A advertência que se repete, às vezes, surpreende ou enfada e pode não ter a graça do novo nem poder de fada. Mas repetir verdades é relembrar o que não se deve esquecer por ser essencial à própria vida.
Foi assim que, nesta Semana Mundial do Meio Ambiente, o papa Francisco repetiu e ampliou o alerta sobre a progressiva destruição do planeta gerada pela exploração e uso do carvão e do petróleo. Primeiro, reunido com ministros de economia de países da Europa, África e América Latina, exigiu (sim, "exigiu") que respeitassem o Acordo Climático de Paris para evitar a hecatombe, "esse apocalipse criado pela cobiça humana". Depois, pelo "tuíter" repetiu o alerta pela internet a cada um de nós.
"Continuamos a percorrer estradas antigas, valorizando o dinheiro mais do que a vida, presos à corrupção de interesses e contando como lucro aquilo que ameaça a sobrevivência", escreveu sobre o uso dos combustíveis fósseis, em alusão ao perigoso aquecimento global. Lembrou que se dirigia a toda a humanidade, "não só aos católicos, pois a obra Divina da Criação é de todos".
E aqui? O que fizemos ou fazemos em defesa do planeta?
A falcatrua moral aliou-se à corrupção do dinheiro
Os deputados da Comissão de Meio Ambiente da Assembleia Legislativa visitaram uma mina de carvão a céu aberto em Butiá e elogiaram "a alta tecnologia" que abriu profundas crateras, mais tenebrosas que as da lua. Era o exato Dia Mundial do Meio Ambiente e – a partir do alerta do Papa – o elogio soou como se um anjo ingênuo e desprevenido visitasse o inferno em busca do Paraíso…
Esse insólito amor ao ultrapassado combustível do século 19 (que a ciência do século 21 descarta por ser o grande responsável pela destruição do planeta) só é explicável pela cegueira e surdez face ao que o Papa resumiu numa frase: "Se não acabarmos com os gases de efeito estuda até meados deste século, será a vitória da cobiça e da morte sobre a vida na Terra".
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Os horrores do dia a dia nos tornam cegos para o essencial. A corrupção pula do público ao privado, como no cais da Capital.
Há duas décadas, o cais central foi desativado, deixou de ser o núcleo de cargas e descarga do que produzíamos ou comprávamos. Virou traste velho e abandonado. A "revitalização" prometida era falsa. Só simples maquiagem, com o cais deixando de ser porto e virando zona de lazer e comércio à beira do rio. Nem assim foi adiante.
A falcatrua moral aliou-se à corrupção do dinheiro. O que o Papa alerta sobre as minas de carvão define, também, muito do horror do cais.