Série de ataques promovidos por grupos criminosos nos últimos dias resultou em mortos e feridos, além de levar medo para comunidades da Grande Porto Alegre. Nesta sexta-feira (9), uma escola suspendeu as aulas em razão de um tiroteio na Zona Sul. Como forma de reação à escalada da violência, medidas são preparadas pelos órgãos de segurança. Entre elas, está a chegada de mais policiais militares à Capital, a transferência de lideranças e a intensificação das investigações da Polícia Civil para identificar quem está por trás dos atentados. Ao menos 15 pessoas foram mortas a tiros nesta semana na Região Metropolitana.
No início desta semana, a Brigada Militar já havia colocado nas ruas mais policiais, com intuito de melhorar a sensação de segurança e coibir novos ataques. A medida foi uma resposta ao atentado a um bar no bairro Campo Novo, que deixou dezenas de feridos e causou a morte de três pessoas. Além da distribuição dos PMs em pontos estratégicos da Capital, também aumentou a circulação do efetivo, incluindo as tropas especiais, nas áreas onde vêm acontecendo os conflitos.
Ainda assim, ao longo da semana série de novos episódios violentos foram registrados. Outro bar foi atacado, no bairro Bom Jesus, na Zona Leste, resultando em um morto e quatro feridos. No episódio mais recente, um confronto entre a Brigada Militar e suspeitos de envolvimento nessa guerra de facções resultou em três mortos na madrugada desta sexta-feira, na Avenida Edvaldo Pereira Paiva, também na Zona Sul.
Diante dessa incidência de casos, o Comando de Policiamento da Capital (CPC) confirmou que mais policiais devem chegar a Porto Alegre, vindos do Interior. O Comando-Geral da BM informou que não divulgará o número de servidores e nem a origem do efetivo por estratégia de segurança.
— Estamos trazendo outro aporte de efetivo, igualmente para essas áreas de instabilidade identificadas, além do CPC, para dar essa condição de segurança. Contamos também com alunos que estão em se formando nos próximos dias, atuando em pontos estratégicos. A resposta das forças de segurança foi rápida. Tanto nos da BM, quanto uoutras instituições. Ainda temos residual de instabilidade, que deverá ser neutralizado nos próximos dias com esses aportes — diz o comandante do CPC, coronel Luciano Moritz Bueno.
Além do reforço no policiamento, segundo o comandante, a BM está intensificando as ações de inteligência, em colaboração com outros órgãos para ajudar a estancar esses conflitos. A intenção é identificar quem está por trás dos crimes e impedir que novos ataques façam mais vítimas.
— Teremos ações bastante pontuais juntamente com outras instituições, em operações que deverão ser desencadeadas nos próximos dias. Diversas ações bastante importantes para que possamos trazer novamente a tranquilidade e terminar com essa inquietação que estamos vivendo — diz o coronel.
Identificação de criminosos
O foco da Polícia Civil neste momento é identificar quem são os envolvidos nos crimes que ainda estão nas ruas e reunir provas contra as lideranças, que em sua maioria comandam os delitos de trás das grades. O objetivo é impedir que os mesmos criminosos se envolvam em novos ataques, já que os crimes têm ocorrido numa sequência de revides.
— Nossa prioridade total na investigação dessas mortes tem como finalidade agilizar medidas cautelares, especialmente contra essas pessoas que estão nas ruas, que são os executores dos crimes. Buscamos a identificação e prisão o quanto antes. E, claro, também identificar quem são os responsáveis pelas ordens. Alguns ataques, como o do Campo Novo, não acontecem de forma aleatória. É ordem que vem de alguma liderança — afirma o chefe da Polícia Civil, delegado Fábio Motta Lopes.
Além da responsabilização pelos crimes, a identificação das lideranças tem outro intuito, que é obter mais embasamento para conseguir mantê-los incomunicáveis e, assim, evitar que eles possam ordenar novas execuções. Uma das medidas que deve ser adotada pelo governo é o isolamento dos chefes dos grupos criminosos — a mesma estratégia já foi empregada em momentos anteriores, como forma de tentar conter a escalada violenta.
O Estado pretende transferir 25 integrantes de facções para unidades de alta segurança. A intenção é movimentar parte desses presos dentro do território gaúcho, para a Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc), que recebeu bloqueador de celular recentemente, e outra para penitenciárias federais fora daqui. As medidas dependem de autorização do Judiciário. Em entrevista à RBS TV, o governador Ranolfo Vieira Júnior confirmou o planejamento para as transferências de presos, que podem ocorrer de uma vez só ou até mesmo em partes.
Nos próximos dias deveremos estar fazendo remoções dessas lideranças, inclusive para o sistema penitenciário federal, e o isolamento dessas lideranças das organizações criminosas em atuação no Rio Grande do Sul.
RANOLFO VIEIRA JÚNIOR
Governador do RS
— É pontual e nós temos ações das nossas inteligências e, juntamente, é importante dizer dessa integração com o Ministério Público e o Judiciário. Nos próximos dias deveremos estar fazendo remoções dessas lideranças, inclusive para o sistema penitenciário federal, e o isolamento dessas lideranças das organizações criminosas em atuação no Rio Grande do Sul — disse o governador.
Motivação e violência
Um dos pontos que chama a atenção nos últimos ataques registrados na Capital é que os bandidos deixaram de ter como alvo pontos de tráfico. Passaram a atacar locais de concentração de pessoas em comunidades dominadas pela facção rival. É uma forma de afrontar os inimigos e impor medo aos moradores.
— Claro que é um tipo de ação que nos preocupa. Por isso todo esse esforço dos órgãos de segurança para, dentro da legalidade, estancar essa onda de violência o quanto antes. Esses ataques mostram o nível de violência de alguns membros dessas organizações — afirma Motta Lopes.
A origem dessa disputa entre facções criminosas na Capital está em uma dívida — estimada em cerca de R$ 600 mil. A facção com base na Cruzeiro teria deixado de pagar o outro grupo criminoso, do Vale do Sinos, o que deu início às execuções ainda em março, que acabaram sendo estancadas momentaneamente. No entanto, segundo a polícia, outros fatores se somaram a esse conflito. Entre eles, a execução de um gerente do tráfico da Vila Pantanal, no bairro Santa Tereza, em junho.
Depois disso, o grupo da Cruzeiro conseguiu em julho dominar um ponto de tráfico que era mantido pela facção do Vale do Sinos, no Acesso 5, próximo ao Postão da Cruzeiro. Foi após essa tomada que os conflitos se intensificaram, com um homem decapitado e os ataques nos bares das zonas Sul e Leste.
Ataque no Campo Novo
Ao longo desta semana, a Polícia Civil passou a ouvir os sobreviventes e outras testemunhas que não chegaram a se ferir no ataque a um bar no bairro Campo Novo. A investigação é realizada pela 4ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Segundo o delegado Rodrigo Pohlmann Garcia, mais dois feridos foram identificados, o que elevou para 28 o número de baleados. No total, três pessoas morreram e 25 ficaram feridas.
Entre as vítimas descobertas, está um jovem que foi alvejado na perna e não havia buscado atendimento. Uma criança também ficou ferida de raspão. As testemunhas e vítimas ouvidas até agora relataram que os criminosos chegaram ao local e começaram a disparar contra os frequentadores do bar, na Rua Rio Grande.
A polícia acredita que dois veículos foram usados na ação e que quatro a cinco atiradores participaram do ataque. Foram usadas pistolas de calibre 9 milímetros, algumas delas com um kit que permite que ela funcione como uma submetralhadora, e uma espingarda calibre 12.
— As pessoas nos relataram que há tempos não havia disparos naquela região. É uma forma de demonstração de poder de arma de fogo e de conseguir ingressar no núcleo da facção rival e atacar. Nisso, pessoas que não têm qualquer relação com o tráfico morrem nesses atentados. São atos de vingança mesmo. Essa terceira vítima, por exemplo, era uma menina de 17 anos, que estava prospectando trabalho, fazendo um curso técnico. Tombar ali, numa festa, onde todo mundo está confraternizando com disparo na cabeça, não é aceitável — afirma Pohlmann.
Como resposta a esse ataque, uma granada foi arremessada em frente a um condomínio na esquina das avenidas João Pessoa e Princesa Isabel. Em abril, durante ações para conter a incidência de homicídios em Porto Alegre, a Polícia Civil havia apreendido uma granada na Vila Pantanal, num depósito descoberto de uma facção. A expectativa da polícia é conseguir, assim como naquele período, frear novamente essa onda de violência.