
A retomada do futebol brasileiro mantém o VAR como assunto predominante. Seja pela utilização ou pela falta de uso, o recurso é o foco do debate por conta das polêmicas registradas no empate em 1 a 1 entre Athletico-PR e Flamengo pelas quartas de final Copa do Brasil. Todos querem saber o porquê de o árbitro de vídeo não ter interferido no lance em que o goleiro Diego Alves pegou a bola com as mãos fora da grande área em disputa com Marcelo Cirino. A resposta para essa pergunta é bastante complexa, mas vou tentar esclarecer a questão.
Indo direto ao ponto, houve o entendimento de que a infração cometida pelo goleiro do Flamengo não interrompeu uma chance clara e imediata de marcar um gol. Desse modo, a ação não representaria uma situação de cartão vermelho direto e o recurso eletrônico não teria como se meter. Vale lembrar que, de acordo com o protocolo do VAR, a única justificativa para a interferência seria a avaliação de que a arbitragem cometeu um erro grave ao não expulsar Diego Alves. Ou seja, o árbitro de vídeo não poderia chamar Anderson Daronco apenas para marcar a falta fora da área se entendesse que o lance era para amarelo.
Há uma lembrança importante sobre a definição de chance clara e imediata de marcar um gol. O mero fato de ser uma infração cometida pelo goleiro não é suficiente para determinar isso. A regra não fala em momento algum sobre faltas cometidas pelo "último homem". Isso não passa de uma lenda do futebol. Há quatro elementos que precisam ser levados em conta para a construção de uma chance clara e imediata de gol:
1 - A distância entre o local da infração e a meta;
2 - A direção em que a jogada se desenvolvia;
3 - A possibilidade de manter ou de controlar a bola;
4 - A posição e o número de defensores.
O lance de Athletico-PR x Flamengo cumpre o primeiro critério. A distância entre o local da infração e a meta era próxima. O segundo também. A jogada tinha a direção do gol. O grande problema está no terceiro. Marcelo Cirino não teve em nenhum momento o controle ou a possibilidade de manter o controle da bola. Olhando a jogada é possível afirmar que o atacante tocaria na bola com o bico da chuteira. Entretanto, não consigo dizer com certeza que esse toque caracterizaria a chance clara e imediata de gol, pois o goleiro do Flamengo estava de frente e fechando o espaço.
Outro ponto a ser considerado é que a determinação da CBF é de que a régua de interferência do VAR seja bastante elevada. Isso quer dizer que o recurso só deve entrar em ação quando houver a certeza de erro claro dentro das situações de protocolo. Essa foi a ideia passada pelo chefe da arbitragem Leonardo Gaciba em recente treinamento com os árbitros durante a Copa América. Esse ponto é bastante delicado porque a condução desse processo ainda está em fase de adaptação e envolve grande parte de interpretação. Talvez se o árbitro Anderson Daronco tivesse sido alertado pelo VAR a reclamação teria sido menor, ainda que a decisão final fosse de marcar a falta e mostrar somente o amarelo.
O que podemos ter certeza é de que no campo, na velocidade do jogo, era impossível perceber a irregularidade. A bola veio do sistema defensivo do Athletico-PR e houve um lançamento de mais de 60 metros. Daronco estava posicionado próximo da origem da jogada e nem que tentasse conseguiria correr na velocidade da bola. Como a linha de defesa do Flamengo estava avançada, o assistente Leirson Peng Martins também estava adiantado e não conseguiu acompanhar o lance.
Para encerrar o assunto, quem viu o lance com atenção percebeu que o Marcelo Cirino não notou a infração do goleiro. O próprio atacante evolvido não viu e seguiu o jogo como se nada tivesse acontecido. Só o VAR poderia resolver a parada. Certo ou errado teve um motivo para não resolver.