
Seja em debates, seja no ritmo de negócios, os cinco dias da Expodireto Cotrijal, em Não-Me-Toque, no norte do Estado, refletem o momento que vive o agronegócio gaúcho. Nesta edição, quando o setor produtivo completa quatro safras frustradas nos últimos cinco anos, a tônica não poderia ser outra: as consequências das sucessivas estiagens têm pautado a feira.
Na Casa RBS, não é diferente. Nesta quinta-feira (13), durante o terceiro e último Campo em Debate desta edição, lideranças do setor produtivo debateram os impactos de recorrentes adversidades climáticas no Estado, que passam, segundo os especialistas, pelo endividamento rural até efeitos nas cidades.
De Tapera, no norte do Estado, Vilson Hubner representou os produtores rurais gaúchos durante o evento. E trouxe a sua preocupação:
— Nós, com uma safra normal, já iríamos ter problemas de saldar as dívidas, que foram alongadas nos últimos três anos. Agora, confirmando essa frustração no quarto ano seguido, com o preço da commodity que está, a qualidade do grão, as dificuldades vão ser muitas nos próximos meses.
Antonio da Luz, economista-chefe da Federação da Agricultura de Estado (Farsul), lembrou, no entanto, que as consequências de estiagens consecutivas não são mais um problema "apenas do produtor":
— Olhar para cima e torcer para chover há muito tempo deixou de ser um problema do agricultor. Virou também problema do pessoal dos transportes, das cooperativas, das cerealistas, das revendas de insumo, da indústria de máquinas, das empresas de consultorias. De toda a cidade.
Em um levantamento divulgado recentemente pela Farsul, a entidade calculou que, nos últimos cinco anos marcados por estiagens, só o produtor rural deixou de receber R$ 117,8 bilhões. Considerando toda a cadeia produtiva do agronegócio, incluindo a cidade, a perda chega a R$ 319,1 bilhões.
Da Luz lembrou ainda que essas dívidas que se acumulam no campo estão com as instituições financeiras, "não com o governo federal". Segundo o economista, dos recursos disponibilizados no último Plano Safra, 75% eram livres, ou seja, de bancos, não tinham ligação com o Planalto.
— A dívida é com o sistema financeiro, não com o governo. São com empresas, que estão localizadas no meio urbano, que empregam um monte de gente também — reforçou Da Luz.
Ireneu Orth, presidente a Associação dos Produtores de Soja do Estado (Aprosoja-RS), que também participou do evento, defendeu a necessidade de se achar uma solução para o problema, "que é do campo e da cidade".
— Qual é a saída para não perdermos as pessoas no campo? Fazer um alongamento da dívida — argumentou o dirigente.
Orth se referiu à pauta da securitização das dívidas dos produtores gaúchos, que tramita no Congresso Nacional e será tema de mobilização nesta sexta-feira (14), na Expodireto. A Aprosoja-RS, enquanto entidade, participou da elaboração da proposta.
Os dois projetos de lei que tramitam no Congresso propõem a unificação das dívidas de cada produtor e a prorrogação por 20 anos, com três de carência e juro de 1% a 3% ao ano, além da criação de um fundo garantidor e de uma linha de crédito.
— Se não cuidarmos desse montante de dívidas, não haverá condições de olhar para frente — concordou Da Luz, da Farsul.
Também participou do encontro Fabricio Rosa, diretor executivo da Aprosoja Brasil. Ele lembrou que a securitização já foi feita no país, por meio de lei aprovada durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso, em 1995. E, ainda segundo Rosa, a Aprosoja também teve ampla participação na elaboração:
— Percebemos (na época) que havia um ambiente político desorganizado. Percebemos, então, que, ou a gente organizava realmente o ambiente para endereçar as questões que afetavam os produtores brasileiros, ou iríamos ficar sempre criticando, reclamando, com vários problemas e sem soluções.