
É difícil encontrar alguém, em Canela, que não tenha posição sobre o destino do Parque do Palácio, localizado nas proximidades do Solar das Hortênsias, onde fica a residência oficial de verão do governador do Rio Grande do Sul. A área verde de nove hectares está sob administração da prefeitura desde 2010, quando foi cedida ao município pelo Estado, na gestão de Yeda Crusius (PSDB). Essa cessão, porém, só foi feita com a condição, sacramentada por lei, de que no local seria construído um centro de eventos – o que não aconteceu.
O que a administração municipal quer fazer é uma concessão à iniciativa privada. Para tanto, encaminhou um pedido à Câmara de Vereadores, que deve votar o projeto nesta segunda-feira. A prefeitura, que diz não ter orçamento sequer para a manutenção do parque, vê a parceria com uma empresa como alternativa para não correr o risco de devolver o terreno ao Estado. "O Município compromete-se a implantar, no imóvel descrito no art. 1.º (o Parque do Palácio), um Centro de Convenções e Congressos, revertendo ao patrimônio do Estado caso seja dada destinação diversa", diz o artigo 2º da lei estadual nº 13.506/2010, que está em vigor.
A prefeitura garante que tentou administrar o local com recursos públicos. O parque, que estava fechado para visitação desde 2015, foi reaberto no início de 2017, na administração do atual prefeito, Constantino Orsolin (MDB). Após um esforço inicial para melhorar a infraestrutura – que conta com dois banheiros e apenas alguns bancos e paradouros em meio à natureza –, nos últimos meses a prefeitura parou de investir na área.
– Desde que o local foi cedido, ninguém fez nada. A administração municipal definiu como meta que as áreas públicas que não estivessem sendo utilizadas como deveriam seriam cedidas à iniciativa privada para gerar economia e emprego. É o que estamos tentando fazer – afirma Ângelo Sanches, secretário de Turismo e Cultura de Canela.
Sem cogitar arcar sozinha com os custos da construção do centro de eventos, a prefeitura está tentando conseguir, na Câmara de Vereadores, autorização para conceder os nove hectares à iniciativa privada, que poderia explorar comercialmente a área por um período inicial de 25 anos, que seria renovável.
Canelenses, turistas e demais interessados na destinação do parque estão divididos, sobretudo, em dois grupos: os que apoiam a concessão à iniciativa privada, entendendo que isso vai trazer benefícios para o município, e os que se opõem à proposta por acreditar que o parque deve continuar como área pública. Entre ambos, há uma percepção comum: o parque precisa ser melhor cuidado.
O local conta com apenas um vigia na entrada durante o dia. O ingresso é livre, e não se veem mais equipes da prefeitura trabalhando na limpeza, conservação ou segurança. Em diversos pontos, há lixo espalhado, resquícios de fogueiras e embalagens de camisinha descartadas. Conforme a prefeitura, a Brigada Militar e o Corpo de Bombeiros costumam ser acionados para apurar denúncias de abusos e combater focos de incêndio.
Morador de Canela e integrante do grupo Amigos do Parque do Palácio, que é contrário à concessão, o aposentado Ricardo Soncini concorda que há problemas como esses, mas que isso se resolveria com maior participação do Executivo municipal na administração.
– Sabemos de grupos que vão ao parque para usar drogas. Isso é verdade, mas é assim porque não há estrutura suficiente nem interesse da prefeitura para evitar esse tipo de uso – defende Soncini.
Uma pesquisa encomendada pela Secretaria de Governança, Planejamento e Gestão de Canela apontou que 83% dos entrevistados são favoráveis à modernização do parque – percentual que a administração do município tem usado como representativo de que a maioria se declararia pró-concessão.
– A pergunta é feita assim: você quer investimento no Parque do Palácio? Todos querem! O que não quer dizer que todos querem construções – diz a vereadora Carmen Lúcia de Moraes (PP), que faz oposição à atual gestão.
Dos nove hectares sob sua administração, a prefeitura garante que pretende ceder apenas dois para a construção de um centro de convenções, como determina o governo do Estado. A única empresa que até o momento se mostrou interessada em investir na área – a Villard Empreendimentos Imobiliários, de Balneário Camboriú (SC) –, contudo, apresentou um protocolo de intenções que incluía ainda um hotel para, segundo a construtora, garantir sustentabilidade financeira ao negócio.
O secretário de Turismo assevera que só uma parte do Parque do Palácio poderá receber construções. Nos sete hectares restantes, a empresa que viesse a explorar a área teria de garantir iluminação, limpeza e manutenção, comprometendo-se ainda com a construção de espaços para abrigar uma feira de artesanato e uma outra de produtos orgânicos.
O grupo Amigos do Parque do Palácio tem declarado oposição à possibilidade de construção do hotel, de espaços comerciais e de um shopping no local. A lei que determina que se erga o centro de eventos não estipula uma data para que o empreendimento esteja em operação, mas a administração de Canela acredita que o município possa perder a área. Entretanto, consultada por GaúchaZH, a Secretaria da Modernização Administrativa e dos Recursos Humanos do Estado afirmou, em nota, que o governo não tem interesse em retomar a área.
A questão ambiental é outra preocupação de moradores e turistas, que temem a remoção de árvores e a destruição da vegetação típica dos Campos de Cima da Serra presente no parque. Uma campanha denominada Palácio de Ofertas, lançada por uma agência de publicidade de Porto Alegre, compara a concessão com liquidações comuns no comércio, chegando a apresentar espécies da área com indicação de preços, como se estivessem à venda.
O secretário-adjunto de Meio Ambiente de Canela, Daniel Schlieper, assegura que haverá garantias de que toda a vegetação nativa da área será preservada após a concessão.

