Essa coisa de dar opinião, confesso que às vezes é meio frustrante. O caso do impeachment, por exemplo. Li a denúncia inteira contra Dilma, assisti aos depoimentos da acusação e da defesa, analisei o relatório da comissão especial, ouvi juristas das mais variadas tendências e, justo agora que o Brasil todo opina sem receio, eu fracasso miseravelmente. Não consigo formar o diabo da minha opinião – e sinto muito por isso, é angustiante, peço desculpas.
Faz semanas que me pergunto: sou contra ou a favor? É uma decepção diária, porque todo mundo é contra ou a favor. E eu nunca fui de subir no muro, pelo contrário, sempre manifestei o que penso sem maiores pudores, mas agora é diferente, não quero ser dramático, mas agora olho para os lados e me sinto meio... burro.
Como as pessoas têm tanta certeza sobre um assunto tão complexo? Quer dizer: se você tem uma opinião sobre o impeachment – e deve ter, já que todos têm –, sabe como é complexo esse negócio de pedalada fiscal, não sabe? Talvez possa até me ajudar, me dar umas aulinhas, porque, sinceramente, até agora não consegui entender os detalhes todos. E repito que tenho me empenhado, cara, juro que tenho.
Ainda vou falar das pedaladas, mas primeiro quero lembrar que já tive, sim, uma opinião. Já defendi a renúncia – e não o impeachment – da presidente. Só que logo me dei conta de que essa opinião era inútil, porque não há possibilidade de Dilma Rousseff renunciar. O PT precisa do impeachment para dizer que sofreu um golpe. Se Dilma renuncia, não há golpe, e, sem golpe, não há como faturar politicamente em cima da própria derrota.
Mas o mundo ideal seria esse, que ela deixasse o Planalto porque seu governo se inviabilizou, porque perdeu apoio no Congresso, porque perdeu apoio na sociedade e porque, sejamos francos, Dilma se mostrou a presidente mais despreparada já eleita no Brasil: um desastre do ponto de vista técnico e político. Não tem traquejo, não sabe negociar, não sabe administrar, não sabe falar.
Certo. Mas esses fatores todos – incompetência, minoria no Congresso e reprovação popular –, embora justifiquem uma renúncia, são suficientes para um impeachment?
Não.
E, por mais tentador que seja, não dá para derrubar a mulher por isso. Não em um regime presidencialista. Só o que pode derrubá-la, em um regime presidencialista, é a constatação de que houve um crime de responsabilidade. Não entram ideologias, diferenças políticas, repulsa à presidente, nada disso. Entram só as pedaladas fiscais, que norteiam as 65 páginas da denúncia que o Congresso avalia. Aí vem a parte chata, a parte em que me sinto burro.
Não há dúvida de que Dilma usou dinheiro dos bancos – dinheiro, portanto, que não era do Tesouro – para fingir, dissimular, mentir para a população que tudo corria bem na economia brasileira em 2014, ano de eleição. Um escárnio absoluto: imagine se todo presidente resolve atolar o país em uma crise dessa dimensão para se reeleger. Não pode, é um precedente grave, e Dilma precisa ser punida.
O problema é que outros presidentes, inclusive Lula e Fernando Henrique, também usaram dinheiro dos bancos para pagar contas públicas. Em proporções bem menores, é verdade (R$ 948 milhões no governo FHC contra R$ 60 bilhões no governo Dilma), e com muito menos frequência. Mas onde está escrito que, se pegar um pouquinho, não é crime; se pegar um montão, aí é crime?
Tenho lido que, se pegar um pouquinho, trata-se apenas de "descompasso de fluxo de caixa", mas ainda me parece um critério subjetivo. Até quanto é "descompasso de fluxo de caixa", e a partir de quanto é pedalada fiscal? Não entendo, ninguém me explica, ninguém me ajuda!
Sem falar que a Constituição diz que um presidente só pode responder por atos praticados "na vigência de seu mandato", e tudo isso foi no mandato anterior, só que a Constituição foi redigida quando nem existia reeleição, o que pode gerar uma interpretação de que é legítimo avaliar também o primeiro mandato, mas cabe lembrar que houve novas pedaladas em 2015, então as pedaladas atingem Dilma de qualquer maneira, quer dizer, isso se forem mesmo pedaladas, e não descompassos gigantescos de fluxo de caixa, o que me parece improvável, acho mais provável que os presidentes anteriores tenham feito pedaladinhas, e nesse caso todos cometeram crime de responsabilidade, se bem que Dilma pedalou muito mais e maquiou o déficit fiscal, o que é muito grave, então concluo definitivamente que:
Não sei.