A Polícia Civil deflagrou nesta quarta-feira (30) uma operação nos três Estados do sul do Brasil para desarticular uma telentrega de drogas que funcionava há 10 anos na região metropolitana de Porto Alegre. O esquema, segundo a investigação, vinha se adaptando às novas tecnologias e tinha clientes selecionados, fornecendo drogas somente a pessoas de classe alta ou classe média-alta, em bairros nobres de várias cidades.
Os supostos responsáveis – cerca de 50 pessoas –também são investigados por lavar dinheiro em imóveis, carros de luxo, festas, viagens e empresas. A movimentação financeira ultrapassa os R$ 20 milhões desde 2017.
Cerca de 300 policiais cumpriram 364 mandados, sendo 43 de prisão. Além da apreensão judicial de veículos e imóveis, houve bloqueios de contas bancárias e quebra de sigilos fiscais e na bolsa de valores. A operação ocorreu em 13 cidades. Até o momento, 34 suspeitos foram presos.
A chamada Operação Erga Omnes (significa "Contra Todos", em latim), foi coordenada pela 3ª Delegacia do Departamento de Investigações do Narcotráfico (Denarc). Após um ano de investigação, o delegado Gabriel Borges tem certeza que este grupo criminoso, que tem ligação com uma facção, é o que há mais tempo atua com telentrega de drogas no Estado e acredita que seja também o mais organizado.
— Eles têm uma complexa rede de atividades bem definidas e detalhadas, com profissionais especializados e sempre se atualizando para atender a demanda, inclusive após a pandemia, quando houve uma grande procura por telentrega. Eles já agiam assim e se estruturaram ainda mais — explica Borges.
O delegado diz que havia pessoas especializadas e formadas em áreas como contabilidade, direito e do ramo imobiliário. No entanto, a principal atividade era a venda de drogas, principalmente maconha trazida do Uruguai, cocaína trazida do Peru e drogas sintéticas, até mesmo MDMA, que é o princípio ativo do ecstasy.
As vendas eram feitas, inicialmente, pelas redes sociais e basicamente por meio de um perfil com o nome de "Beijinho". Depois disso, quando os clientes já eram de um grupo "fidelizado", os contatos eram mantidos pelo WhatsApp. As operações mais recentes envolviam pagamentos via Pix, mas anteriormente o grupo também dispunha de máquinas de cartões de crédito. Durante a investigação, o Denarc apreendeu várias drogas comercializadas pelos criminosos.
Lavagem de dinheiro
Os cerca de 50 investigados, nesta fase inicial de apuração, eram divididos em núcleos. O primeiro era responsável pela venda de drogas nas principais cidades da Região Metropolitana. Na Capital, por exemplo, atendiam apenas bairros como Moinhos de Vento, Mont'Serrat e Bela Vista.
Os outros núcleos eram os responsáveis pelo apoio logístico e de transporte, bem como o de contabilidade e jurídico, além dos líderes. Um casal, preso nesta quarta-feira, é suspeito de coordenar o esquema criminoso. Eles recebiam dinheiro da venda de drogas por meio de uma contadora. Esta mesma profissional também fazia repasses para um empresário do ramo imobiliário e da construção civil, que seria o responsável pelo esquema de lavagem de dinheiro. Ele também foi alvo de mandado de prisão na operação.
Este homem, a polícia apurou, investia os recursos arrecadados com o tráfico em empresas, na bolsa de valores e na aquisição de imóveis e veículos, além de distribuir em dezenas de contas bancárias em nome de laranjas. Os lucros que ele obtinha eram repassados para o casal líder da quadrilha e demais gerentes da telentrega.
Com o "dinheiro sujo" transformado em suposto "dinheiro limpo", os criminosos compraram casas em condomínios de luxo no Litoral Norte e no Vale do Paranhana, carros de alto valor, realizavam festas, viajavam para destinos turísticos no mundo inteiro e adquiriram empreendimentos dos mais variados ramos, como por exemplo, academias, estéticas, lojas de roupas e de produtos naturais.
Operação Erga Omnes
A operação ocorreu em 11 cidades gaúchas: Porto Alegre, Eldorado do Sul, Cachoeirinha, Gravataí e Canoas, na Região Metropolitana; Osório, Capão da Canoa e Xangri-lá, no Litoral Norte; Taquara, no Vale do Paranhana; Tapes, no Sul; e Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo. Também houve cumprimento de buscas e de mandados de prisão em Balneário Camboriú, em Santa Catarina, e Cascavel, no Paraná.
Além dos 43 mandados de prisão, sendo quatro preventivas e 39 temporárias, houve a apreensão judicial de nove veículos e de 25 imóveis, inclusive, nos outros dois Estados da região Sul. Houve o bloqueio de 47 contas bancárias, além de 188 quebras de sigilos bancário, fiscal e bursátil, envolvendo a bolsa de valores.
Os 300 policiais civis contaram com o apoio de um helicóptero na Região Metropolitana. A polícia não divulgou os nomes dos presos.