A decisão do Superior Tribunal de Justiça, mandando que o horror da boate Kiss vá a júri popular em Santa Maria, não é só o triunfo da justiça sobre a impunidade. A tragédia que (há seis anos e meio) matou 242 pessoas, obriga a que o descaso que gerou o crime não se repita jamais, em nenhuma circunstância e sob pretexto algum em qualquer área.
Se o Ministério Público tivesse sido minucioso e exigente, não se contentaria em mandar abafar o ruído da boate, como pediam os moradores vizinhos em 2012, meses antes do crime. Não exigiria, apenas, forro acústico. Teria mandado fechar a boate por total falta de segurança.
Os bombeiros teriam facilmente constatado que aquilo era uma ratoeira humana, sem saídas de emergência, e que o novo forro de "isopor", altamente inflamável, era um convite à morte.
Mas o desdém prevaleceu. Os donos da Kiss alardeavam que aquilo era "seguro" e "apto" para reunir. A banda festejava o bobo fogaréu incendiário.
E a ideia absurda e equivocada foi "vendida" como se verdade fosse. O "forro acústico" barato, fazia o lucro ainda maior. Na cobiça, só importavam os cifrõe$. Corpulentos "seguranças" vigiavam a única saída, impedindo eventuais fugas sem pagar. E surgiram meia-dúzia de subempregos.
A soma disto tudo provocou a tragédia de janeiro de 2013, até hoje sem culpados. Punir os responsáveis não é vingança. Faz justiça para que não se repita horror igual ou semelhante.
***
Somos, porém, ingênuos, cegos ou surdos. Não aprendemos que prevenir ou evitar o horror vale mais do que chorar de dor.
Desde o final do século 20, a ciência, a ONU e as igrejas católica e luterana (além de rabinos judaicos e imãs muçulmanos) alertam para o horror do aquecimento global provocado pela extração e uso dos combustíveis fósseis, como carvão mineral e petróleo. Está em perigo a humanidade, mas agimos como, no século 19, já alertava o grande Euclydes da Cunha: "Vamos para o futuro sacrificando o futuro, como se andássemos às vésperas do dilúvio".
É, como dizia ele, o "desenvolvimento às recuadas", em que o horror está junto a nós e, desatentos, não percebemos. Hoje e aqui, é o caso da pretendida mina de carvão a céu aberto, em terrenos de banhados, junto ao Jacuí, a 10 km em linha reta da Capital, que desviará dois arroios e, em 10 ou 20 anos (além de poluir o ar) pode degradar o rio e infestar o Guaíba.
Toda a área metropolitana sofrerá e colaboraremos para assassinar o Planeta. Quem quer o horror da Kiss multiplicado por milhões?