A divulgação, com pequenos cortes, da reunião ministerial do dia 22 de abril, que precipitou a queda do então ministro da Justiça, Sergio Moro, serviu para consolidar a imagem de mito que o presidente Jair Bolsonaro tem entre seus seguidores. Tornar o vídeo público, como fez o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), é importante para acabar com as especulações sobre o sobre o que foi falado na reunião, já que se trata de uma das provas indicadas por Moro na investigação de suposto crime cometido pelo presidente.
Por mais que escandalize quem espera compostura de um chefe de Estado, o vídeo mostra Bolsonaro como sempre foi nos 28 anos de mandato como deputado federal: um homem autoritário, populista, agressivo, que usa palavrões para definir seus adversários, e obsessivo por armas. Parte dos seus eleitores não se incomoda com esses arroubos. Ao contrário, aplaude-os como sinal de autenticidade e de autoridade.
No ponto que interessa para o inquérito sobre a acusação de Moro, de interferência na Polícia Federal, fica subentendido, mas não explícito, que é à superintendência do Rio que se refere quando diz: “Eu não vou esperar f**** a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meus, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro!”
No vídeo, fica claro que Bolsonaro queria se livrar de Moro e de todos os ministros elogiados pelos meios de comunicação que o criticam. Cita a Folha de S.Paulo, a Globo e o site O Antagonista. Por esse critério, Paulo Guedes estaria fora da Esplanada, mas Bolsonaro precisa do ministro da Economia para se garantir com o mercado.
Outro que recebe elogios da mídia — mas que, por ter sido eleito, não pode ser demitido — é o vice-presidente Hamilton Mourão, que na reunião faz cara de paisagem e assiste meio de lado aos arroubos do presidente e às manifestações ministros Abraham Weintraub e Damares Alves. Em outro país, Weintraub e Damares estariam correndo risco de demissão, mas no Brasil de Bolsonaro acabam ganhando estabilidade.
Weintraub defendeu a prisão dos ministros do STF, numa afronta à Constituição, mas que agrada aos radicais que desprezam o Judiciário e o Legislativo. Damares falou em prender prefeitos e governadores, uma bravata que reforça seu alinhamento com o chefe.
Os termos chulos usados por Bolsonaro para se referir aos governadores Wilson Witzel (RJ) e João Doria (SP) e a prefeitos, chamados de “bostas”, impressionam tanto quanto o absurdo de dizer que precisa armar a população para evitar uma ditadura.
No dia seguinte à reunião — e contra a vontade de Moro — o governo publicou portaria aumentando limite de compra de munições por civis que têm posse ou porte de arma. O volume autorizado, que era de 200 cartuchos por ano, passou a ser de até 300 unidades por mês, dependendo do calibre da arma.