A jornalista Débora Cademartori colabora com Rosane de Oliveira, titular deste espaço.
Faltando nove dias para terminar o ano e 374 para encerrar o mandato, o prefeito de Caxias do Sul, Daniel Guerra (Republicanos), será afastado depois que 18 dos 23 vereadores aceitaram o sétimo pedido de impeachment protocolado na Câmara. As seis denúncias anteriores também traziam fatos iguais ou mais graves do que os relatados na última. Então, por que só agora o afastamento do prefeito da segunda maior cidade do Rio Grande do Sul foi adiante?
Líderes comunitários, empresariais e políticos chegaram ao limite da ausência de traquejo político de Guerra. A proibição de manifestações na Praça Dante Alighieri e o fechamento da Unidade de Pronto-Atendimento (UPA) 24 horas para reformas, contrariando determinação do Conselho Municipal de Saúde, foram as razões listadas na peça que fundamentou o impeachment bem sucedido.
Na prática, Guerra não passaria por este processo se mantivesse boa relação com empresários e vereadores e se estivesse disposto, desde o início, a abrir um canal de diálogo com representantes de entidades dos mais variados setores. Por comerciantes, ele foi acusado de usar a máquina pública para retaliá-los. Por parlamentares, de não estar disposto a recebê-los em seu gabinete — desde 2017 vetou 30 projetos assinados por eles.
Críticas de empresários em relação à gestão municipal ajudaram a formar maioria em apoio ao impeachment de Guerra. O presidente da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços (CIC) de Caxias, Ivanir Gasparin, chegou a dizer que os empreendedores da cidade estavam "com medo do prefeito". Gasperin havia sido autuado por irregularidade no letreiro do estabelecimento que administra na mesma semana em que criticara mais fortemente o governo.
— A cada 10 reuniões na CIC, oito são por causa do poder público municipal. Estamos apavorados. Não tem mais empresários aqui porque estão com medo — havia declarado antes de receber a multa da Secretaria do Meio Ambiente.
Ricardo Fabris, vice-prefeito que renunciou ao cargo no fim do ano passado, é o autor da sétima denúncia, assim como de outras três. Ele mesmo diz que a última peça foi apenas um pretexto para os vereadores aprovarem o afastamento do chefe do Poder Executivo da cidade.
— O sétimo pedido de impeachment foi a fagulha que precisava. Não há um lugar onde tu não ouves crítica ao prefeito, nos mais diversos segmentos da sociedade. Ele conseguiu atrair a antipatia e a raiva de grupos antagônicos, da esquerda e da direta — disse à coluna.
Fabris, que era do Republicanos — assim como Guerra —, afirma que não está filiado a nenhum partido e que pretende retomar as atividades como servidor concursado do Tribunal Regional do Trabalho.
Em Caxias, uma emenda à Lei Orgânica recentemente aprovada diz que, com o afastamento, uma eleição indireta será organizada pela Câmara de Vereadores. A tendência é de que Flávio Cassina, atual presidente da Câmara seja o eleito.
Aliás
A primeira desavença entre o prefeito Daniel Guerra e seu vice ocorreu no dia 30 de outubro de 2016. Ricardo Fabris havia dito a Guerra que achava inadequado aguardar na Igreja São Pelegrino o resultado do segundo turno. No outro dia, ao tentar entrar em contato com o colega de chapa, Guerra teria mandado um assessor dizer que não poderia atendê-lo. A partir daquele momento, a relação nunca mais foi a mesma.
ITENS CONSIDERADOS PROCEDENTES PELA COMISSÃO PROCESSANTE
Proibição da bênção pública de Natal dos frades capuchinhos na Praça Dante Alighieri
Motivo: "Relatório defende que as praças são bens públicos de uso comum do povo e que a todos é assegurado o direito a uma convivência harmônica e livre de preconceitos. Os bens de uso comum do povo são aqueles que podem ser utilizados livremente pela população. Assim, a utilização da Praça Dante Alighieri para manifestações religiosas e sociais não depende de autorização do município, apenas de comunicação à administração municipal.
Decisão do prefeito de fechar o Pronto-Atendimento 24 Horas para reformas, ignorando o Conselho Municipal de Saúde
Motivo: "O relatório concluiu que o Estatuto das Cidades (Lei nº 10.257/2001) estabelece diretrizes gerais da política urbana que deve ser executada obrigatoriamente pelos municípios e impõe a participação da população na gestão do município. Essa participação poderá ser realizada por meio de conselhos municipais e estes, uma vez criados e instalados, sujeitam as autoridades municipais à redução de sua liberdade decisória."
Proibição da realização da Parada Livre na Praça Dante Alighieri
Motivo: "O relatório defende que a Constituição Federal tem como objetivo promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art.3º da Constituição Federal). Afirmou-se que a parada do orgulho LGBT, parada do orgulho gay, parada gay ou, simplesmente, Parada Livre era um importante evento de afirmação para a comunidade LGBT e que permitir a Parada Livre em Caxias do Sul não era um ato de benevolência, mas sim um dever do Estado de empregar esforços para que ela ocorresse."