O programa Gaúcha Hoje tem um quadro do qual gosto particularmente. Chama-se Vestindo a Camiseta e, em geral, é apresentado pela colega Kathlyn Moreira. Nesse espaço, são divulgadas ações de de entidades assistenciais que precisam de ajuda nas quatro estações. No inverno, as necessidades aumentam, porque, além de alimentos, é preciso providenciar agasalhos. Nem sempre as pessoas conseguem anotar como ajudar e é lindo de se ver, ao longo dia, ouvintes pedindo o contato, porque querem ser solidários.
Da mesma forma, é emocionante o engajamento dos ouvintes quando o repórter Tiago Boff conta uma de suas histórias inspiradoras que já se tornaram clássico nas manhãs da Rádio Gaúcha. Há milhares de gaúchos solidários, mas falta-lhes renda para ajudar a todos os que clamam por um prato de comida ou um agasalho.
Não é preciso recorrer às estatísticas para saber que a pobreza aumentou nestes 14 meses de pandemia. Basta circular pelas ruas das grandes cidades para constatar o quanto aumentou o número de pessoas dormindo na rua. Em Porto Alegre se multiplicaram homens e mulheres nas sinaleiras pedindo um trocado ou tentando vender alguma coisa — bala de goma, mandolate, bergamota.
Já fui adepta da campanha da prefeitura para não dar esmola na sinaleira porque esse ato de generosidade estimularia as pessoas a ficarem nas ruas. A orientação era doar dinheiro para o Fundo da Criança e do Adolescente, alimentos para instituições assistenciais e roupas na Campanha do Agasalho. Não sou mais. Carrego no carro uma caixa com alimentos não perecíveis e que podem ser consumidos na hora por quem está nas sinaleiras pedindo, vendendo ou fazendo malabarismos.
Um dia desses, numa esquina do bairro Moinhos de Vento, uma senhora de idade imprecisa ia de carro em carro pedindo dinheiro. Abri a janela e perguntei se preferia uma caixa de leite ou de suco. Hesitou e optou pelo leite. Agradeceu e disse “vou levar para o meu neto”. O sinal abriu, o carro de trás buzinou e ela se afastou antes que eu pudesse entregar o suco que lhe saciaria a sede.
Não acho que com uma caixa de leite ou um pacote de biscoitos esteja estimulando as pessoas a pedirem esmolas. Trata-se de uma emergência e quem teve o privilégio de manter o emprego e a renda nestes 14 meses de pandemia tem obrigação de ajudar, sem prejuízo dos canais recomendados pelas autoridades.
Todos os finais de ano, destino para instituições nas quais confio 6% do meu imposto de renda devido. Se você deixou para fazer a declaração do Imposto de Renda na última hora, ainda pode endereçar 3% para um dos fundos públicos. Pessoalmente, prefiro saber a quem doo parte meu dinheiro, a quem sei que vai utilizar de formas correta a deixar 100% no saco sem fundo de Brasília e saber que poderá ser usado no financiamento de projetos de poder ou na compra de carnes e de vinhos caros para quem está no topo da cadeia alimentar.
Estão aí as campanhas do agasalho e de doação de alimentos perecíveis, organizadas por governos e organizações da sociedade civil. Por que deixar mofando no armário roupas e sapatos que não nos fazem falta? Só como licença poética faz sentido o trecho de Saudosa Maloca dizendo que “Deus dá o frio conforme o cobertor”. No Rio Grande do Sul, o frio é sempre inclemente e faltam cobertores. Quem dorme na rua precisa de nós que temos cama quentinha e três refeições por dia.