O jornalista Caio Cigana colabora com o colunista Tulio Milman, titular deste espaço.
O presidente Jair Bolsonaro já pediu união entre os poderes. Chamou Rodrigo Maia de irmão. Em teleconferência com os governadores do Nordeste, chegou a elogiar a postura dos chefes dos executivos locais no combate ao coronavírus. Semanas antes, sugeriu que as manifestações convocadas em seu apoio fossem adiadas devido ao risco de disseminação do vírus.
Conta a fábula que, um dia, um escorpião e um sapo se encontraram na beira do rio. O artrópode peçonhento pediu para o anfíbio levá-lo à outra margem, em suas costas.
O sapo desconfiou. Alegou que o escorpião poderia ferroá-lo. O aracnídeo disse que não. Afinal, se fizesse isso, os dois afundariam. Convenceu e conseguiu a carona. Mas, no meio do caminho, o escorpião o picou. Incrédula, a vítima perguntou ao algoz porque fez aquilo. O escorpião disse apenas que aquela era a sua natureza. Não poderia mudá-la.
Horas ou dias após os raros acenos a convergências ou à sensatez, Bolsonaro voltou a atacar o Congresso, a incentivar as manifestações contra o parlamento e o Supremo Tribunal Federal, a minimizar a crise sanitária. Quer jogar a culpa de uma provável recessão em governadores e prefeitos, que de forma prudente apoiaram a paralisação temporária de atividades econômicas para frear a expansão dos contágios pelo coronavírus. Outros gestos pregando a concórdia podem vir. Mas não há razão para acreditar na sinceridade. A natureza do presidente é o confronto e a divisão. Foi assim por toda a vida. É uma tola ilusão achar que pode moderar atos e discursos.