugir de tropas inimigas. A então dona da propriedade os abrigou em uma das bodegas, salvando-os.
São nove tipos de visitação, que podem incluir passeios de bicicleta, piquenique, degustação em grupos pequenos e até a Winemaker Experience, que permite ao visitante produzir – e levar para casa – seu próprio vinho.
Depois de tantas atividades, o descanso. O Casal Real, onde passei a noite, tem 16 quartos com nomes de variedades de uvas em uma prédio centenário e totalmente reformado. Em cada canto, uma peça que ajuda a contar a história centenária do local.
Visite
- -A vinícola Santa Rita oferece nove tipos de visitação. É preciso reservar.
- -O Tour Clássico custa 12 mil pesos chilenos (cerca de R$ 70) e inclui degustação e taça de brinde.
- -Informações: santarita.com
Viu Manent
Caminhadas ao ar livre, passeio de charrete, degustação e, para finalizar, almoço com comida típica. A Viu Manent, vinícola familiar fundada em 1935, tem tudo isso. Um dia no local, que fica no Valle de Colchagua, pode divertir também as crianças, o que nem sempre é possível em roteiros de enoturismo.
Os tours pelos vinhedos – a Viu Manent tem alguns dos mais antigos do país – são feitos em uma charrete puxada por cavalos. Há um jardim de variedades de uvas, com amostras de cada planta.
Vale a pena esticar a visita e conferir o restaurante Rayuela Wine & Grill. Cardápio variado, cheio de pratos típicos com jeito de comida caseira.
Visite
- -O tour Carruagem inclui passeio de charrete, visita à fábrica e degustação de cinco rótulos, a 16 mil pesos chilenos (cerca de R$ 90) por pessoa. Também oferece tour com ênfase em degustação de rótulos premium, a 35 mil pesos chilenos (cerca de R$ 200). É preciso reservar.
- -Também há passeios no fim da tarde em datas específicas e tour de bicicleta pelos vinhedos.
- -Informações: viumanent.cl
Emiliana
A Emiliana é a maior vinícola orgânica do mundo. Estive na sede do Valle de Colchagua, mas os turistas são recebidos apenas na de Casablanca.
Os princípios, contudo, são os mesmos: natureza preservada, respeito a qualquer forma de vida e vinhos reconhecidos mundialmente. Quem dá as boas-vindas nos jardins são os animais: galinhas, pavões, pequenas ovelhas e até lhamas vivem soltas. Cada um com a sua função. Tudo é ciência aplicada à produção de vinhos: segundo os preceitos da biodinâmica, é preciso observar a conexão entre os reinos vegetal, animal e mineral, sempre tratando o terreno como um organismo vivo, com estrutura e balanço naturais.
Visite
- -O Tour Orgânico Degustação tem visita aos jardins, aos vinhedos, a fábricas e degustação de quatro rótulos (a 16 mil pesos chilenos, cerca de R$ 90). Há, ainda, piquenique, almoço e a experiência de fazer o próprio vinho – tudo mediante reserva.
- -Informações: emiliana.cl
Montes
A Montes foi a oitava vinícola que visitei na viagem. Àquela altura, tinha visto muita coisa, mas o local ainda assim me surpreendeu.
Se comparada a outras do ramo, é uma empresa nova: foi fundada em 1987. O espírito inovador está em cada canto da sede, no Valle de Colchagua. A começar pelo prédio, construído com base nos preceitos do feng shui: claro e alto, é cercado por água. O passeio pelos vinhedos é feito em carro aberto e percorre a parte mais alta da propriedade.
A degustação é oferecida em um mirante com vista para todo o terreno. No final, o visitante chega à Sala de Barricas, onde são maturados os melhores vinhos Montes. Com luz e umidade controladas, os barris descansam ao som de cantos gregorianos, para que o vinho “envelheça” em um ambiente relaxante.
No pátio, no meio dos vinhedos, foi inaugurado em 2017 o restaurante Fuegos de Apalta, em um prédio envidraçado com vista deslumbrante. A comida é feita com produtos de regiões emblemáticas do país.
Visite
- -Todos os tours incluem passeio pelos vinhedos, pela fábrica, visita à sala de barricas com cantos gregorianos e degustação. Custam entre 14 mil e 40 mil pesos chilenos (de R$ 80 a R$ 220), de acordo com os tipos de vinhos escolhidos. É preciso reservar.
- -Informações: monteswines.com
Casa Silva
A Casa Silva pode ser a prioridade de quem precisa ou quer escolher um único estabelecimento para visitar. O local, no Valle de Colchagua, apesar de um pouco mais afastado de Santiago (cerca de duas horas de viagem), oferece estrutura completa para os turistas.
A empresa nasceu em 1892 produzindo vinhos que seriam engarrafados por outras marcas. Apenas em 1997, já na quinta geração da família Silva, é que se inicia a produção de vinhos de marca própria. A história do local é preservada em detalhes, e o passeio por lá inclui desde túneis subterrâneos do tempo da construção do prédio até salas com tecnologia de ponta para a produção da bebida, passando por uma coleção de carros antigos que pertenceram a integrantes da família.
O Hotel Boutique Casa Silva fica ao lado da vinícola, na antiga casa da família, que tem mais de cem anos. Só ele já vale a visita. Mas minha parte favorita do passeio foram os vinhedos. A paisagem, uma planície no pé de montanhas que alternam entre parreirais e áreas preservadas, é de tirar o fôlego.
O lugar oferece, além do tour tradicional, bicicletas para aluguel. Com elas ou a pé, é possível chegar ao Club House de Polo, Rodeo Y Equitación, onde fica o restaurante da vinícola. A vista, além dos vinhedos, dá para o campo de polo, outra paixão da família Silva.
Visite
- -A sede fica no Valle de Colchagua. É preciso reservar a visita.
- -Todos os tours incluem passeio pelos vinhedos, pela fábrica, visita à sala de barricas com cantos gregorianos e degustação. Custam entre 14 mil e 40 mil pesos chilenos (de R$ 80 a R$ 220), de acordo com os tipos de vinhos escolhidos.
- -Informações: monteswines.com
*A repórter viajou a convite da Wines of Chile