"Professor, um amigo meu usou o verbo bocaberteou (de boca-aberta) para dizer que o irmão tinha sido descuidado com o celular, que terminou sendo roubado no ônibus. Isso é um neologismo, não é? A gente pode inventar palavras para nossa língua? Essa até que eu achei legal" – pergunta Celso B., estudante de Rio Grande. Pois eu também, Celso; essas brincadeiras feitas com nossa língua são papa-fina para mim, um adicto incorrigível do prazer que as palavras produzem – mas tenho de informar que essas preciosas criações dificilmente vão fazer parte ativa de nosso léxico. São formações momentâneas, expressivas, adequadas a uma situação muito específica, mas que chamam demasiada atenção por sua novidade e estranheza e não atingem a frequência de uso das palavras comuns. Mário de Andrade, por exemplo, brinca maliciosamente com isso: "a musa sentiu-se farta, bifarta, centifarta, multifarta"; "estrambólicas, sonambúlicas e não-me-amólicas"; "o poeta fogo-de-artificiou o Centenário Independentriz e Brasilial"; "entusiasmo pela "luso-poetice guerrajunqueiriz e juliodantal (de Guerra Junqueiro e Júlio Dantas) – tudo isso para falar da obra de um poeta que devemos, pois, "vaiar, fiaufiauizar, batatizar, ovopodrizar"... Servem para o momento, mas não vingam. Outro Mário, o nosso Quintana, não hesitou em escrever "Um dia, os padres se desbatinaram" – um exemplo mais sutil, de maior finura, mas que também morreu ali mesmo.
O Prazer das Palavras
Desemalando dinheiro
Não é fácil distinguir as palavras novas das antigas. Faça o teste proposto e se surpreenda
Cláudio Moreno
Enviar email