As perícias são consideradas essenciais pela polícia para tentar desvendar o que causou a morte de três pessoas da mesma família em Torres, no Litoral Norte. Seis familiares começaram a passar mal após comerem um bolo durante uma confraternização em um apartamento na segunda-feira (23). Duas delas seguem hospitalizadas: uma idosa responsável pelo preparo do doce e um menino de 10 anos, filho de uma das vítimas.
O bolo, segundo a polícia, teria sido preparado na segunda-feira, na casa de Zeli Teresinha Silva dos Anjos, 61 anos, em Arroio do Sal — a cerca de 35 quilômetros de Torres. Natural de Canoas, na Região Metropolitana, ela se mudou para o Litoral Norte neste ano, após ter a residência atingida pela enchente. O marido dela faleceu em setembro — a polícia pedirá que o corpo dele seja exumado para verificar o que teria ocasionado a morte.
No fim da tarde de segunda-feira, sete familiares estavam reunidos em um apartamento em Torres — seis deles comeram o bolo e começaram a se sentir mal. Zeli, conforme a polícia, ingeriu duas fatias do doce, e teria sido a pessoa que comeu a maior porção.
Outras duas irmãs dela, Maida Berenice Flores da Silva, 58 anos, e Neuza Denize Silva dos Anjos, 65, e a filha de Neuza, Tatiana Denize Silva dos Anjos, 43, também se sentiram mal, e morreram durante atendimento médico no Hospital Nossa Senhora dos Navegantes. Zeli e um menino, filho de Tatiana e neto de Neuza, seguem hospitalizados.
Segundo o delegado Marcos Vinícius Veloso, que investiga o caso, a mulher que preparou o bolo foi ouvida no hospital. Zeli relatou que comprou parte dos ingredientes para o preparo na manhã de segunda-feira. Ela ainda deverá prestar novo depoimento.
— Alguns ingredientes, ela tinha em casa. Outros, ela disse que comprou na manhã mesmo, no dia em que fez o bolo. Ao que tudo indica, ela fez o bolo sozinha — relata o delegado.
Conforme Veloso, a suspeita recaiu sobre o bolo em razão da proximidade entre a ingestão do doce e o início dos sintomas.
Foi algo imediato, muito rápido, um ato contínuo. Comia e passava mal. E também a única pessoa que não comeu não passou mal. Então, a nossa principal linha é o bolo. Mas ainda não sabemos se foi uma intoxicação, envenenamento ou qualquer outra hipótese. Isso só com o resultado das perícias
MARCOS VINÍCIUS VELOSO
Delegado de Polícia
Enquanto aguarda as perícias, a polícia segue analisando o perfil da família. Conforme Veloso, vizinhos e outras pessoas próximas devem ser ouvidas pela investigação. Até o momento, a polícia não identificou nenhum indicativo de que a família pudesse ter problemas que justificassem uma ação proposital.
— O que estamos tentando entender é como era essa família. A princípio, tinha excelente convivência. A Maida tinha 35 anos de casamento. Essa senhora que fez o bolo teve um casamento de 44 anos. Havia uma instituição familiar sólida. Por mais que possa não ter ocorrido um crime, se foi em virtude de intoxicação alimentar, estamos investigando como se tivesse ocorrido um delito para entendermos a situação. Quando as provas periciais forem juntadas, teremos mais respostas — afirma o delegado.
Espera por resultados preliminares
A expectativa do Instituto-Geral de Perícias (IGP) é de que possam ser conhecidos na próxima semana os resultados preliminares dos exames realizados para descobrir o que causou as mortes. Segundo a chefe da divisão de Química Forense do IGP, Lara Regina Soccol Gris, uma série de análises está sendo realizada para esclarecer o que provocou os óbitos. Uma das pesquisas envolve centenas de substâncias que podem ter ligação com o caso.
Conforme a perita, estão sendo verificadas substâncias que poderiam ter envenenado as vítimas, mas não se descarta que o episódio tenha sido causado por algum outro agente microbiológico. Um dos fatores que desperta a atenção da perícia é que não é comum casos de intoxicação alimentar evoluírem para um quadro de morte tão rapidamente e envolvendo tantas pessoas.
— Normalmente, essa situação envolvendo uma morte aguda está mais relacionada a algum agente químico, mas não podemos descartar o relato de alimentos fora da data de validade. Existem algumas bactérias, alguns patógenos, que podem produzir toxinas bastante nocivas — disse.
Durante buscas na casa da mulher que preparou o bolo, foram encontrados alimentados fora do prazo de validade. Em setembro, o marido dela faleceu, supostamente por intoxicação alimentar.
Temos que tratar de uma forma muito cautelosa, porque as informações são muito preliminares. Não é uma situação típica uma intoxicação alimentar ter morte tão rápida. Mas não se pode descartar questões de alimentos.
LARA REGINA SOCCOL GRIS
Chefe da divisão de Química Forense do IGP
O que está sendo analisado pelo IGP
- Alimentos que estavam guardados na casa da mulher que fez a sobremesa, em Arroio do Sal
- Uma porção coletada do bolo que pode ter causado a morte das pessoas
- Outras substâncias encontradas na residência da mulher que preparou o bolo, entre elas um líquido branco encontrado dentro de um frasco de remédio
- Materiais biológicos coletados das vítimas, como sangue, urina e amostras do conteúdo estomacal
- Sintomas apresentados pelas vítimas, para identificar quais substâncias poderiam ter causado essa reação
- O apartamento onde acontecia a confraternização, que também foi periciado