Já faz algum tempo que eu não posso mais ser considerada praticante de nenhuma religião - não sei mais se eu tenho fé em qualquer coisa, não me julguem. Mas eu acredito muito no espírito natalino, especialmente em fazer pessoas felizes. Sempre que posso, recolho cartinhas para presentear desconhecidos e capricho nos regalos para as pessoas do coração. Eu gosto mesmo de dar presentes, ver sorrisos me faz feliz.
Só que eu sofro de um mal crônico de desorganização e falta de atenção. Meu saudoso avô me chamava de "cabeça de osso para sopa", de tanto vento que parece correr entre minhas orelhas. Parte dessa característica nada agradável fica evidenciada no Natal, quando eu acabo sempre deixando as compras - por mais que eu ame fazê-las - para a última hora.
Então lá fui eu, munida de paciência e zen-budismo (falei que eu era confusa sobre religião) atrás das lembrancinhas. Contudo, não foram as filas intermináveis para tudo, o barulho ensurdecedor ou as abordagens indiscretas dos vorazes vendedores que me incomodaram, tudo isso eu entendo fazer parte. O que me incomodou foi a falta de educação dos meus colegas consumidores(istas).
Um sem-fim de trombadas de sacolas, gente correndo no meio dos corredores, furação de fila, desrespeito à espera do táxi, xingamentos e gritaria com as crianças. Sério, gente? Eu entendo a correria, pessoal, mas não fazia parte do espírito natalino - independentemente da religião - o amor e o respeito ao próximo? Afinal, o que é mais importante?
Lembrei de um grafite que eu vi uma vez (não lembro onde) que dizia "de que adianta fazer ioga e não dar bom-dia para o porteiro?". Isso me tocou muito na época e me toca até hoje. De que adianta presentearmos os amados com coisas lindas se passamos por cima de outros seres humanos para conseguir adquirir esses objetos?
Este foi um ano pesado e o pouco dinheiro para as compras de Natal evidencia ainda mais isso. Mas a dureza da carteira não pode nos fazer perder a ternura uns com os outros. O mínimo de bom senso no trânsito, na fila do banco, no caixa do súper. Papai Noel, no próximo ano, me dá isso de presente?
Opinião
Incoerências natalinas
Jornalista, editora de Cultura e Entretenimento de ZH
FêCris Vasconcellos
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