A noção de justo ou injusto deve surgir, apenas, da formalidade fria da lei e, assim, tornar-se benigna com o crime? Ou deve ter base na realidade para coibir e punir o delito em defesa de todos nós?
Faço-me a pergunta depois que o Supremo Tribunal, por 6 votos a 2, declarou válido o decreto de indulto de Natal de Michel Temer que, junto a traficantes e ladrões de galinha, colocará em liberdade nada menos do que 22 dos 29 condenados por corrupção na Lava-Jato. Ainda que faltem votar três ministros do STF, o resultado já se definiu em menosprezo a toda a sociedade. Só o ministro Edson Fachin votou a favor do relator, Roberto Barroso, que sustentou a tese de que "corrupção é crime violento praticado por gente perigosa" e, como tal, não pode ser objeto de indulto. Ou como frisou Fachin, o indulto "tem caráter humanitário e corrige iniquidades do sistema penal", o que não é o caso dos corruptos condenados, todos bem tratados e a maioria, até, já em casa, com tornozeleiras.
O Supremo, porém, entendeu que indultar é atribuição privativa do presidente da República que, assim, faz o que quer para o que der e vier…
Por ironia, esse Carnaval antecipado ocorreu no mesmo dia em que Luiz Eduardo Pezão, do MDB, foi preso em pleno exercício do cargo de governador do Rio de Janeiro, acusado de receber de R$ 25 milhões a R$ 32 milhões "em espécie", do ano 2000 a 2015. Era, então, vice de Sérgio Cabral, o ladrão mor da quadrilha do MDB, condenado a quase 200 anos, ou recém iniciava seu próprio governo.
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Se a Justiça não dirime os conflitos e tão só os agrava, a quem apelaremos nos próximos anos?
Na campanha eleitoral, o estilo autoritário de Jair Bolsonaro podia ser mera tática para catar votos num país em busca de "alguém com coragem". Na transição, porém, o estilo rude permanece e pode afetar, até, as relações do Brasil com o mundo e nos levar ao ridículo com a ciência.
Alguém assoprou aos ouvidos do presidente eleito que a preservação ambiental (ao proteger a Amazônia) "sufoca o agronegócio e fere e soberania do Brasil", e ele já ameaça retirar o Brasil do Acordo de Paris, que vê nas mudanças climáticas o grande perigo a enfrentar no século 21.
O que é mais justo? Preservar desde já a vida futura do planeta e da humanidade em si, ou multiplicar os lucros de algumas dezenas ou centenas de vorazes desmatadores de florestas?
Em tudo na vida, o injusto muitas vezes se fantasia de justo, tal qual lobo com pele de cordeiro.