Você vai ficar espantado com a informação que lhe passarei agora: o número de bactérias que habitam o seu corpo é maior do que o número de células que o formam.
Muito maior.
Dez vezes maior.
Ou seja: você é mais bactéria do que gente. Você, na verdade, é legião, porque é muitos. Você não é um indivíduo: é uma colônia de seres vivos.
Talvez isso o assuste, porque as bactérias não gozam de imagem positiva entre os seres humanos. Tanto que nós, seres humanos, inventamos uma arma especial para matá-las: os antibióticos. O que não deve surpreender a ninguém, porque nós, seres humanos, inventamos ainda mais armas especiais para matarmos a nós mesmos, seres humanos.
Só que algumas bactérias são nossas amiguinhas. Elas mantêm nosso amado corpo equilibrado, saudável e forte como a defesa do Grêmio. Há até as que nos salvam a vida. Dessas falarei.
É que recentemente os cientistas fizeram uma descoberta extraordinária acerca das bactérias do bem. Quem me contou essa admirável novidade foi um cientista brasileiro que mora aqui, em Boston. Ele se chama Romualdo Barroso. Já escrevi a seu respeito: ele é aquele homem que gosta de caminhar de manhã só para ouvir os passarinhos que chilreiam pelas ruas de Brookline nas primeiras horas do dia. Vou tentar explicar a você o que ele me explicou, mesmo que não tenha o mesmo conhecimento.
Foi o seguinte: os cientistas começaram a desconfiar que pessoas que hospedam nos intestinos certo tipo de bactérias reagem melhor à imunoterapia no tratamento do câncer.
Como chegaram a essa suspeita? Assim: eles fizeram exame de fezes em vários pacientes tratados com drogas imunoterápicas. Nos que abrigavam essas bactérias, o remédio funcionava. Nos que não abrigavam, não.
Era uma pista importante. Mas o que, exatamente, queria dizer? Será que as bactérias eram a causa do sucesso no combate ao câncer? Eram bactérias "anticancerígenas", por assim dizer?
Era preciso responder a essa pergunta.
Então, os cientistas passaram a fazer experiências. Pegaram ratos e neles inocularam câncer. Como é possível inocular câncer em um rato, isso é algo que o Romualdo me explicou, mas não tenho espaço suficiente para explicar a você. Pergunte a ele uma hora dessas. O importante, neste momento, é que os ratinhos, coitados, ficaram com câncer. Aí os cientistas tomaram as fezes daqueles seres humanos que tinham as tais bactérias e obrigaram os ratos a engoli-las, algo que você deve achar terrivelmente nojento, mas talvez não achasse se fosse um rato, porque ratos estão acostumados a comer coisas horríveis, como pizza de chocolate.
Você é mais bactéria do que gente. Você, na verdade, é legião, porque é muitos. Você não é um indivíduo: é uma colônia de seres vivos.
O que interessa é que os tais ratos, agora, também levavam as nossas bactérias no ventre. O passo seguinte foi dar, aos ratos, doses da droga imunoterápica. E os ratinhos que comeram cocô com bactéria se curaram, enquanto que os outros, que só comeram queijo, morreram.
Quando o Romualdo me relatou essa experiência, fiquei maravilhado, e não apenas pela descoberta em si. Fiquei encantado com o método de trabalho dos cientistas, que é a experimentação prática, a observação da realidade.
Por isso, por ter achado interessantíssimo esse caso, queria dividi-lo com você. Mas queria, também, usar o exemplo para ilustrar outro setor da vida humana e para discorrer sobre uma realidade que hoje aflige o Brasil. Farei isso na próxima coluna.