Focada nos temas incandescentes da política, da economia e desse mundo repleto de conflitos, descuidei das questões de comportamento é só agora, pela revista Donna deste fim de semana, soube que existe um curso de desprincesamento. "Deus do céu, o que é isso?", pensei quando vi a chamada. Teria entendido de cara se não fosse a última a saber que existe uma escola de princesas. Santa ignorância! A escola de princesas (deveria ser com letras maiúsculas?) ensina coisas que, de acordo com certa visão, toda menina deveria saber.
Eu não saberia criar uma princesa, mas poderia contar minha experiência pessoal em um desses cursos de desprincesamento. Quando se tem uma filha sem vocação para princesa, a tarefa de criar uma mulher sem inspiração nos contos de fadas se faz mais fácil.
Desde muito cedo, Luiza, minha filha de 21 anos, demonstrou aversão a estereótipos. Com três ou quatro anos, o Gatinho Travesso, escola infantil que ela frequentava desde bebê, ofereceu aulas de balé. Comprei roupa e sapatilha, vieram os ensaios e ela não reclamou, mas na apresentação do Dia das Mães grudou no tablado e não dançou. Em casa, disse que queria sair do balé. Trocamos o balé por aulas de espanhol e a vida seguiu seu rumo.
Minha filha nunca teve uma Barbie. Simplesmente achava monótono brincar de boneca e preferia jogos de montar, bola, instrumentos musicais, bichinhos de pelúcia. Nunca se interessou pelas princesas da Disney, começou a tocar piano mas trocou-o pela guitarra porque o professor André, ao contrário da professoras de piano, não a tratava como criança (aos 10 anos). Preferia jogar futebol e tocar guitarra e teclado a brincar de casinha. Aos 13 avisou que não queria debutar. Investimos o dinheiro da festa de 15 numa viagem a Paris, para celebrar os 14 anos no dia 14 de julho.
Muito cedo Luiza interessou-se pela fotografia, está concluindo o curso de Design Visual e acha mais produtivo assistir a documentários e filmes em inglês do que passar roupa, cozinhar ou preparar-se para ser uma dona de casa exemplar. Sim, e ainda joga videogame nas tardes de férias e futebol, de vez em quando, com as meninas da agência em que fez estágio.
Eu também não fui criada para ser princesa. Fui treinada para sobreviver em circunstâncias adversas. Minha mãe sempre disse que "saber não ocupa lugar". Cedo entendi as leis do duro trabalho na roça, ajudei a cuidar dos meus irmãos menores no turno inverso da escola, aprendi a cozinhar feijão e arroz com oito anos. Aos 10 fui morar com a minha tia para estudar na cidade e não tive tempo nem dinheiro para as coisas supérfluas. Sei lavar , passar, bordar, remendar, fazer tricô e crochê. Cozinho com prazer, adoro jardinagem, faço geleia de marmelo e compota de ameixa, mas gosto mesmo é de escrever, por isso escolhi ser jornalista.
No início dos anos 1970, nos últimos anos do Ensino Fundamental na Escola João Ferrari, em Campos Borges, aprendi muitas coisas da vida prática com a Unidade Móvel de Iniciação para o Trabalho, um caminhão que levava equipamentos e professores especializados em ensinar técnicas agrícolas, comerciais, industriais e domésticas.
Aprendi (e esqueci) a fazer instalações elétricas simples, análise de solo e leite de soja. Com o professor Walmir Nicolini aprendi o básico que um auxiliar de escritório precisa saber: carta comercial, ofício, memorando, cheque, nota promissória. Foi muito útil para conseguir os primeiros empregos, enquanto era estudante. Com a professora Miguelina, aprendi até a fazer vasos usando garrafa, massa do tipo caramujo e cola Tenaz. Não deu muito certo, porque me faltava habilidade com as mãos, mas deve ter despertado meu gosto por ikebanas.