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Aos poucos, o Talibã, milícia fundamentalista que reconquistou o poder no Afeganistão, vai mostrando suas garras. Dez dias depois de retomar o controle sobre Cabul, há vários indícios de que o grupo, por mais que faça promessas de moderação, continua tão cruel quanto durante os cinco anos em que exerceu o governo no país, à base do facão e do fuzil, entre 1996 e 2001.
O mais recente indício de que suas promessas de um Talibã "light" não passam de bravatas é a declaração do porta-voz da milícia, Zabiullah Mujahid, que na coletiva de imprensa desta quarta-feira (25) orientou as mulheres a permanecerem em casa "para sua própria segurança". O argumento é de que elas não estariam "seguras" na presença dos combatentes do grupo.
A orientação, conforme Mujahid, seria temporária, com o objetivo apenas de dar tempo ao comando talibã organizar regras de convivência. Nas palavras do porta-voz, para que elas "não sejam tratadas de maneira desrespeitosa" ou "Deus me livre, se machuquem".
Mujahid também alegou que os combatentes "sempre mudam e não são treinados".
- Pedimos que elas tirem uma folga do trabalho até que a situação volte ao normal e os procedimentos relacionados às mulheres estejam em vigor - afirmou.
Nos cinco anos em que esteve no poder, o Talibã exerceu um regime de terror, em especial contra as mulheres, obrigando-as a permanecer em casa e proibindo-as de trabalhar ou estudar. A menina Malala virou símbolo da luta das crianças e jovens por exercer esse direito. Mulheres também eram obrigadas a cobrir o corpo todo com a burca (uma tradição da etnia pashtun, da qual o grupo miliciano é oriundo).
Outros indícios de um mudança de comportamento do Talibã em relação às promessas feitas nos últimos dias é a suposta proibição de acesso ao aeroporto de Cabul de pessoas que desejam deixar o país. Até agora, o grupo vinha permitindo que os afegãos se aproximassem dos muros do terminal a fim de tentarem embarcar em voos para fugir do país.
Na terça-feira (25), o comando da milícia determinou que os Estados Unidos devem cumprir o prazo para retirada das tropas, prevista para ocorrer em 31 de agosto, próxima terça-feira. A comunidade internacional vem pedindo que o Talibã permita o prolongamento do prazo a fim de garantir a evacuação, considerada pelo presidente americano, Joe Biden, uma das mais complexas operações da história.
A Organização das Nações Unidas (ONU) divulgou nesta terça-feira (24) um relatório segundo o qual há relatos de violações, desde que o grupo voltou ao poder.
- Recebemos relatos confiáveis de graves violações do direito internacional humanitário e abusos dos direitos humanos ocorrendo em muitas áreas sob o controle efetivo do Talibã - afirmou a alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a chilena Michelle Bachelet.