A inteligência artificial não é uma ameaça à humanidade; a verdadeira ameaça é a estupidez natural dos humanos.
Toda a tecnologia de democratização da informação teve um efeito colateral de aflorar uma antes impensável tacanhice. Os Estados Unidos tornaram-se um exemplo diário dessa contradição. Antigamente um exemplo de intelectualidade e tecnologia, hoje o país extremos como a epidemia de sarampo em Nova York causada pelo movimento antivacinas. Esse movimento é forjado em uma mentira que ainda se propaga pela internet, e sobre a qual escrevi aqui há anos. A crise fez o prefeito declarar emergência e relocar as famílias não vacinadas para zonas isoladas da cidade – algo inacreditável.
Falando nisso, o presidente Trump mente deslavadamente no Twitter todos os dias: diz que energia eólica causaria câncer (não causa); afirma que seu pai nasceu na Alemanha (não nasceu). Com isso, levou telejornais a criarem quadros chamados Checando as Declarações do Presidente para informar ao público sobre a verdade e evitar pânico. Assim vive-se atualmente nos EUA: tentando ignorar as mentiras espalhadas na internet, impedindo que o governo corte o orçamento nacional de ciência e privatize a educação fundamental – já foi tentado, mas o Congresso vetou.
Trava-se uma batalha diária entre o racionalismo e uma perigosa ignorância, que arrisca vidas e o futuro de todos. Principalmente, danificou-se talvez irreparavelmente a credibilidade do sistema de governo. Para alegria dos seus maiores competidores, a Rússia e a China.
Infelizmente, o Brasil segue os piores exemplos dos americanos. Saudade de quando copiávamos só o fast food! Falta clareza do governo em explicar e liderar uma reforma razoável para a Previdência. Cortam em 42% o orçamento já debilitado de ciência e tecnologia – quando declararam na campanha que triplicariam o investimento. A educação foi relegada a uma batalha entre facções, propondo a revisão da própria História do país.
Felizmente, o lado bom da tecnologia, que vem revolucionando a informação – e, consequentemente, os modelos de negócio –, é que as mentiras não se sustentam. A inteligência artificial avançará cada vez mais, eliminando empregos, mas criando outros, diferentes, em uma nova economia, inquieta, veloz, disruptiva. Criativa e colaborativa. Vejo os setores empresarial e universitário entendendo isso e cooperando, independentemente do governo, promovendo inovação – inclusive em Porto Alegre, quem diria, iniciativas como Tecnoparques,
o Pacto Alegre, a Fábrica do Futuro, o Instituto Caldeira. Contudo, é direito da população que o governo priorize ciência, educação e saúde, incluindo cada setor na gestão dos seus recursos, legislando para habilitar pessoas a prosperar nesse novo mundo. Prender-se a velhos modelos, revisionismos ou ideologias conservadoras pode alijar de vez o Executivo desse progresso, gerando uma problemática dúvida: afinal, ele serve para quê?