
Uma família extraterrestre chegou ao Brasil em 1887. Depois de circular pelo país, um jovem alienígena de aproximadamente 4,5 mil anos de idade chegou a Caçapava do Sul, na região da Campanha, no Rio Grande do Sul.
O simpático ser de outro planeta se encantou pelo município, adotou o nome de ET Caçapavano e decidiu que ali seria o seu lar para sempre. Mais do que isso: que incentivaria pessoas do mundo inteiro a conhecer aquele pedacinho de chão gaúcho recheado de belezas naturais. E mistérios.
A iniciativa vem funcionando. Um dos distritos da cidade, Minas do Camaquã, consolida-se cada vez mais como ponto de turismo ufológico — crenças locais e avistamentos ajudaram a construir a fama. Na estrada que leva até a localidade, a RS-625, existe uma placa de sinalização que mostra, justamente, uma nave espacial.
Tal artefato ali, sozinho, na beira do caminho de terra batida, instiga e demonstra que, a partir daquele ponto, as pessoas encontrarão uma terra que, para quem acredita, é um portal para outros mundos.
Celebridade local
Durante eventos ufológicos que ocorrem por ali, como palestras e vigílias, o ET Caçapavano faz aparições especiais — sempre rápidas, sem falar nada, comunicando-se gestualmente ou com a sua gaita, que entrega performances surreais de músicas tradicionalistas.
Em suas redes sociais, explora os pontos mais bonitos de Caçapava do Sul (Minas do Camaquã, claro, está incluso), mas também leva a mensagem de sua cidade para outros lugares que visita, vestindo a sua já tradicional camiseta com os dizeres "Eu amo Caçapava do Sul". O figurino é completado com uma bombacha e um cachecol.
O extraterreste também surge em festas de aniversário e casamentos, entre outras celebrações. Faz sucesso com os adultos e é aclamado entre as crianças. Por isso, cuida bem de seu legado, fazendo publicações otimistas nas redes sociais — quando tira fotos, sua marca registrada é erguer os dois polegares. É um ser positivo.
Com isso, virou celebridade de Caçapava do Sul. Em 2024, conquistou o Mérito Empresarial e Profissional da cidade, oferecido pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), vencendo na categoria Personalidade Caçapavana.
Identidade revelada
Se alguém ficou com dúvida, o ET Caçapavano é um personagem fictício. Trata-se de uma pessoa, humana, vestindo uma máscara de alienígena feita de látex. E toda a história do começo da reportagem foi imaginada por seu criador.
Ele cuida tão bem da criatura que não revelava sua identidade, tudo para manter o clima esotérico em torno do personagem. Só que a pessoa que inventou toda essa história tem uma tão interessante quanto aquela criada para o ser interplanetário. Por isso, decidiu tirar o disfarce para Zero Hora e contar um pouco da sua jornada.
Bruno Saldanha, 24 anos, começou sua jornada como extraterrestre em 2021. Havia criado uma conta nas redes sociais, pouco antes, para divulgar suas viagens pelo Rio Grande do Sul a bordo de sua moto e, depois, de sua Kombi. Sem nunca aparecer. Foi quando teve a sacada de juntar a fama de Caçapava do Sul de ser um local que conversa com a ufologia com o seu trabalho na internet. Eis que surgiu o ET Caçapavano, que foi conquistando espaço no mundo físico.
— Não posso ficar muito tempo de máscara. Antigamente, até ficava, mas, ultimamente, não. Me dói a garganta. Fico intoxicado por causa do látex — explica Saldanha. — Por isso, sempre que o ET é chamado, a gente combina de fazer uma breve aparição. Ele surge do nada, de um suspense. Às vezes, toco gaita, dou uma interagida e depois sumo.

Incentivo ao turismo
O personagem se popularizou, e Saldanha, que sempre gostou de turistar, pegou gosto também por incentivar o turismo. Logo depois de a região de Caçapava do Sul — mais especificamente, o Geoparque Caçapava — ser reconhecida como patrimônio geológico mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em 2023, o jovem fundou a empresa Turismo Caçapava. Por meio dela, oferece roteiros turísticos pela cidade e seus distritos.
Mas vai além disso. O intérprete do alien é responsável por comprar e colocar as placas de óvnis por Caçapava do Sul. A da RS-625 é apenas uma delas. Existem outras, sendo um dos destaques a que está na Estrada do Segredo, entrando à esquerda na RS-357, que leva até a famosa Pedra do Segredo.

Humor e anonimidade
Quem para ao lado da sinalização pode avistar, ao longe, a Pedra do ET, uma formação que, segundo Saldanha, lembra a cabeça de um alienígena. Não é tão fácil ligar o formato da rocha a um extraterreste, mas, para quem está disposto a entrar na brincadeira, tudo é válido.
— Eu, como ET, gosto de incentivar a pessoa a aproveitar a vida. Hoje, as redes sociais partem muito para o consumismo, o que não curto muito — explica Saldanha, que diz mudar a sua personalidade, sendo mais exagerado, ao viver o extraterreste. — Quando criei o ET, o foco era justamente o humor, que é um dos principais fatores para ir bem nas redes sociais. Tem a questão da anonimidade também, porque, se seu estivesse sem a máscara, certamente não teria o mesmo resultado.
E, claro, o próprio criador do ET Caçapavano já teve uma experiência ufológica. Foi em uma noite de 2019, por volta das 22h.
— A ufologia sempre me despertou curiosidade. Meu avistamento foi lá de casa. Moro em uma região de pedreira, de calcário. Meu pai viu uma luz estranha no céu, me chamou, e eu já saí com binóculos na mão. Consegui ver uma luz forte, redonda e branca. Ela fez movimentos muito bruscos, o que era o mais esquisito, e depois sumiu. Foi muito forte, muito diferente de tudo que eu já tinha visto.
Projeto para mapear o movimento
Enquanto Saldanha é um incentivador do turismo em Caçapava do Sul, investindo do próprio bolso para ajudar a criar a atmosfera ufológica da região e, assim, atrair curiosos, a prefeitura do município ainda não embarcou nesta jornada.
De acordo com o secretário de Inovação, Cultura e Turismo do município, Ignácio Lemos, por enquanto a cidade não consegue mensurar o número de pessoas que visitam a localidade em busca dos seres de outro planeta.
Lemos promete que, até o final do ano, deve ser implementado um sistema em hotéis e pousadas da região para registrar o motivo pelo qual cada turista chega ao município. Assim, será possível mapear o movimento e criar campanhas publicitárias direcionadas, além de buscar fundos específicos para desenvolver a área. O que ele sabe é que a busca por óvnis tem muito potencial.
— O turismo ufológico é muito importante para Caçapava do Sul, até porque a cidade já é um destaque em nível internacional, com diversos relatos de aparições de luzes no céu. Isso acabou se popularizando. Temos relatos da década de 1990 que foram pauta de programas de televisão. Isso traz grupos de diversos cantos do mundo para Minas do Camaquã, buscando luzes e objetos voadores não identificados no nosso céu — detalha Lemos. — Acho que até hoje nunca foi feito um trabalho em nível institucional para atrair esse público. Foi tudo de maneira empírica.
ETs e naves de crochê

Os moradores sabem do potencial e, por isso, já trabalham com o tema. É o caso de Jucelaine Moreira, 52, aposentada, dona do brechó Garimpo da Moda e também artesã. A partir do trabalho manual, ela começou a investir, justamente, nos seres interplanetários. Confecciona alienígenas e naves espaciais em crochê que, segundo ela, têm bastante procura, principalmente pelos turistas.
— Temos um sítio e vemos à noite meteoros e coisas que caem do céu. Acredito que exista alguma coisa. Por isso, quis desenvolver algo com características da terra. Comecei a fazer os bonequinhos de ETs e as naves, e vendo de quantidade. Ajuda muito na renda — diz a artesã.
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