Passava das 19h quando o carro de ZH foi parado no meio do distrito de São José de Costa Real, onde sinal de celular é um sonho distante. Quem pedia para que reduzíssemos a velocidade era seu Leopoldo Ló, 89 anos, morador do interior de Garibaldi. Saiu de casa às pressas ao receber um chamado de nosso anfitrião anterior.
– O Boroto ligou lá para casa avisando que vocês iam passar por aqui, pra dizer que esqueceram um equipamento em cima da mesa dele – alertou.
Sem conter o riso por conta da operação improvisada pelos vizinhos, demos meia volta, mudamos o rumo e retornamos em busca do objeto esquecido. A cena pode causar estranheza para quem está acostumado ao corre-corre das grandes cidades, às inúmeras mensagens recebidas a cada minuto via WhatsApp e às ligações de celular a qualquer hora e em qualquer lugar. Entretanto, ilustra com precisão aquilo que vivenciamos ao longo de dois dias, no final de outubro, entre as principais rotas turísticas do município serrano localizado a cerca de 112 quilômetros de Porto Alegre: desapego total ao smartphone e um mergulho na vida rural a partir de uma nova rota criada no município, a Via Orgânica.
O trajeto é um passo à frente para o turismo de uma cidade que se tornou célebre como Capital do Espumante. Foi lá que, em 1913, nasceu a primeira bebida do tipo no país, produzido pela Peterlongo. É por isso que, hoje, um dos roteiros mais "efervescentes" do município é justamente a Rota dos Espumantes, composta por 19 vinícolas que abrem as suas portas aos visitantes para mostrar como é a fabricação da bebida.
Apesar da distinção, Garibaldi vai muito além da honraria. Oferece aos turistas outras cinco rotas locais e duas regionais que encantam os olhos e o paladar em meio à natureza ou no centro da cidade.
Embora Garibaldi chamasse a atenção desde os anos 1970, quando houve a inauguração de uma pista de esqui artificial, foi só em 2001 que a interiorização do turismo começou a acontecer. Antes disso, o único produto turístico era a Fenachamp. A primeira movimentação para atrair o pessoal de fora foi a criação de roteiros. Nasceram a Rota dos Espumantes, Passadas: a arquitetura do olhar e a Estrada do Sabor, que foi a primeira a chegar à zona rural.
Esses três roteiros abriram as portas para que novas ideias fossem incorporadas ao catálogo turístico e colocaram Garibaldi entre os sete principais destinos do Rio Grande do Sul. Em 2003, a Fenachamp – que havia sido suspensa – foi retomada e se transformou em uma festa bianual, realizada sempre nos anos ímpares.
Agora, são seis rotas locais, que incluem turismo religioso, de compras e destinada à produção orgânica, e duas estaduais, Maria Fumaça e Vale dos Vinhedos, que têm como objetivo levar para o município moradores do Estado e de fora.
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Entre os principais visitantes, estão pessoas de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Santa Catarina e Paraná. O mais novo roteiro a integrar o catálogo turístico é a Via Orgânica, que reúne propriedades que produzem exclusivamente alimentos livres de agrotóxicos.
– Chamamos um grupo para criar a primeira Comunidade do Alimento dos Produtores Agroecológicos da Serra Gaúcha, e chamou a atenção o bom número de propriedades certificadas que tínhamos – recorda a secretária municipal do Turismo, Ivane Fávero.
A partir daí, esboçou-se o projeto que tinha como pretensão unir turismo e produção sustentável. Da ideia no papel até a inauguração, no último dia 18, passaram-se quase dois anos. Ao todo, são 10 propriedades aptas para receber visitantes e oferecer experiências que vão desde uma caminhada em meio à natureza colhendo frutas direto do pé até um típico "merendin" em uma gruta regado a espumante orgânico.
Em comum, além do fato de extinguirem os agrotóxicos das suas produções, todos os produtores buscam a realização de um sonho, que é plantar em cada visitante uma sementinha de cuidado com a natureza para tornar o nosso mundo um ambiente melhor para se viver.