O Real Madrid acaba de materializar a queda absoluta de um gigante. No caso dos merengues, não se trata de rebaixamento à Segunda Divisão, já que esta possibilidade inexiste no contexto do futebol espanhol nem para madridistas, nem para barcelonistas. O tombo tem o mesmo tom catastrófico, mas noutra levada.
O presidente atual, Florentino Perez, é o mesmo dos mais vitoriosos anos do Real. Conheceu a glória completa com todos os títulos possíveis, investiu milhões de euros em estrelas internacionais, elevou o clube a patamares de popularidade que transcendem qualquer situação anterior. Mesmo assim, não há ciclo positivo ou negativo que dure ad eternum. Vale para a vida, vale para o futebol. Com o Barcelona, aconteceu logo após a perda do Mundial para o Inter em 2006. Noutros termos, é verdade, já que a solução estava dentro do próprio clube no surgimento do genial Pep Guardiola, que formataria um dos melhores times da história do futebol logo a seguir.
Mas voltemos ao Real Madrid. Depois de alcançar um improvável tricampeonato europeu e mundial, a fadiga dos metais se anunciava claramente na insatisfação de Cristiano Ronaldo. O português não se sentia valorizado o suficiente (!) no Real e, não bastasse, travava batalha perdida com o fisco espanhol. Sua saída foi o primeiro sinal evidente de fim de ciclo. Aliás, errata: o adeus de Zidane veio antes e anunciou o que estava por vir.
O que não esperavam torcida e dirigentes é que este vazio representasse tanta perda para o conjunto da obra do que se desenharia depois. Modric, após ser o melhor jogador da Copa russa, quis sair, ficou. Marcelo se desconcentrou, virou bancário. Kroos, um acertador de passes como nenhum outro, transformou-se num burocrata. Courtouis passou a levar gol que não se toma em casados x solteiros. Treinador foi contratado e demitido como se o Real tivesse sede no Brasil. No cotidiano do clube, intrigas, soberba, vaidade e outros pequenos pecados se somavam entre uma rodada e outra. Não por acaso, os resultados de campo desandaram. No meio do turbilhão, chegou Vinicius Júnior, que imediatamente passou a ser referência dos galácticos. Um jovem carioca de 18 anos recém-chegado ao mundo dos ricos erigido ao centro do time. Como assim, cara-pálida?
Sem chance no Espanhol, sem título de copa nacional a disputar e eliminado da Liga dos Campeões, o Real Madrid terá que se reinventar sob o comando do mesmo presidente. Dinheiro não falta, nunca faltou. O que será feito dele, sim, é a pedra de toque para o ressurgimento imediato ou não do gigante caído. Adapte à proporção do clube pelo qual você, leitor ou leitora, torce e verá que algumas coisas se repetem nas crises que viram revolução. Os sinais sempre estão lá bem antes da hecatombe. Difícil é ter a lucidez de vê-los entre os confetes dos títulos conquistados enquanto a tormenta sorrateiramente se desenha. Vale para o futebol. Vale para a vida.