A Polícia Civil indiciou um militar do Exército por embriaguez ao volante, além de desobediência e desacato a autoridade, incluindo porte ilegal de arma, em um fato ocorrido há dois anos e sete meses, em Porto Alegre. Na ocasião, em janeiro de 2019, no bairro Auxiliadora, na Zona Norte, o 3º sargento André de Freitas Alvarez Jourdan, 30 anos, natural do Rio de Janeiro, foi abordado por agentes de trânsito porque estaria dirigindo o veículo com licenciamento vencido.
Após ameaça e fuga, conforme a investigação, ele teria ingressado na contramão de uma via, atropelado uma pedestre e só parado o carro após tiro de advertência por parte de um brigadiano. No indiciamento, ocorrido nos últimos dias, mas divulgado nesta quarta-feira (4), consta que o motorista só foi contido devido a disparo de arma não letal.
Foi instaurado um termo circunstanciado na Divisão de Crimes de Trânsito da Polícia Civil. O responsável pelo caso, delegado Carlos Butarelli, diz que houve uma demora no primeiro ano porque houve prioridade para crimes mais graves e também para poder juntar todas as provas possíveis. Depois disso, houve o período da pandemia. Contudo, o delegado concluiu o procedimento policial, quando envolve crimes de menor poder ofensivo, e indiciou o militar em três situações.
Uma delas, conforme o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB): conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência. A pena é de detenção de seis meses a três anos, mais multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.
Além desse artigo, Butarelli enquadrou o sargento em outros dois. O artigo 330, que é desobedecer a ordem legal de funcionário público, com pena de detenção de 15 dias a seis meses, bem como o artigo 331 do CTB, por desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela, com punição prevista de detenção de seis meses a dois anos. Ambos os casos com aplicação de multa.
Nas três situações, depende de condenação. O sargento também responde por delito conforme o artigo 14 da Lei 10.826 de 2003, que é portar, deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Neste caso, há reclusão de dois a quatro anos e multa.
Investigação
A polícia entende que o suspeito, durante abordagem da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), teria ameaçado um agente ao fazer menção de estar armado. Depois, ao conduzir um Hyundai Veloster, fugiu de abordagem e, mesmo com vários avisos por meio de sirenes e sinais luminosos durante perseguição, prosseguiu conduzindo o carro, junto com um passageiro, passando por vários semáforos com sinais vermelhos.
As informações constam no indiciamento, bem como o fato de que ele teria atropelado, sem mais gravidade, uma mulher na altura da Avenida Princesa Isabel, sendo parado, quando uma viatura da Brigada Militar o abordou, na Rua Plácido de Castro. O delegado destaca, conforme investigação, que um dos brigadianos efetuou pelo menos um disparo, mas com o objetivo de alertar para que parassem. Depois disso, Jourdan parou o automóvel e foi contido por meio de disparo de arma não letal. A ação do PM também foi motivo de um inquérito policial militar. Tanto para a Corregedoria da corporação, quanto para a Polícia Civil, ele relatou, em depoimento, que disparou a arma porque o condutor tentou atropelá-lo.
Depoimento
Conforme indiciamento, o suspeito prestou depoimento e relatou que tinha uma arma, mas que estava dentro do carro. Jourdan disse que possui porte e negou envolvimento em acidente de trânsito, que atropelou uma pessoa, bem como ter fugido de autoridades, ressaltando também que não havia ingerido bebida alcoólica. O militar informou à polícia que não se lembra de tiros e que se recorda apenas de estar deitado no chão, algemado e com o rosto inchado, em meio a vários policiais.
Butarelli diz que o registro da arma de fogo estava vencido desde novembro de 2018, portanto, fora de validade na ocasião da abordagem de trânsito. O delegado ainda ressalta que, apesar do caso ter ocorrido às 4h40min do dia 11 de janeiro de 2019, o exame de embriaguez ocorreu somente às 7h10min. Segundo ele, com tempo suficiente para que o investigado pudesse se recompor, caso tivesse ingerido bebida. Mesmo assim, Butarelli aponta: "resta, portanto, caracterizada a embriaguez de André de Freitas Alvarez Jourdan, já que o artigo 306 do CTB prevê que a embriaguez se configura nas hipóteses de testes de etilômetro e de sangue ou pela alteração da capacidade psicomotora".
Na época do fato, o Comando Militar do Sul afirmou o seguinte: "repudia quaisquer desvios de conduta que venham a ser apresentados por seus integrantes, envidando todos os esforços para que as informações e evidências sejam rigorosamente apuradas e medidas cabíveis sejam tomadas de acordo com a gravidade configurada e legislação cabível". GZH entrou em contato, por e-mail, com a assessoria do Exército para saber se houve algum procedimento, mas ainda aguarda retorno.
Contraponto
GZH entrou em contato com a defesa de Jourdan. A advogada Eliana Bairros informa que aguarda citação sobre o indiciamento e acesso aos autos do processo para se manifestar. Sobre o fato ocorrido em 2019, a defensora destaca que seu cliente nega as acusações. Eliana ressalta também que Jourdan alegou que foram disparados oito tiros contra ele, mas que nenhum o acertou, contudo, foi atingido por arma não letal. Em depoimento, uma testemunha alega que o militar apanhou dos policiais.
Sobre outros detalhes apontados no indiciamento, a advogada diz que não houve prisão em flagrante, que o laudo do exame toxicológico deu negativo, bem como não houve qualquer disparo ou ameaça com arma por parte de Jourdan. Inclusive, ela ressalta que a arma estava no console do carro. Assim como seu cliente, o passageiro do veículo também nega os fatos e também nega que houve um atropelamento de pedestre.
— Meu cliente sempre se colocou à disposição e segue à disposição da Justiça — ressalta a advogada de defesa.