Poderia ser um sítio, uma fazenda ou até o pátio de uma casa. Mas, na verdade, o espaço faz parte do Hospital Centenário, em São Leopoldo. Na manhã deste sábado, a instituição retomou o projeto Visita Pet com convidados especiais: além dos cachorros, os pacientes tiveram contato com coelhos e um carneiro filhote.
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Depois de quase três meses suspensa devido às baixas temperaturas do inverno, a atividade retornou brindada por uma manhã ensolarada e sem frio. O lugar a céu aberto conta com bancos, folhagens e paredes repletas de desenhos coloridos. No centro das atenções, estão os bichos - costumam participar entre cinco e 10 animais. O carneiro passa de mão em mão tomando mamadeira, enquanto os coelhos tentam se esconder pelos cantos. Já os cachorros, mais habituados à agitação, recebem carinho dos pacientes, familiares e funcionários - mesmo com o número elevado de bichos, latidos ou barulhos são raros. Os animais pertencem à ONG Coração Vira-Lata, principal parceira da iniciativa, e à Unidade de Ensino Estadual Visconde de São Leopoldo (Escola Agrícola).
- É um momento de desestressar. Eles param de pensar nos problemas e conseguem relaxar. Muda a rotina do hospital - afirma Fernanda Estrella, diretora de enfermagem do Centenário e coordenadora do projeto.
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Os encontros ocorrem semanalmente e duram cerca de duas horas - a visita fica restrita à área externa, sem a ida dos animais aos leitos. Também há a possibilidade do paciente se encontrar com seu próprio animal de estimação em um momento reservado. Recuperando-se de uma apendicite, Meguy Freitas Moreira, 11 anos, está com saudade do cachorro da família. Ele não veio, mas a brincadeira com os outros animais serviu para matar um pouco a saudade.
- Não é como se fosse com o meu, mas é bom. Dá para se distrair, porque no quarto eu estava sem fazer nada. Eu adoro animais - conta.
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Todos os pacientes com autorização médica podem participar e não há restrições de idade. Na visita desta manhã, pelo menos 15 internos passaram pelo local, e um deles foi Jaismara de Oliveira Severo, 27 anos. Desde quinta-feira esperando a cirurgia após ter sofrido um Acidente Vascular Cerebral (AVC), a encarregada de loja se aprontou assim que soube da Visita Pet.
- Até tomei banho bem rápido para vir. Acho que é uma coisa que não tem idade, todo mundo gosta. Ficamos mais alegres - avalia.
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Entre os animais, há um que parece estar em casa. Valente, um cão de porte médio e pelo claro, é o mascote do projeto e, por isso, participa da maioria das visitas.
- Ele tem até jaleco de médico. É um cão que ia ser sacrificado e estava muito machucado quando foi achado. Ele é um exemplo de superação - diz a enfermeira Fernanda Estrella.
Inspirado na história de Seco
O pátio interno do hospital recebe os animais desde agosto de 2014, quando estreou a Visita Pet após a aprovação de uma lei municipal. A inspiração para a iniciativa dos funcionários veio principalmente da história de Seco, um vira-lata que esperou o dono internado do lado de fora de uma instituição de Passo Fundo no ano passado.
_ Temos que entender que os tempos mudaram. Hoje, os animais são considerados como parte da família _ diz a coordenadora Fernanda.
De acordo com os organizadores, a iniciativa está entre as pioneiras do país em hospitais públicos. Uma das primeiras instituções do Brasil a adotar a prática foi o Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, que iniciou em 2009 e também serviu como referência ao projeto gaúcho. Para os animais participarem, é necessário estar de banho tomado, vacinas em dia e autorização do veterinário.
- Tomamos cuidado para tudo ser feito da forma correta, para não trazer riscos. Como temos muitos quartos coletivos, não é possível levar os animais aos leitos. Nesse formato, respeitamos a vontade de todos - ressalta Fernanda.
Em um ano de funcionamento, o projeto ganhou apoio de pacientes e funcionários - que também gostam de passar pelo pátio para acariciar os bichos. As opiniões contrárias foram minoria, segundo a enfermeira responsável.
- Foram raras as vezes que chegaram para reclamar. Já aconteceu de alguém achar um absurdo terem animais no hospital, mas explicamos que há um controle. Tudo é feito de forma responsável - avisa a coordenadora.
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Contato com animais pode trazer benefícios
De acordo com a psicóloga Ana Luisa Accorsi, especilista em intervenções assistidas por animais, diferentes estudos da área da saúde feitos nos Estados Unidos, na Inglaterra e na Itália mostram que o contato com os animais é positivo para a recuperação dos pacientes. Ana é voluntária no projeto e pretende utilizar a realidade do Hospital Centenário como base para desenvolver uma pesquisa científica sobre o tema.
- O contato com os animais diminui o estresse, a ansiedade, o medo e o tédio. Isso acelera o processo de recuperação e dá disposição para o paciente - detalha.
Hormônios antiestresse têm a produção aumentada, como a endorfina. Na opinião da especialista, os benefícios físicos não podem ser ignorados.
- Deixa os pacientes mais tranquilos e relaxados. Pode ocorrer também a estabilização da pressão sanguínea e dos batimentos cardíacos. Eles vivem em um momento de estresse muito grande, e o orpo está em um estado de alerta total. Tudo muda com a interação com os animais - destaca.
Na instituição de São Leopoldo, é explorada a atividade assistida por animais, e não a terapia. Como não há um programa terapêutico específico para cada paciente, o encontro passa a ser mais motivacional e recreativo.
- Eles se animam e se motivam. Aquela criança que vai triste acaba entrando em um clima totalmente diferente, mais alto-astral. Os familiares agradecem bastante - conta Ana.